Criação do Sistema Único é desafio da área do trabalho no Brasil

Em entrevista, publicada na edição desta quinta-feira (17), na Tribuna da Bahia, o secretário estadual do Trabalho, Emprego, Renda Esporte da Bahia desde 2007, Nilton Vasconcelos que acaba de assumir a presidência do Forum Nacional de Secretarias Estaduais do Trabalho (Fonset), fala sobre os desafios dessa nova gestão à frente do colegiado, onde a implementação do Sistema Único do Trabalho (SUT) constitui-se na mais importante conquista projetada para este ano.

Ao longo da entrevista, o secretário também aborda questões referentes à política de qualificação profissional em vigor no país, à perspectiva de geração de empregos no Brasil e na Bahia, e também fala sobre o processo eleitoral baiano. Esses e outros temas, você pode conferir na entrevista abaixo:

Tribuna da Bahia: O senhor assume o Fonset num momento importante para o conjunto das secretarias de Trabalho, visto que está em discussão a construção do Sistema Único de Trabalho, que é uma bandeira antiga do Forum. Como o senhor pretende conduzir esta discussão, neste novo momento político?
Nilton Vasconcelos – Essa demanda de um Sistema Único de Trabalho – à semelhança como existe na área da Saúde, com o Sistema Único de Saúde (SUS), e na Assistência Social, como o Sistema Único de Assistência Social (SUAS) – diz respeito à necessidade de coordenar a política pública do trabalho no Brasil. Para o Fonset, é urgente que seja simplificada a transferência da verba federal para estados e municípios. Atualmente, na área do Trabalho, as ações que envolvem intermediação de mão de obra, qualificação profissional, habilitação de seguro-desemprego, que são de atribuição da União, são feitas, em sua maioria, pelos estados, principalmente, e também municípios. Estima-se que dos custos relativos à operação do Sistema Nacional de Emprego, em torno de 25% apenas esteja a cargo da União. Mesmo assim, o mecanismo de transferência de recursos da União para os estados e municípios, feita por meio de convênios, enfrenta sérios entraves que impedem que mesmos esses recursos, tão limitados, cheguem de forma célere ao seu destino.

Nesta quarta-feira (16), em audiência realizada em Brasília, com o ministro do Trabalho, Manoel Dias, secretários estaduais e técnicos da área entregaram a minuta do projeto de lei para a criação do Sistema Único do Trabalho (SUT). O texto foi formatado pelo Grupo de Trabalho, instituído e coordenado pelo próprio Ministério do Trabalho. O Fonset, com a expertise dos seus técnicos e gestores das Secretaria do Trabalho, cumpriu um importante papel na construção dessa proposta.

O Fonset está muito empenhado para que, ainda este ano, seja encaminhado, por meio da Casa Civil da Presidência da República, um projeto de lei criando esse Sistema Único do Trabalho, cujas características acabam de ser formatadas por um Grupo de Trabalho criado, a pedido deste Forum, ao Ministério do Trabalho e Emprego. Ainda esta semana, iniciaremos uma nova etapa de discussão do projeto de lei de criação do SUT com Centrais Sindicais, Confederações de Empregadores e outros segmentos do mundo do trabalho.

Considerando tratar-se de um ano eleitoral, quando o Congresso funciona num ritmo mais lento, o senhor acredita em aprovação ainda este ano? Alguma mobilização está sendo feita pelo Fonset para viabilizar votação ainda em 2014?
Nilton Vasconcelos –
Há um empenho muito grande de nossa parte. Ano passado, por exemplo, conseguimos articular a criação, através da deputada federal Fátima Pelaes (Amapá) e também do deputado Alex Canziani (Paraná), da Frente Parlamentar em Defesa da Rede Sine, que congrega ainda deputados baianos. O objetivo dessa mobilização é termos uma base de apoio importante no Congresso Nacional, que acompanhe de perto e contribua para agilizar a tramitação e a aprovação deste projeto de lei. Também o próprio Ministério do Trabalho, na pessoa do ministro Manoel Dias, tem reafirmado o interesse de por um ponto final nessa questão, que já se arrasta há muitos anos sem que consigamos êxito na montagem de algo que se assemelhe ao SUS e SUAS. Certamente, os atuais gestores não verão este sistema em funcionamento, mas terão o mérito de deflagrar este processo.

