Washington entrega a ocupação do Afeganistão à segurança privada

Os chamados “conselheiros militares” dos EUA não sairão do Afeganistão, ao contrário do que se pretende fazer crer à opinião pública: serão substituídos por operacionais de empresas privadas, geridas por antigos altos responsáveis de agências governamentais, Agência Central de Inteligência (CIA) e Agência dos EUA para Desenvolvimento Internacional (Usaid) incluídas, na situação de “aposentados”.

Por Martha Ladesic, de Nova York, e Edward B. Howard, de Connecticut, para Jornalistas Sem Fronteiras

Afeganistão - IPS

“A privatização da guerra é um dos grandes negócios do século”, admite o major reservista e jurista Edward B. Howard, que investiga esta tendência cada vez mais presente nas sociedades norte-americana e britânica, com “enorme potencial de ampliação aos aliados”.

“Nem sempre a privatização da guerra é uma expressão correta”, acrescenta. “O que observamos é uma complexa fusão entre as agências públicas e empresas privadas, um processo que, em última análise, transforma o dinheiro dos contribuintes associado ao orçamento militar, em enormes lucros do setor privado”.

Segundo Howard, o “negócio da guerra não é um chavão político e também não deve ser associado simplesmente ao comércio legal ou clandestino de armamento: é uma das imensas fontes de lucros dos nossos dias, imune a crises e, principalmente, potenciado por elas”.

Edward B. Howard citou o caso pouco conhecido do grupo Imperatis Corp, “que prima pela discrição e se prepara para gerir a presença militar dos Estados Unidos da América no Afeganistão”.

“Espionagem e contra-insurreição” são os dois principais ramos de guerra a que a Imperatis se dedica, tendo como único cliente o governo dos Estados Unidos da América. Todos os principais administradores e gestores operacionais são oriundos do governo dos Estados Unidos – designadamente Forças Armadas, agências de espionagem e também organismos de ingerência e organização de golpes de Estado disfarçados sob as capas humanitárias, cooperação e desenvolvimento, como é o caso da Usaid.

“Tem vindo a público, portanto não estou revelando um segredo de Estado, que a Usaid tem como uma das suas principais tarefas atuais a desestabilização política da Venezuela”, revela o major na reserva.

A Imperatis estabeleceu dois contratos com o governo para se ocupar da espionagem no Afeganistão – atividade que se desenvolve atualmente através de um complexo universo de aplicações, desde a internet ao armamento. “Um dos contratos estabelecidos com a Imperatis para o Afeganistão é o de apoio ao governo na captura de armas para análise no Oriente Médio e Extremo, especialmente mísseis.”

Edward B. Howard revelou que o chefe executivo da Imperatus é Mastin Robeson, cuja carreira militar no ativo decorreu até 2010, na área das “operações antiterroristas”, em especial no Corno da África, o que significa envolvimento no Iêmen, Somália, Sudão.

A direção da missão no Afeganistão foi entregue a Heidi Silvey Garner, que transitou da Usaid e, na Imperatus, tem pelouros como o da comunicação e o dos “novos mercados”.

Kevin Bowen ingressou na Imperatus transferido da Força Delta e dos serviços militares de espionagem (DIA) e estará também associado à missão no Afeganistão. É diretor do Grupo de Missões Vitais, área cuja tarefa é “proporcionar soluções de espionagem e análise no cenário de guerra para apoiar as missões dos Estados Unidos e dos seus aliados.”

Um dos mais conhecidos consultores contratados pela Imperatis é Reginald Hyde, ex-diretor de operações da CIA, que foi também responsável específico da agência para a Ásia Central.

Uma das missões corporativas da Imperatis, definida pela própria empresa, é a de “ajudar os Estados Unidos a analisar e desenvolver processos repetíveis para replicar êxitos militares em outros ambientes”. Os gestores informam que têm oito bases de dados integradas de cidadãos e empresas à disposição do Corpo de Fuzileiros.

“Êxitos globais para replicar, não há muitos”, ironiza o major Howard. “Mas a linguagem corporativa é burocrática por definição e devemos dar-lhe o devido desconto. O que eles pretendem, de fato, é tornar a guerra cada vez mais eficaz e concentrada em áreas regionais onde estejam em jogo vantagens estratégicas, recursos naturais e energéticos”.

Fonte: Jornalistas sem Fronteiras