O fim da RCTV e a morte de Che Guevara: algo em comum

A atual trama dos Estados Unidos, com a cumplicidade da grande mídia cucaracha (Brasil e o resto da América Latina), contra a Venezuela de Hugo Chávez, sugere lembrar que a execução de Ernesto (Che) Guevara, ferido e amarrado, nas selvas da Bolívia, co

Rodriguez já chegara às primeiras páginas dos jornais americanos em maio de 1987, quando depôs perante comissão parlamentar (presidida pelo senador John Kerry) que investigava o escândalo Irã-Contras. Graças a seu envolvimento nesse episódio que deixou o presidente Ronald Reagan à beira do impeachment, Rodriguez pôde finalmente apresentar-se ao país no papel de herói e celebridade.


 


No livro – co-assinado pelo jornalista americano John Weisman, ghost-writer responsável pelo texto – Rodriguez retrata-se como ''guerreiro das sombras'' em defesa do ''mundo livre'' e ''herói da CIA em uma centena de batalhas desconhecidas'' em Cuba, no Vietnã, na América Central e na Bolívia: Shadow Warrior – The CIA Hero of a Hundred Unknown Battles (editora Simon and Schuster, Nova York, 1989).


 


Uma versão quase oficial


 


O destaque de Rodriguez no livro é para o que considera sua façanha mais notável, a morte de um Guevara batido, ferido e esmulambado nas selvas da Bolívia. Narrado na primeira pessoa, em busca de autoglorificação, o livro torna-se revelador em relação ao papel dos Estados Unidos e sua central de espionagem na América Latina. Até porque o autor orgulha-se da ligação pessoal com o então presidente, George Bush pai.


 


Pelo menos até depor no Congresso sobre o escândalo Irã-Contras, Rodriguez era um daqueles ex-agentes fiéis à CIA, pois ainda usava dinheiro do contribuinte para proteger sua casa com um sistema de segurança de US$ 25 mil. Diante disso, presume-se ser praticamente oficial sua versão da morte de Guevara, que atribui aos aliados bolivianos os detalhes mais escabrosos, inclusive a decisão de matar um homem amarrado e ferido.


 


O general-ditador era René Barrientos; o chefe do Estado Maior do Exército, Ovando Candia, que também seria ditador mais tarde. Em Vallegrande, onde estava o QG das tropas que caçavam o lendário guerrilheiro de Sierra Maestra, o agente da CIA chamou oficiais bolivianos – entre eles, o coronel Joaquin Zenteno, chefe das operações – para festejar, com uma garrafa de Ballantine's, a captura de Guevara em La Higuera.


 


''Traga o cadáver às 2 da tarde''


 


O coronel Zenteno enviara imediatamente ao local, para interrogar Guevara, o tenente-coronel Andrés Selich. À noite anunciou que levaria o homem da CIA no helicóptero (só havia espaço para dois passageiros), na manhã seguinte para La Higuera. A se acreditar na versão, Guevara só morreu porque Rodriguez dera sua palavra de honra a Zenteno, cujo governo já decidira executar o prisioneiro.


 


Antes de retornar a Vallegrande, o coronel disse ao espião da CIA que poderia interrogá-lo à vontade, desde que o corpo fosse levado pelo helicóptero às 2 da tarde. Alega Rodriguez no livro que poderia perfeitamente salvar Guevara. Como só havia um telefone no lugar (e nenhum tipo de comunicação por rádio), quando o helicóptero chegasse, às 2, simplesmente iria ao telefone.


 


Na volta, diria ao piloto ter recebido uma contra-ordem, a pretexto de que Barrientos fora convencido pela embaixada dos Estados Unidos a não matar o guerrilheiro. Se Guevara chegasse vivo a Vallegrande no helicóptero, diz Rodriguez, estaria salvo. Isso porque seria visto vivo por centenas de pessoas, inclusive os jornalistas estrangeiros que ali esperavam.


 


Veterano da invasão fracassada da baía dos Porcos, Rodriguez – cubano de nascimento – já trabalhava há 15 anos como espião. É difícil acreditar na sua história de que a CIA o instruíra a fazer o possível para levar Guevara vivo para ser interrogado na Zona do Canal (sob ocupação militar dos Estados Unidos). Se isso fosse verdade, iriam os subservientes militares bolivianos insistir na execução sumária?


 


Os estranhos privilégios da CIA


 


Basta lembrar que o coronel boliviano fora ao extremo de dar a Rodriguez o único lugar no helicóptero, além de distingui-lo com o privilégio inacreditável de ser a última pessoa a conversar com o prisioneiro – e até decidir de que forma seria a execução (''se quiser, você mesmo pode fazê-lo'', teria dito Zenteno, segundo o relato do livro).


 


Rodriguez alega que, mesmo tendo dado a palavra de honra ao coronel, chegou a hesitar. Mas aí lembrou-se de que o ditador Fulgêncio Batista prendera Fidel Castro (após o assalto ao Quartel Moncada) e depois cometeu o erro de libertá-lo – o que lhe permitiu, anos depois, liderar as guerrilhas até o triunfo revolucionário.


 


Parece mais lógico que a própria CIA – como o governo dos Estados Unidos e o da Bolívia – preferisse a liquidação sumária de Guevara, para pôr fim à lenda. E que Rodriguez estivesse ali precisamente para se certificar de que isso aconteceria. A versão do livro, assim, parece ter sido a mais conveniente aos interesses de Rodriguez, da CIA e dos Estados Unidos.


 


Fonte: Tribuna da Imprensa Online