Clássica obra cubana é lançada no Brasil

Já é considerado um clássico em países de língua hispânica, O homem que amava cachorros, do escritor cubano Leonardo Padura Fuentes, chega ao Brasil pela editora Boitempo. O lançamento foi nesta segunda-feira (10) no Teatro Eva Herz, na capital paulista, contou com um debate entre o historiador e jornalista Gilberto Maringoni, os historiadores Osvaldo Coggiola e Valério Arcary e o teólogo e escritor Frei Betto. O mediador foi o jornalista Breno Altman do portal Opera Mundi.

Leonardo Padura Fuentes

A obra tem múltiplas facetas, com uma narrativa não linear, conta três histórias: a do escritor cubano Iván Cárdenas Maturell, a do líder bolchevique Leon Trotksy e a de seu assassino, o catalão Ramón Mercader. 

Embora aborde temas diversos, tais como a Guerra Civil Espanhola (1936-1939) e o Período Especial em Cuba (1990-1995), parte da obra de Padura se centra em dois dos temas mais polêmicos do século 20: a relação entre stalinistas e trotskistas. Trata-se de um assunto em que o consenso é improvável, mesmo após quase um século da Revolução Russa (1917). E ainda mais improvável entre os debatedores, pelo fato de cada um deles ter maior ou menos afinidade com essas duas correntes.

O ponto comum é que O homem que amava cachorros é uma obra capaz de expor as contradições e equívocos do socialismo no século 20. É, em suma, um livro essencial para aqueles que pretendem compreender os caminhos dos movimentos de esquerda na contemporaneidade. “Este é um livro obrigatório para homens e mulheres progressistas. E até mesmo para os não tão progressistas assim”, disse Altman em sua fala de abertura do debate.
Para o jornalista, o texto é um painel de uma época e conta a história de homens e das circunstâncias em que estavam: os primeiros anos da Revolução Russa, os desafios de desenvolvimento da União Soviética e o combate ao nazismo na Europa durante a Segunda Guerra Mundial. O grande mérito de Padura, um “crítico pontual e agora apoiador” do governo cubano, é “desmitificar a ideia poética do processo revolucionário, que é repleto de contradições”.

Para Maringoni, autor do prefácio que acompanha a edição lançada no Brasil, o livro, publicado pela primeira vez em 2009, fala do presente, apesar de retratar fatos acontecidos no século 20. “É um livro que coloca os dilemas da esquerda na atualidade. [Fala] sobre as urgências da revolução, e mostra como foi o processo da Revolução Russa. Aconteceram 21 invasões, tinha a urgência no combate à fome, a necessidade da industrialização, a Crise de 29, a luta contra o nazismo”, lembrou.

A obra aborda sobretudo as mortes que aconteceram ao longo desse processo, incluindo a de Trotsky – ápice da narrativa do escritor cubano – e, antes, a maneira como foi excluído da vida política soviética até se tornar um “inimigo da revolução”. Para Maringoni, houve excessos, "mas não se pode desprezar a Revolução Russa pelos excessos cometidos. Este não é um livro apenas para quem quer saber dos meandros da esquerda, mas também para quem gosta de boas histórias. E é muito importante voltar a colocar a revolução nas conversas. Este livro acende o debate sobre o futuro do socialismo”, continuou.

Já Arcary elogiou a capacidade do autor de construir um personagem – Mercader – com uma inabalável disciplina em relação ao Partido Comunista Soviético. E de tal forma que sequer questiona sua tarefa de matar Trotsky. Neste aspecto, Padura emprega diversos elementos da ficção em sua narrativa, já que são escassas as informações sobre a biografia do agente. O historiador julga impossível ser socialista no século 21 sem saber o que foi o stalinismo.

No final, lançou que, em sua opinião, a “falta de ideias” de Stalin foi a grande marca negativa do socialismo soviético. Encerrando o debate, Altman contestou a afirmação. “Homem sem ideias? Ele pode ter tido as piores ideias. Não creio que deva ser este o terreno da discussão. Só existe algo tão grave quanto o fundamentalismo endeusatório [aos líderes do Partido Comunista Soviético]: o fundamentalismo crítico àquela experiência [stalinismo]”.

Fonte: Redação Vermelho com Opera Mundi