A aprovação do SUT é o principal desafio da sua gestão neste ano?
Nilton Vasconcelos – Sem dúvida. Claro que há outros desafios que são importantes como, por exemplo, a questão do Pronatec. Com o surgimento deste programa, os recursos que antes eram destinados pelo Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) à qualificação profissional através do próprio Ministério do Trabalho e das Secretarias Estaduais do Trabalho não existem mais, se esgotaram.

Neste momento, as secretarias do Trabalho executam os últimos programas na área de qualificação profissional, inclusive para a juventude, enquanto o Pronatec passou a concentrar toda a área de qualificação. Nestes quase dois anos de existência do Programa, são mais de cinco milhões de matrículas feitas, superando, e muito, os números da qualificação que se praticava por meio do Ministério do Trabalho e secretarias do Trabalho.

Qual impacto desses números em relação ao serviço de intermediação feito pela rede Sine?
Nilton Vasconcelos – Observa-se, ainda, um fosso entre a qualificação de mão-de-obra feita pelo Pronatec e o esforço de intermediação de mão-de-obra feita pelo Sistema Nacional de Emprego – no caso do nosso estado, feita pelo SineBahia. É preciso que as pessoas qualificadas sejam preparadas para atuar em áreas que o mercado demanda, como comércio, serviços, construção civil. É também necessário fortalecer o encaminhamento de trabalhadores que pleiteiam o seguro-desemprego aos cursos de qualificação profissional do Pronatec, para que possam, simultaneamente ao recebimento das parcelas, participar de ações de qualificação.

O que levou o Governo Federal a transferir a política de qualificação profissional para a área de Educação, já que tradicionalmente essa atribuição sempre esteve ligada à área do trabalho?
Nilton Vasconcelos – Há algum tempo, observa-se um tensionamento, sem que haja, necessariamente, um grau de disputa, entre essas duas áreas quanto a quem competia executar a qualificação dos trabalhadores. A Educação sempre considerou que qualquer tipo de capacitação esteja vinculado a um regramento típico da área: os cursos, a organização, a carga horária são atividades mais afeitas à área de Educação. Já o Ministério do Trabalho criou uma normatização própria, uma tipologia de cursos e toda uma organização padrão. No entanto, houve uma decisão da Presidência da República de criar um outro sistema. O Pronatec impediu que ONGs sejam contratadas para execução de programas de qualificação profissional, que passa a ser feita pelo Sistema S ou através das redes estadual e federal de educação tecnológica.

Qual o prejuízo para área do Trabalho com essa decisão, se é que existe prejuízo?
Nilton Vasconcelos – Eu não diria que haja prejuízo para a área do Trabalho. Entendo que a sociedade ganhou com o volume de cursos de qualificação profissional que estão sendo ofertados, um número muito maior do que se desenvolvia antes. Agora, esses cursos são ofertados para atender a variadas demandas dos diversos ministérios, sem que estejam articuladas com a demanda da intermediação de mão-de-obra e suas particularidades, que continua sob responsabilidade do Sine. É claro que o emprego não é a única forma de alocação no mercado de trabalho, mas continua sendo a principal. Não podemos ficar à mercê dos cursos que as organizações se dispõem a oferecer e onde elas se dispõem a oferecer. De todo modo, atuamos em outras formas de geração de renda, como o trabalho por conta própria, as associações produtivas, cooperativas, que também devem e precisam ser estimuladas.

Há uma crítica antiga do Fonset quanto à falta de infraestrutura das unidades da rede Sine. Há alguma discussão dentro do Forum para superar esse problema? Há recursos previstos para a requalificação e melhoria dessas unidades?
Nilton Vasconcelos – Essa é uma questão das mais importantes. Se, por um lado, o Sine é nacionalmente unificado por meio do Portal MTE Mais Emprego, que garante acesso ao trabalhador e a empresas a colocarem e a pleitearem vagas através da internet, por outro lado temos, no atendimento presencial, estruturas físicas muito pequenas, inadequadas. O ideal é que tenhamos uma padronização de estrutura e de atendimento organizado a partir da oferta de vagas captadas junto ao mercado de trabalho. Com o Sistema Único do Trabalho, queremos garantir que os recursos possam assegurar não só essa infraestrutura adequada, mas também equipamentos e mobiliário. Isso é uma das questões chave do SUT, que além do compartilhamento de recursos, precisa garantir o compartilhamento das responsabilidades e atribuições da União, dos estados e dos municípios.
A rotatividade do mercado de trabalho é outra questão que preocupa os gestores da área do Trabalho.

