Combatente veterano do apartheid divide a África do Sul

Jacob Zuma, o vice-presidente do Congresso Nacional Africano, tem muita chance de se tornar o próximo presidente da África do Sul. Apesar de ter recentemente sua credibilidade arranhada por suspeitas de envolvimento em casos de corrupção e escândalo se

Nenhum homem polariza a opinião pública sul-africana mais que o vice-presidente do Congresso Nacional Africano (CNA), Jacob Zuma. Para alguns ele é o homem do futuro, um contrapeso ao arrogante grupo neoliberal de governo que cerca o presidente Mbeki. Para os mais conservadores ele é um demagogo e populista que, apenas 12 anos após o fim do apartheid, poderia lançar a economia emergente à miséria enfrentada pela maioria dos demais países da África sub-Saara.


 


Não foi um caminho direto que trouxe Zuma de Nkandla, na província de KwaZulu-Natal, até Forrest Town. Na infância, Jacob Gedleyihlekisa herdou as cabras da família. Nos anos 50, ele se rebelou contra o regime do apartheid e ingressou no ''Umkhonto we Sizwe'' (Lança da Nação) -o braço armado do CNA. Ele continua cultivando a aura de guerreiro até hoje: Sua canção favorita é ''Bring me my machine gun'' (me traga minha metralhadora) e gosta de cantá-la em encontros.


 


Em 1963, um tribunal do apartheid sentenciou Zuma a dez anos de prisão em Robben Island, na baía infestada de tubarões ao sul da Cidade do Cabo. Seus colegas de prisão lhe ensinaram a falar inglês corretamente, assim como a ler e escrever. Um de seus professores foi um advogado amigável chamado Nelson Mandela.


 


Quase no mesmo minuto em que foi libertado, Zuma foi para Moçambique e Zâmbia, que usou como base para coordenar a resistência do CNA. Após a libertação de Mandela em 1990, ele voltou à África do Sul. Quatro anos depois, após a vitória eleitoral triunfante do CNA, ele se tornou ministro dos Assuntos Econômicos e Turismo e posteriormente foi indicado para a vice-presidência em 1997.


 


Mas tal ascensão meteórica parou em junho passado, quando Mbeki suspendeu Zuma de seu cargo. Um tribunal sentenciou o ex-assessor financeiro de Zuma, o empresário Shabir Shaik, a 15 anos de prisão por corrupção. Shaik também foi acusado de destinar 130 mil euros para Zuma, que tem um estilo de vida notoriamente extravagante, para obter sua proteção para um negócios envolvendo armas. Zumba é zulu e tem pelo menos quatro esposas e dez filhos.


 


Apesar do tribunal em Durban não ter conseguido condenar o político do CNA por motivos processuais, ele chegou à conclusão de que havia um relacionamento condenável entre Zuma e Shaik.


 


Impune, mas com sua posição moral arranhada, Zuma enfrentou outro julgamento em maio. Uma amiga da família de 31 anos acusou o político de estuprá-la. Zuma admitiu ter praticado sexo com a mulher portadora de HIV, mas disse que foi com consentimento dela. Durante o julgamento, Zuma disse que seria desonroso para um homem zulu não satisfazer o desejo de uma mulher. E para evitar contrair HIV, ele tomou uma ducha quente logo depois – um conselho catastrófico em um país onde quase uma entre cinco pessoas está infectada com o vírus.


 


Os advogados de Zuma o defendem sob a alegação de que ambas as acusações contra ele são parte de uma conspiração de seus inimigos políticos para arranhar a credibilidade do vice-presidente do CNA e impedi-lo de alcançar a presidência da República.


 


Enquanto a emergente classe média sul-africana se horroriza e o repudia, muitos negros pobres passaram a apoiar ainda mais o vice-presidente do CNA. A política econômica liberal do governo Mbeki levou a uma sólida taxa de crescimento anual entre 3% e 5%. Mas este boom não atingiu a maioria dos sul-africanos – há poucos lugares no mundo onde pobres e novos ricos vivem em tamanha proximidade.


 


O Cosatu, o poderoso sindicato, e os comunistas – ambos ainda parte do CNA – estão se rebelando abertamente contra o regime de Mbeki. Aos olhos deles, Zuma, o ex-pastor de cabras, é a maior esperança para o futuro.


 


Mas até o momento Zuma tem evitado se posicionar claramente à esquerda. Ele conhece muito bem as estruturas internas do CNA e não deseja parecer uma figura divisora. O partido tem governado com uma maioria de dois terços desde 1994 – mas o CNA ainda age como a organização de luta de resistência da época do apartheid. Apesar de haver eleições formais e referendos na África do Sul, os resultados geralmente são acertados previamente nos comitês. Zuma está aguardando até que sua popularidade por conta própria lhe assegure a candidatura presidencial.


 


E mesmo se o CNA, que apresenta a si mesmo por toda a África como detentor de padrões rígidos para a formação de governos, não indicá-lo, Zuma sabe como usar sua influência – como ''fazedor de reis''.


 


Fonte: Der Spiegel
Tradução: George El Khouri Andolfato  / UOL Mídia Global