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Indústria automotiva dos anos 1950 consolidou terceirização

A terceirização não é um instrumento jurídico, mas uma estratégia de negócios incorporada à administração de empresas a partir da Segunda Guerra Mundial. O Brasil conta hoje com mais de 8,2 milhões de terceirizados e há quase três décadas debate, sem consenso, uma regulamentação para essa precária forma de relações entre capital e trabalho.

Na metade do século 20, a indústria bélica, com forte demanda por armamentos, foi a locomotiva da terceirização, que enterrou o “fordismo” e deu origem ao “toyotismo”, até hoje em prática.

O“fordismo”, modelo anteriormente predominante, não contratava terceiros, e nem era por uma questão de princípios, tratava-se simplesmente de seguir regras, até então, adequadas às necessidades corporativas.

Com o fim da segunda guerra mundial, seguiram-se a desconcentração industrial e o enxugamento de equipes nas indústrias, que continuaram “donas” do seu negócio, mas passaram a contar com empresas especializadas ou “sistemistas” em momentos de pico na produção. Essas empresas engordavam a fileira de operários da casa com mão-de-obra extra sempre que necessário.

As empresas enxergaram na terceirização uma forma imediata de baixar os custos com mão-de-obra, aumentando a especialização e a competitividade e, por conseqüência, os lucros.

A terceirização evoluiu e o que era um arranjo temporário tornou-se modelo de eficiência em gestão para os neoliberalistas. Hoje, terceirização é a contratação de mão-de-obra externa para prestação de serviços definidos como atividades-meio, caso de limpeza, alimentação e vigilância, entre outros.

Nessa transação entre empresas – uma, a contratante; outra, a terceirizada — o grande prejudicado é o trabalhador, que recebe um salário, na média, 30% menor do que o dos empregados da contratante e se submete a um ambiente precário de trabalho na terceirizada.

Trajetória no Brasil

Na década de 1950, a exemplo do que ocorreu no mundo, as montadoras brasileiras começaram a utilizar largamente a prática, que acabou se estendendo para a administração pública a partir do Decreto-Lei nº 200, de fevereiro de 1967, que determinou a preferência pela contratação de terceiros para a execução de várias atividades dos órgãos públicos.

Essa estratégia de administração de empresas repercute de forma contundente no direito do trabalho, visto que além de promover substancial alteração na definição típica da relação de emprego, bilateral por natureza, redunda em grave precarização das condições de trabalho em nosso país. E esse processo de deteriorização das relações trabalhistas está se acirrando nos últimos 10 anos.

Sob a ótica do direito do trabalho, o advogado e escritor Mauricio Godinho Delgado define a terceirização como "fenômeno pelo qual se dissocia a relação econômica de trabalho da relação justrabalhista que lhe seria correspondente".

Carmen Camino, autora de “Direito Individual do Trabalho”, enfatiza que na terceirização os elementos típicos da relação de emprego são analisados de modo mais flexível, a fim de permitir a delegação de certas atividades da empresa a terceiros. Daí ser possível dizer que a terceirização integra o processo de "flexibilização do direito do trabalho".

José Martins Catharino, essencialmente pragmático, testemunha ocular da fundação do Instituto Brasileiro de Direito Social, inicialmente uma entidade paulista dos anos 1930, acrescenta que "‘terceirização’ é meio da empresa obter trabalho de quem não é seu empregado, mas do fornecedor com quem contrata. Ter quem trabalhe para si, sem ser empregado, é a razão básica da ‘terceirização´"

A Suécia, a Espanha e a Itália proíbem a terceirização sob a forma de trabalho temporário. A Bélgica, a Dinamarca, a Noruega, os Países Baixos e a França têm regulamentação para a matéria. A Alemanha, a Inglaterra, a Suíça, a Irlanda e Luxemburgo permitem a terceirização, embora sendo desregulamentada, com espaço para a negociação coletiva.

A Argentina, a Colômbia e a Venezuela admitem a terceirização. O México a proíbe, salvo restritas exceções legais, e o Peru limita a possibilidade dessa contratação.

No Japão e nos "tigres asiáticos" (Coréia do Sul, Taiwan, Hong Kong, Cingapura, dentre outros) a terceirização é prática comum e amplamente utilizada. Há no Japão lei específica, existindo sindicato dos trabalhadores subcontratados e necessidade de autorização do Ministério do Trabalho para o funcionamento das fornecedoras de mão-de-obra.

Merece bons olhos o artigo a respeito que consta no Código do Trabalho francês: "Toda operação com fim lucrativo de fornecimento de mão-de-obra que tiver por efeito causar um prejuízo ao trabalhador afetado ou frustrar a aplicação das disposições da lei, do regulamento ou da convenção ou acordo coletivo de trabalho é proibida".

Por Christiane Marcondes