Inscrições para o Comitê Gestor da Internet vão até o dia 3

Encerra-se no próximo dia 3 de julho o prazo para a inscrição de entidades que queiram participar das eleições para o Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br). Podem concorrer às vagas organizações do terceiro setor, da comunidade científica e do s

O CGI.br existe desde 1995 e foi criado através de uma portaria assinada pelos ministérios das Comunicações e da Ciência e Tecnologia, com o objetivo de fomentar o desenvolvimento da Internet no país, regulando seus padrões técnicos e coordenando a atribuição de endereços e o registro de domínios. Em decreto assinado em 2003, o presidente Lula modificou a composição do Comitê, aumentando a representação de setores não ligados ao governo. Estes representantes passaram a ser escolhidos através de eleições e, no final deste ano, terminam seus mandatos (de três anos).


 


A partir do decreto de 2003, o governo passou a ser minoria entre os 21 membros do Comitê, sendo a maioria constituída pela soma dos representantes do terceiro setor, da comunidade científica e do setor empresarial, além de um representante de “notório saber em assuntos da Internet”. Segundo Sérgio Amadeu da Silveira, que foi representante da Casa Civil entre 2003 e 2005, “foi uma mudança de conteúdo formal muito grande, a composição passou a ser bem mais democrática e estável. Antes, o governo cooptava e indicava, hoje só escolhe os seus próprios representantes”.


 


Proposta para modelo mundial


 



É este modelo de composição, com participação da sociedade civil junto com os governos, que o CGI.br propõe para ser implementado também no nível global de governança da Internet, substituindo a atual hegemonia da Icann (Internet Corporation for Assigned Names and Numbers), organização que, mesmo tendo integrantes de diversos países, é controlada pelos Estados Unidos.


 


A partir da Cúpula Mundial sobre a Sociedade da Informação, realizada no final de 2003 em Genebra, o Brasil se tornou um dos protagonistas na reivindicação da discussão das políticas de governança da Internet. Foi criado então o Fórum de Governança na Internet (IGF), cuja segunda edição será realizada este ano no Rio de Janeiro* (a primeira foi em 2006, em Atenas). 


 


“Há uma visão comum, tanto do governo como do CGI.br, de que todos os assuntos de governança devem ser debatidos no IGF, o que não ocorreu na primeira edição do fórum. De fato, temas como a discussão da infra-estrutura lógica (hoje realizada por uma entidade sediada nos EUA que opera segundo um contrato com o governo americano) foram quase proibidos em Atenas, e graças à insistência de setores da sociedade civil e de governos como o do Brasil o tema deverá ser tratado na segunda edição” afirma Carlos Alberto Afonso, diretor da Rits (Rede de Informações para o Terceiro Setor) e um dos representantes do terceiro setor no Comitê.


 


Sérgio Amadeu ressalta que o CGI.br funciona, cresce e é um dos mais bem estruturados do mundo, além de ter uma engenharia institucional muito bem montada. Concorda, assim, com Carlos Afonso, para quem o Comitê “é um exercício muito bom de democracia, já que há equilíbrio na representação dos membros não governamentais e há uma minoria de representantes de governo”. Além disso, Afonso destaca a qualidade dos operadores dos sistemas técnico e administrativo. O Comitê obteve avanços significativos em relação ao registro de domínios, que hoje é feito de maneira mais rápida e simples, além de ser mais barato. Criou também pontos gratuitos de troca de informação para os provedores, o que representa maior velocidade para o usuário de Internet. Além disso, implementou uma exitosa campanha contra os spams, os e-mails de propaganda mandados em massa sem o consentimento do destinatários.


 


Desafios


 



No entanto, ambos concordam que há problemas a serem resolvidos. O principal deles é o fato de que o Comitê ainda é regulamentado apenas por um decreto presidencial, que pode, portanto, ser modificado ou revogado a qualquer momento, ou mesmo substituído por alguma lei. Para Afonso, “todas as conquistas se deram por portarias de ministérios ou decretos, não por legislação específica que possa sacramentar estruturalmente a governança da Internet no Brasil. Não há uma lei que garanta que o CGI.br será para sempre um organismo pluralista, com representação efetiva de todos os grupos de interesse, e que os nomes de domínios brasileiros serão para sempre um bem da comunidade e não uma mercadoria. Se um novo presidente assumir e achar que tem que privatizar tudo, por exemplo, nem precisa consultar o Congresso para isso”.


 


Amadeu concorda, mas acredita que a atual conjuntura é desfavorável à criação de outra regulamentação para o Comitê. “Publicar uma nova legislação regulamentando o Comitê seria mais seguro, só que ele teria que passar pelos deputados, ou seja, pelos lobbys dos bancos, das teles, das empresas de software, etc. Também é muito perigoso”.


 


A esta questão Carlos Afonso acrescenta o problema do relacionamento com a Fapesp (Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de São Paulo), que arrecadou o dinheiro do registro dos domínios até 2006, quando foi criado o NIC.br (Núcleo de Coordenação e Informação), atual responsável administrativo pela arrecadação. Como resultado, a Fapesp acumulou mais de R$ 130 milhões em seus cofres. “Uma vez criado o NIC.br, seria natural e óbvio que a Fapesp simplesmente transferisse esses recursos para a nova autoridade administrativa da governança da Internet no país”, conta Afonso. “Infelizmente, por mais que o CGI.br se esforce, essa negociação se arrasta há anos e ainda não foi resolvida”. A Fapesp não pode utilizar este dinheiro, que permanece investido para não se desvalorizar, e o NIC.br só pode fazê-lo com autorização da Fundação. “Sem o acesso a esses recursos, projetos prioritários para o país no campo das tecnologias da informação e da comunicação para o desenvolvimento humano, que o CGI.br poderia e deveria estar apoiando, não caminham” alerta Afonso.


 


Mesmo com os avanços do Comitê, Sérgio Amadeu frisa a importância de a sociedade permanecer vigilante contra os constates ataques que sofre a liberdade na Internet. “Como no começo ninguém ligava para a Internet, sua implementação se fez de modo livre, democrático. Quando as empresas começaram a perceber que não era brincadeira, que tinha grana em jogo, quiseram trazer seus interesses e ideologia da sociedade industrial pra ela, pra controlar a rede. Mas estamos ganhando, eles é que têm que inverter o jogo”.      


 


*A próxima reunião do Fórum de Governança da Internet (IGF) acontece em novembro deste ano, no Rio de Janeiro. Como parte do processo preparatório está marcado um seminário, a ser realizado nos dias 3 e 4 de julho, no auditório de Direito da FGV, em São Paulo. Mais informações sobre o seminário em www.nupef.org.br .


 



Julio Delmanto, para o Observatório do Direito à Comunicação – Comitê Gestor da Internet