O senhor identifica alguma forma para minimizar esse problema?
Nilton Vasconcelos – Esse é um problema que não é de fácil solução. Recentemente, durante um seminário, organizado pelo Ministério do Trabalho, foi apresentado um estudo feito pelo Dieese de mais de uma década de informações da RAIS. Diversos especialistas foram convidados a discutir o material. A conclusão é que, de fato, temos um crescimento da rotatividade nos últimos anos.

Chamou atenção a rotatividade nas pequenas empresas. Isso é preocupante porque são essas pequenas empresas, beneficiárias do Simples, da Lei Geral da Pequena Empresa, que têm, inclusive, desoneração no PIS/PASEP, que é a grande fonte de arrecadação do próprio FAT. Se por um lado temos um ingresso de recursos que deixa de existir, por outro temos um dispêndio crescente. O estudo também verificou que tem havido um número grande de desligamento por iniciativa do próprio trabalhador.

É bom lembrar que essa rotatividade alcançou em torno de 63% do mercado de trabalho em 2012, num estoque de 38,9 milhões de trabalhadores celetistas no Brasil.

Essa rotatividade implica em um maior dispêndio com o seguro-desemprego. Isto é preocupante porque o FAT passa a ter dificuldade de cumprir as obrigações básicas, que são pagamento do abono salarial e o seguro-desemprego, que anualmente ultrapassa uma soma de R$ 40 bilhões.

Um fato inédito aconteceu na reunião do Conselho Deliberativo do FAT deste mês de abril. Pela primeira vez, o Codefat reduziu os recursos a serem aplicados pelo BNDES de forma a garantir liquidez para pagamento do Seguro e do Abono.

O Brasil tem obtido bons saldos na geração de emprego, de acordo com o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged). Qual a possibilidade de continuar com essa boa performance durante este ano, há indícios de que teremos um bom desempenho?
Nilton Vasconcelos – Em matéria de política econômica, esse tema é crucial por dois motivos: primeiro, são mais de 20 milhões de empregos formais gerados no Brasil com carteira assinada nos últimos 10 anos. Se é verdade que há muito espaço para a formalização, visto que a taxa atual situa-se em torno de 60%, é difícil imaginar a manutenção do mesmo ritmo de crescimento do emprego. O segundo aspecto que considero relevante é que a economia brasileira tem obtido o crescimento do Produto Interno Bruto a partir do consumo das famílias e do consumo do Estado. No entanto, cada vez mais percebe-se que é preciso fazer com que a economia passe a crescer tendo como propulsão o aumento da produtividade do emprego e no aumento dos investimentos. Essas questões são cruciais, estão no centro da discussão sobre política econômica no Brasil, e esse tema, seguramente, vai estar presente na campanha eleitoral.

E falando da Bahia, o senhor é otimista em relação à geração de emprego para este ano? O estado tem batido recorde, liderando a geração de empregos na região Nordeste.
Nilton Vasconcelos – Nós temos conseguido bons resultados que decorrem dos investimentos públicos e privados que o Governo do Estado tem buscado. Ao mesmo tempo, observa-se uma baixa produtividade do trabalho, em algumas áreas o investimento não cresce na mesma proporção dos empregos gerados. Isso, a médio e longo prazos, é preocupante. É importante que se chegue a uma solução em termos nacionais, na política macroeconômica. No que diz respeito à política estadual, o governador Jaques Wagner tem se esforçado na atração de novos investimentos, inclusive na área de tecnologia.

O senhor é um dos poucos secretários que está no governo desde o início da primeira gestão do governo Wagner, iniciada em 2007. Como se sente nessa condição e como avalia a sua gestão como secretário de estado?
Nilton Vasconcelos – Naturalmente, sinto-me prestigiado. Fui indicado pelo meu partido, o PCdoB, ao governador Wagner. Ao longo desse período, acredito ter havido uma avaliação positiva da gestão. A equipe de governo teve e tem dirigentes valorosos. Vários secretários deixaram o cargo para ocupar cargos públicos, inclusive de senador, deputado federal, num movimento próprio da política. No meu caso, creio que a permanência no governo permitiu que algumas políticas públicas alcançassem a maturação desejada, ampliar o leque de parcerias com instituições públicas e privadas que procuram atuar de forma articulada.

