Mali elege novo presidente ainda com intervenção estrangeira

Ibrahim Boubacar Keita, antigo primeiro-ministro e figura dominante da política nacional, nesta segunda-feira (12), foi eleito presidente do Mali, país que no último ano assistiu a uma rebelião armada, um golpe de Estado, cidades tomadas por grupos islamistas e a uma intervenção militar estrangeira, iniciada, de forma ilegal, pela França, em um ímpeto neocolonialista.

Ibrahim Boubacar Keita - Reuters

O desfecho da corrida eleitoral chegou mais cedo do que o previsto. Soumaila Cissé, o ex-ministro das Finanças que enfrentou Keita na segunda volta das presidenciais, reconheceu a derrota na segunda-feira (12) à noite, pouco mais de 24 horas depois do fecho das urnas.

“A hora não é de polêmicas”, disse à AFP o candidato derrotado, explicando que acabava de regressar da casa de Keita, onde fora com a família para “o felicitar e desejar-lhe boa sorte”, “à boa maneira da tradição do Mali”. Horas antes, partidários de Cissé tinham denunciado a existência de fraudes.

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Um conselheiro explicou à Reuters que o ex-ministro decidiu reconhecer a derrota face à grande vantagem de Keita na contagem de votos (terá vencido até em Gao, principal cidade do Norte, de onde Cissé é natural). Já nesta terça-feira (13), o candidato derrotado explicou que não iria contestar os resultados, porque a “fragilidade do país” aconselha todos a terem “um comportamento virtuoso”.

Keita não veio ainda a público reconhecer a vitória, nem reagiu ao gesto do adversário. Mas em Paris, o presidente François Hollande, revelou ter conversado com ele ao telefone para “o felicitar pela vitória” e garantir que a França “vai continuar ao lado do Mali”.

Hollande, depois de em janeiro ter enviado as suas forças para combater os "extremistas islâmicos" que ameaçavam avançar sobre a capital Bamako, fez grande pressão sobre o governo de transição para que as presidenciais acontecessem o quanto antes.

Através de um comunicado oficial, o presidente francês afirmou: “Tudo o que aconteceu desde a intervenção francesa de 11 de janeiro, em nome da comunidade internacional, até à eleição de um novo presidente foi um sucesso para a paz e a democracia”. Entretanto, a intervenção militar francesa, denominada Operação Serval, foi desafiante com relação às resoluções da ONU e representaram uma ação unilateral e ilegal da França, a favor de um governo surgido de um golpe.

Na longa lista de afazeres do novo presidente está a reativação da economia, a reorganização de um Exército que, em março de 2012, derrubou o anterior presidente Amadou Touré (ao acusá-lo de incapacidade na luta contra os rebeldes tuaregues, e logo a seguir ser derrotado por esses mesmos rebeldes) ou o combate à corrupção endêmica.

Mas nenhuma prioridade é tão grande como a reconciliação nacional. A revolta dos tuaregues fez mais do que dividir o país entre Norte (na mão dos rebeldes, mais tarde suplantados pelos jihadistas) e o Sul (controlado pelo Exército). Agravou as tensões entre as comunidades tuaregues, árabes e negras e provocou o êxodo de milhares de pessoas das suas zonas de origem.

Durante a campanha, Keita prometeu formar um Governo o mais abrangente possível e anunciou que dará prioridade a um acordo de paz com os rebeldes, embora rejeite conceder autonomia ao Azawad, como os tuaregues se referem à região que consideram a sua pátria.

Um acordo preliminar, assinado em junho, previa o início de negociações 60 dias após a tomada de posse de um governo, mas o seu desfecho é incerto. Do seu lado, o novo presidente terá os 12 mil soldados africanos da missão de paz das Nações Unidas e os 3,2 bilhões de euros prometidos pela "comunidade internacional", o que deve determinar o sufocamento do movimento tuaregue e a imposição do governo.

Com informações do Público