Espanha: fracasso social-democrata abre caminho para a direita

A grave derrota sofrida pelo Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE) na eleição de domingo tem pai e mãe: a política econômica ortodoxa adotada pelo governo do primeiro-ministro José Luiz Rodríguez Zapatero para enfrentar a grave crise econômica que afeta o país. Ele próprio reconheceu esta paternidade ao declarar que os “espanhóis manifestaram seu mal-estar e, por isso, este castigo nas urnas era esperado.”

Apesar de trazer a palavra “Operário” em seu nome, a política econômica do PSOE rendeu-se às pressões dos banqueiros e o ajuste ortodoxo feito pelo governo, com aumentos de juros e cortes orçamentários, jogou o país na recessão e agravou a crise social; hoje o desemprego afeta 21% da população (sendo de 40% entre os jovens), um recorde desde o fim da ditadura franquista e da volta à democracia na Espanha.

A eleição realizada domingo indicou prefeitos, vereadores e governos de 13 regiões no país e pode ser vista como uma prévia da eleição de 2012 que, ao renovar o parlamento espanhol, poderá trocar o governo e – tudo indica – entregá-lo para o direitista Partido Popular.

Muitos analistas consideram que os espanhóis votaram por mudanças. E manifestam, em praça pública, desde o dia 15 de maio, sua indignação com os rumos do governo e da economia, ocupando as principais cidades do país num movimento inspirado nos levantes ocorridos nos países árabes.

Mas cabe perguntar: que mudanças são estas e como é que elas combinam com o resultado eleitoral?

Tradicionalmente os governos social-democratas na Europa têm sido a antecâmara de entrada da direita. Incapazes de soluções proletárias avançadas para as contradições, e as crises, do capitalismo, são governos que acabam funcionando como gerentes do capital. Foi assim na República de Weimar, na Alemanha da década de 1920, quando, incapazes de enfrentar o desemprego e a deterioração política, os social-democratas pavimentaram o caminho para a ascensão de Hitler ao poder, com o resultado catastrófico que a história registra.

Mais recentemente, semelhante incapacidade para avançar ante as contradições na Itália, França e Inglaterra (por exemplo), nas décadas de 1960 e 1970, abriu a porta para o neoliberalismo triunfante que, dos EUA e da Europa, espalhou-se pelo mundo nos anos seguintes. A solução encontrada pelo trabalhismo britânico em 1976 foi trocar o desenvolvimentismo keynesiano pelo monetarismo neoliberal, opção radicalizada na década de 1990 por Tony Blair. Sua “terceira via” nada tinha de progressista, nem mesmo de trabalhista. Era uma via neoliberal.

Com governos que, sob o rótulo social-democrata, aplicam políticas econômicas de defesa do capital, as nações europeias percorrem, na atual crise econômica, caminhos semelhantes. Incapazes de avançar, são governos que se afundam no pântano das imposições do “mercado”, no qual o castigo das urnas diagnosticado por Zapatero é o mínimo que pode ocorrer.

A crise política pode se aprofundar. Há um sensível crescimento da extrema-direita na França, que se apresenta “renovada” sob a face sorridente de Marine Le Pen, que substituiu a carranca de seu pai, Jean-Marie, à frente dos conservadores franceses; a surra tomada pelo PSOE fortalece tendência semelhante na Espanha, onde os conservadores seguem em frente da mesma maneira como em outros países, como na Alemanha, na Itália, na Bélgica, por exemplo.

A resistência popular indica, nas ruas de Atenas, Londres, Madri, Lisboa, a disposição dos trabalhadores de não aceitarem que o ônus da crise seja jogado sobre seus ombros.
A resolução deste embate – que, em períodos menos conservadores era designado por seu nome correto: luta de classes – permanece obscura. Na falta de uma proposta de saída claramente proletária, popular e anticapitalista, que rumo vai tomar a indignação popular? Vai conseguir uma expressão política para ampliar e fortalecer a democracia e derrotar a oligarquia financeira? Ou seguirá a anacrônica via das restrições democráticas e do retorno a saídas à direita? Este é o desafio do jogo que está sendo jogado nas ruas, e nas urnas, europeias.