Estudo analisa efeito de lan houses em comunidades excluídas

O Centro de Tecnologia e Sociedade da FGV Direito-Rio começou a mergulhar no universo dos espaços públicos pagos de acesso à internet, as lan houses, em comunidades periféricas. Os pesquisadores, inspirados no possível processo de inclusão digita

Líder de projetos do FGV-Rio, Antonio Carvalho Cabral, entende que o fenômeno da proliferação de lan houses em comunidades periféricas brasileiras está provocando um processo em que as crianças e adolescentes pobres estão apropriando-se das tecnologias da informática com a mesma intensidade que um jovem burguês de qualquer parte do mundo.



Flávio Gonçalves, coordenador regional do Projeto Casa Brasil e membro do Coletivo Intervozes, coloca, em artigo, que a universalização dos direitos do cidadão exige políticas públicas que invistam recursos em estruturas gratuitas de acesso: “Não se supõe a universalização dos direitos como oriundos exclusivamente de estruturas privadas. Ao contrário, as entidades defensoras desses direitos afirmam que os planos de saúde e as escolas privadas não são capazes de garanti-la, já que reproduzem e trabalham dentro da excludente lógica do mercado-consumidor”.



O economista Fábio Sá Earp (UFRJ) qualifica o momento atual como uma “revolução cultural”. Para o professor, é preciso partir do conceito de que tudo o que fazemos em nosso tempo livre é cultura. “Ficamos com o pensamento de que o jovem vai à lan house para jogar. Por mais que o jovem queira brincar, ele já vai se apropriando das tecnologias da informática. A partir do momento em que uma criança de dez anos sai da escola e acessa a internet depois do almoço para atualizar seu blog ou orkut, copiar vídeos do YouTube, baixar músicas em mp3 e se comunicar via MSN, ela está fazendo tudo o que um menino de dez anos de idade de classe média que mora em São Paulo ou em Nova Iorque também faz”, destaca Sá Earp, diferenciando o papel das lan houses daquele dos telecentros, que proíbem, de maneira geral, jogos e acesso a sites de relacionamento como o orkut.



Projeto Pedagógico



Como defensor dos telecentros, Flávio Gonçalves afirma que um processo de inclusão digital precisa ter um projeto político-pedagógico. “É através de um processo de construção coletiva que serão definidas atividades, como oficinas de jornalismo comunitário, software livre, direito à comunicação, governo eletrônico, radioweb, pedagogia de Paulo Freire, economia solidária, entre outras que, ao longo do tempo, são realizadas com o objetivo de apresentar o potencial transformador da tecnologia e sua relação com o nosso cotidiano, respeitando e dialogando com a realidade e com as características de cada comunidade”, diz.



O pesquisador da FGV entende, no entanto, que as práticas pedagógicas dos espaços públicos podem co-existir no espaço privado das lan houses. Em contato com um microempresário de uma comunidade carioca, Cabral interrogou se seria possível realizar algum curso periódico no local. O proprietário do estabelecimento disse que se o estado der a garantia de que “a polícia não vai chegar lá e quebrar tudo”, por ele ser informal, e prestar algum tipo de assistência técnica para os equipamentos, a lan house estaria disponível cerca de três horas por dia para atividades programadas.


 


No momento em que a FGV inicia a pesquisa sobre o fenômeno das lan houses nas comunidades cariocas, Cabral já articula uma parceria com o Projeto Jovens Urbanos, do Itaú Cultural (conheça aqui). A intenção é fazer um estudo mais formal de mapeamento desses estabelecimentos e provocar parcerias do setor público, de financiamento público e licenças simples para o modelo de negócio a cursos ligados a projetos como o Casa Brasil, e até do setor privado, negociando licenciamento de softwares com preços mais baixos.



“Esses jovens estão em contato com um mundo maior, um mundo colaborativo, que construído coletivamente, onde eles são alguém. Vê-se que os mais velhos não conseguem interagir com a net com a mesma facilidade que essa geração que vive a realidade da rede. E mais, a comunidade tem o senso colaborativo. Trazer os pobres para o universo da web 2.0 (internet colaborativa) é como dar banana pra macaco. Alguém sozinho em uma comunidade periférica não é ninguém. E na web acontece isso. As pessoas precisam relacionar-se. E eles já conquistaram isso de forma espontânea”, acrescenta o pesquisador da FGV.



Fonte: Observatório do Direto à Comunicação