Tuaregues declaram fim do cessar-fogo no Mali

Após algum tempo de hiato no desenrolar da situação política do Mali, o Movimento Nacional pela Liberação do Azawad (MNLA) anunciou o fim do pacto de cinco meses para um cessar-fogo com o governo, neste fim de semana. No encalço dos confrontos registrados na cidade de Kidal (no norte do país), a suspensão do pacto põe em risco a transição política iniciada com as eleições recentes, após um golpe militar em 2012.

Por Moara Crivelente, da redação do Vermelho

MNLA - Reuters

O MNLA, composto por tuaregues (povo berbere nômade, do norte africano), reivindica a autonomia da região de Azawad e, desde que foi estabelecido, em 2011, controlava as cidades de Kidal, Timbuktu e Gao. Suas disputas com grupos islamitas como o Ansar al-Dine, entretanto, levou à perda de controle sobre a região.

Em março de 2012, uma rebelião contra o governo maliano, pela insatisfação com a forma de lidar com a situação no norte, resultou num golpe militar que derrubou o presidente Amadou Toumani Touré.

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Os amotinados foram apoiados pela França, com uma intervenção militar unilateral lançada em desacordo com os planos da Organização das Nações Unidas (ONU), em um empenho neocolonial de ingerência em prol dos seus próprios interesses (no caso, assegurar o fornecimento de urânio do Mali).

Um acordo de cessar-fogo foi assinado entre os tuaregues e o governo do Mali em junho, o que permitiu a realização de eleições em todo o país, em agosto. Ibrahim Boubacar Keita foi eleito presidente, num processo questionado pela influência estrangeira na organização das eleições e pela presença de tropas internacionais no país.

Na semana passada, as eleições parlamentares foram conduzidas com alguns casos de violência relatados, com uma participação reduzida e mais tropas francesas enviadas à região de Kidal. De acordo com a emissora britânica BBC, muitos dos que não compareceram para votar afirmaram estar insatisfeitos com o processo e denunciaram casos de compra de votos.

Ainda assim, observadores europeus e africanos citados pela BBC saudaram o “resultado pacífico em geral” e disseram que considerarão as eleições credíveis no relatório que está para ser publicado em breve.

Fim do cessar-fogo e impasse para a democracia

Na semana passada, o MNLA afirmou que uma pessoa foi morta e outras cinco ficaram feridas quando manifestantes tuaregues entraram em confronto com tropas do governo maliano, enquanto tentavam impedir que o primeiro-ministro Oumar Tatam Ly de visitar Kidal.

“O que aconteceu foi uma declaração de guerra. Nós corresponderemos a essa guerra”, disse Mahamadou Djeri Maiga, vice-presidente do movimento. “Sempre que encontrarmos com o Exército maliano, lançaremos um ataque contra eles. Será automático. As advertências acabaram”, continuou.

A quebra do cessar-fogo acontece enquanto o país prepara-se para uma segunda rodada de eleições parlamentares, já que a da semana passada não resultou na revelação de vencedores com maiorias suficientes em muitos locais.

A próxima rodada deve acontecer em 15 de dezembro, mas a da semana passada contou com a participação de apenas 38,4% dos votantes, enquanto as eleições presidenciais tinham registrado uma taxa de participação de cerca de metade da população votante.

Presença e intervenção estrangeira

Embora as tropas estrangeiras continuem no país, a situação ainda é de tensão elevada. A Operação Serval foi lançada pela França sem o consentimento do Conselho de Segurança das Nações Unidas em janeiro.

Antes disso, o conselho havia aprovado, em novembro de 2012, a Missão Internacional de Apoio ao Mali liderada pela África (Afisma, na sigla em inglês), da Comunidade Econômica de Estados do Oeste Africano (Ecowas), que deveria ser iniciada apenas em setembro deste ano, mas a intervenção francesa adiantou os planos da organização.

Já em abril deste ano, o Conselho de Segurança aprovou a Missão Multidimensional Integrada de Estabilização no Mali (Minusma, na sigla em inglês), para apoiar o processo político e realizar diversas ações relativas à estabilização da segurança no país.

É uma operação de manutenção da paz planejada para substituir a Afisma que contaria com 11.200 militares e 1.440 policiais. O pedido para a missão havia sido feito pelo governo interino do Mali, antes das eleições. Em julho, a Minusma assumiu o comando, mas em outubro a ONU já reivindicava um aumento de tropas, equipamentos e transporte.