A crise na Bolívia e os pretensos nacionalistas

O tucano Tasso Jereissati, o banqueiro-pefelista Jorge Bornhausen e uma numerosa lista de articulistas da mídia brasileira, entre outros saudosos do entreguista FHC, viraram nacionalistas num passe de mágica. Foi só o presidente Evo Morales cumprir a sua promessa de campanha de nacionalizar a produção do petróleo e gás na Bolívia para que saíssem aos berros em “defesa dos interesses nacionais” e contra os esforços do presidente Lula de integração dos povos latino-americanos. O mesmo bumbo também tem sido batido por Condolessa Rice, secretária de George Bush, e pelos especuladores de Wall Street, todos preocupados com o patrimônio brasileiro. A mídia hegemônica, sempre venal, repete o refrão e ainda faz terrorismo!

 

O súbito “nacionalismo” dos discípulos do Tio Sam é sórdido. Eles nem se deram ao trabalho de explicar o decreto do governo boliviano. Nele não há nenhuma palavra sobre a desapropriação unilateral de bens e propriedades do Brasil. Na verdade, o decreto 28.701, de 1o de maio, apenas materializa as diretrizes da Constituição do país e reafirma a Lei de Hidrocarbonetos. Para Fernando Siqueira, diretor da Associação dos Engenheiros da Petrobrás, “o que Evo Morales propõe não é o arresto de bens e ativos da companhia, mas uma repartição mais vantajosa nos royalties do gás. Se a Petrobrás tiver cabeça fria e competência para negociar, não haverá problemas maiores. O Brasil é o melhor mercado para o gás boliviano”.

 

A intenção dos falsos nacionalistas é também a de criar um clima de pânico na população. A mídia, com o seu sensacionalismo abjeto, espalha o fantasma da iminente crise de abastecimento no país. É certo que o Brasil traz da Bolívia quase metade do gás que utiliza, mas o seu uso é residual no país. Ele serve para a geração de energia elétrica (apenas 2,14% do total), combustível de veículos (1,25% da frota nacional) e insumo industrial (menos de 2% das empresas). Na prática, mesmo que o governo da Bolívia cessasse a venda de gás, não haveria maiores transtornos para a economia nacional. E o presidente Evo Morales já garantiu que não haverá cortes no abastecimento – até porque não pretende cometer suicídio econômico. 

 

Como se observa, a repugnante manipulação dos falsos nacionalistas tem outros motivos. Visa desgastar o governo Lula num ano eleitoral, implodir as negociações para a integração soberana da América Latina e ressuscitar a Alca – o projeto neocolonial dos EUA. É evidente que a decisão da Bolívia coloca novos desafios para o Brasil – a negociação do preço do gás, a preservação do patrimônio e investimentos da Petrobrás e, principalmente, os caminhos da integração regional. Até agora, o governo Lula tem adotado um comportamento exemplar, não se dobrando nem ao terrorismo midiático, nem ao hipócrita arroubo nacionalista da direita neoliberal. Além de defender a soberania do “sofrido povo boliviano”, ele não recuou no seu projeto estratégico da unidade latino-americana. Mas os passos neste rumo, iniciados heroicamente por Simón Bolívar, ainda exigirão muita firmeza e habilidade.