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Celso Amorim: Brasil diz "não" a sanções para dar "sim" a diálogo

“Surpreendente. É de quem não quer obter um ‘sim’ como resposta”. Essa é a avaliação do ministro de Relações Exteriores, Celso Amorim, sobre as sanções contra o Irã aprovadas nesta quarta-feira (9) no Conselho de Segurança da ONU. Por coincidência, o ministro estava na Câmara dos Deputados para atender convite dos parlamentares da oposição que queriam a opinião dele sobre o acordo Brasil/Turquia/Irã.

Sanções da ONU ao Irã - Ag. Brasil

Ele disse que era a primeira oportunidade de manifestação pública do governo brasileiro após o anúncio das sanções contra o Irã. E destacou que a sua fala seria uma redundância do voto da embaixadora Maria Luiza Ribeiro Viotti.

Amorim estranhou o fato de que as sanções foram aprovadas antes mesmo que o Irã se manifestasse sobre a carta recebida ontem (8) das três potências – Estados Unidos, Rússia e França – conhecidas como Grupo de Viena sobre os termos do acordo firmado entre Brasil/Turquia/Irã apresentados pelo Irã à Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA).

Por isso, ele insistiu em repetir as palavras do ex-diretor geral da Agência Atômica, Mohamed ElBaradei, Nobel da Paz em 2005, que elogiou o acordo e criticava a insistência do Conselho de ONU em aplicar sanções ao Irã: “É não aceitar o ‘sim’ como resposta”.

O ministro destacou que o voto do Brasil contra as sanções obedeceu “a nossa convicção de que as sanções não conduzem a nada ou conduzem a tragédias”, citando o exemplo da ocupação do Iraque, acusada pelos Estados Unidos de possuir armas químicas e que depois foi provado que não existiam.

Sem dependência, nem pressão

Para o ministro Amorim, o voto do Brasil não isolou o País do mundo, refutando acusações dos deputados da oposição. “O Brasil não está isolado, porque o Brasil não propôs a resolução, apresentou alternativa”, disse, destacando que todos os países ressaltaram o acordo como passo positivo, mas as sanções já estava encaminhadas.

Para ele, a justificativa para o fato de que todos os demais membros – a exceção do Brasil e Turquia, que votaram contra, e o Líbano, que se absteve – votarem favoráveis, é difícil de assumir em público. Ele disse que conhece o nível de pressão que existe (no Conselho de Segurança) e tem países de economias vulneráveis que não resistem a certa pressões. Houve negociação meses e meses em que os interesse específicos desses países foram tomados em conta.

E se gabou do Brasil não ter dependências financeiras: “O Brasil não deve ao FMI, não precisa se submeter a essas pressões, votamos de acordo com nossa consciência”, explicou, lembrando que o Brasil foi acompanhado pela Turquia, que é membro da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte) e candidato a membro da Comunidade Européia.

Negociações inviáveis

Para ele, as sanções representam ainda “acumular condições prévias que tornem inviáveis as negociações”. E, mais uma vez citou ElBaradei para dizer que “conseguir tudo antes de começar a negociar é a razão pela qual desperdiçamos seis anos na questão iraniana.”

Ele fez um breve histórico do processo de negociação mundial em torno do Programa Nuclear iraniano, que vem se arrastando desde 2002. E destacou o sucesso do acordo liderados por dois países emergentes – Brasil e Turquia – e que resultou na oposição das grandes potências nucleares que, apesar da tentativa de negociação, optou pela punição.

“O acordo não resolve todos os problemas, mas é porta de entrada para discutir os outros problemas”, destacou Amorim. E, em resposta às críticas dos deputados oposicionistas, de que o Brasil estaria se metendo em confusão ao mediar acordo com o Irã, ele disse que fica orgulhoso quando leu no jornal francês Le Monde: “17 de maio de 2010. Essa data será registrada pelos historiados como uma mudança na ordem mundial porque dois países emergentes conseguiram negociar um acordo que os países ricos não conseguiram.”

Luta pela paz

Ele destacou ainda, sempre usando exemplos da mídia estrangeira, que a BBC Brasil divulgou, nesta quarta-feira, notícia de que o presidente do Instituto de Análise Política do Inter-America Dialogue, Michael Shifter, declarou que “mesmo que a posição do Brasil não prevaleça, o pais vai obter reconhecimento como importante ator global que vai ter influências nas grandes decisões internacionais. O Brasil está se afirmando no cenário global e os Estados Unidos vão ter que admitir essa realidade.”

O ministro respondeu a perguntas de oposicionistas e aliados, enfatizando as respostas aos deputados que criticaram a posição do Brasil no cenário internacional ao envolver-se com questões de países distantes. Amorim disse que, se o Brasil quer conquistar um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU, cujo objetivo é manter a paz e segurança do mundo, não pode se furtar de ter atuação dentro desse tema. “Se for só para tratar de interesses particulares estará descumprindo o mandato que terá recebido”, explicou.

Disse ainda que a paz no mundo parece que vem de graça, mas não vem. E que só se percebe a importância dela (paz) quando ela falta, porque as crises econômicas se aprofundam, as pessoas não podem se comunicar, viajar, comercializar. E, portanto, a paz mundial é do interesse do Brasil.

Situação escandalosa

Ele também respondeu aos deputados que apontavam riscos nas posições do Brasil no cenário internacional. Ele disse que “risco existe em toda a política de criar e realizar.” E citou exemplos anteriores: “Quando o Brasil não aceitava a Alca (Área de Livre Comércio das Américas) como estava sendo proposta, estávamos correndo riscos; quando o Brasil paralisou a Rodada de Doha (negociações da Organização Mundial do Comércio – OMC), estávamos agindo com riscos.”

Amorim concordou com a fala dos aliados, como a do deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP), que perguntou se as sanções representam tentativa dos países que detém monopólio das armas nucleares de manter o poder militar, político e econômico. Para o ministro, existe o monopólio das armas nucleares pelos cinco países que fazem parte do Conselho de Segurança da ONU, o que significa uma “situação escandalosa”, já que os cinco países que tem armas nucleares são os que pregam ao mundo que não pode ter arma nuclear.

De Brasília
Márcia Xavier