O PCdoB, que integra a base do atual governo, chegou a apresentar o nome da deputada federal, Alice Portugal, para compor a chapa, como candidata a vice-governadora. No entanto, a vaga ficou para o PR, com o deputado federal João Leão. Como o PCdoB avalia essa escolha, sente-se desvalorizado pela não aceitação do nome da deputada?
Nilton Vasconcelos – Ao oferecer o nome da deputada Alice Portugal, o PCdoB o fez por considerar que era absolutamente legítimo o pleito. Afinal, o PCdoB é um partido que acompanha, há anos, esse projeto em nível estadual e nacional. Mas a indicação teve também o objetivo de levantar uma discussão sobre a composição e o caráter que deveria ter a chapa que disputará as eleições deste ano. Mas é do governador Wagner a responsabilidade de comandar este processo e construir uma aliança capaz de dar continuidade ao projeto.

O PCdoB, nessas eleições de 2014, tem o objetivo de eleger três deputados federais e ampliar a participação na Assembleia Legislativa da Bahia. Estamos empenhados nisso, na necessidade de fortalecer o partido e assim criar mais condições de intervir nesse cenário político.

Mesmo ainda faltando pouco mais de oito meses para o fim dessa gestão, o que o senhor destacaria como conquistas importantes da era Wagner?
Nilton Vasconcelos – Acho que esse governo deu uma contribuição muito grande ao desenvolvimento da Bahia. Fez e atraiu investimentos importantíssimos em logística, que é um aspecto central para o desenvolvimento.

É grande o contingente populacional que depende de recursos de transferência de renda e outros benefícios. Se estas políticas são importantes para estimular o mercado interno, deve servir para gerar ocupação e renda, e assim criar uma dinâmica econômica própria.

Essa dinâmica se cria não só estimulando o consumo, mas viabilizando estrutura que atraia esses investimentos. Antes de 2007, a nossa estrutura logística era muito precária. Hoje, temos uma rede de rodovias estaduais em condições ótimas de tráfego, temos projetos de portos, aeroportos, ferrovia em andamento. Em Salvador, temos importantes obras de mobilidade sendo executadas: o Metrô, a duplicação de vias importantíssimas, novas avenidas que cortam a cidade transversalmente, além da Via Expressa, do complexo viário 2 de Julho já entregue à população. São obras importantes para desafogar o trânsito que hoje é caótico na cidade.

Na área social, o Programa Água para Todos, que construiu mais de 100 mil cisternas e pequenos sistemas hídricos em várias comunidades, foi fundamental para o enfrentamento da seca de 2012/2013. Sem esse programa, as consequências dessa longa estiagem teriam sido catastróficas para o grande e principalmente para o pequeno agricultor.

As intervenções na área do esporte colocaram a Bahia em outro patamar esportivo. Temos os estádios da Arena Fonte Nova, de Pituaçu e em processo de finalização o Centro Pan- Americano de Judô, com inauguração prevista para este semestre, e o Complexo Aquático da Sudesb, com as piscinas olímpica e de aquecimento. São equipamentos que vão ajudar muito no desenvolvimento do esporte, ao lado de outros investimentos no interior, como construção e recuperação de dezenas de quadras, piscinas semi-olímpicas, reforma de ginásios e estádios.

A oposição também já definiu sua chapa ao Governo. Os nomes que disputarão com o candidato do Governo já estão definidos. Como o senhor avalia as peças do jogo eleitoral de 2014?
Nilton Vasconcelos – Não devemos subestimar nenhuma das candidaturas. No entanto, temos um importante volume de conquistas obtidas neste Governo. Temos que olhar para o que fizemos e confiar que os baianos saberão reconhecer. Mas ainda há muito por fazer neste ano, trabalhar muito e para mostrar o quanto este projeto, iniciado em 2007, tem contribuído para mudar a Bahia.

Fonte: Ascom Setre