A festa do “Petróleo é Nosso”

O Brasil está ingressando na era da auto-suficiência em petróleo. A publicidade da Petrobras sobre a boa nova já está na TV. O presidente Lula fará o anúncio formal sexta-feira, 21 de abril, dia de Tiradentes, enforcado, esquartejado e declarado infame por lutar pela Independência.

 

 

É uma conquista histórica, a escassos cinco meses da eleição presidencial e em plena escalada dos preços internacionais. Até a oposição, sem discurso nesta esfera, limita-se, como fez o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso no mês passado, a dizer que também contribuiu para o feito. Esqueceu de mencionar sua tentativa de mudar o nome da Petrobras, para “Petrobrax”, alegando conveniências internacionalizantes, quando ele presidia o país, seu genro David Zylbersztajn dirigia a ANP e Henri Phlippe Reichstul estava à frente da estatal.

 

 

Porém a auto-suficiência merece ser encarada sob a ótica da história. O país que não tinha petróleo, segundo o célebre “Relatório Link” (do geólogo norte-americano Walter Link, 1961), extrairá em 2006 uma média diária 1,91 milhão de barris, contra um consumo de 1,8 milhão. A estatal que o entreguista Roberto Campos batizou de “Petrossauro” tornou-se uma das 15 grandes petrolíferas do mundo. No governo Lula, o valor da empresa no mercado de ações saltou de R$ 60 bilhões para R$ 204 bilhões.

 

 

Agora, com a auto-suficiência, cumpre-se a meta fundamental da campanha “O Petróleo é Nosso”. O movimento lançado em 1948. O nome da campanha foi cunhado pela UNE, uma das suas protagonistas. Mobilizou multidões, obteve importante área de apoio militar, enfrentou a violência policial (dois mortos em São Paulo, um no Rio de Janeiro), conquistou a opinião pública na polêmica com os entreguistas da UDN (o PSDB de então). Triunfou em 1953, com a Lei 1.004, que criou a Petrobras. A conquista de hoje deve-se a ela.

 

 

Ao lado da dimensão histórica, do seu significado para a independência e soberania nacionais, a auto-suficiência é também uma vitória tecnológica. Viabilizou-se, a partir dos anos 70, com o domínio da extração em águas profundas, especialmente na plataforma de Campos, Rio de Janeiro. Para tanto, a Petrobras desenvolveu procedimentos inovadores, que colocam-na na dianteira mundial desta tecnologia. Graças a isto, a extração petrolífera foi a mais notável exceção em meio à mediocridade das “décadas perdidas” pós-1980, triplicando o seu volume.

 

 

A vitória avulta de importância em um mundo cada vez mais sedento de petróleo. O preço internacional do barril, que em 2001 era de US$ 13, saltou para US$ 40 em 2004 e nesta semana alcança US$ 72. O fator petrolífero figura com destaque entre os motivos da campanha do governo estadunidense contra a Venezuela, da ocupação do Iraque, das ameaças de ação militar contra o Irã. Os especialistas prevêem uma tensão crescente, na medida em que a curva da produção mundial se estabilizará nos próximos anos, e declinará em seguida, enquanto o consumo de energia continua a se expandir.

 

 

A auto-suficiência é uma conquista que precisa ser reafirmada a cada dia e a cada ano, com novas prospecções e descobertas, como a anunciada nesta semana na plataforma do Espírito Santo. Graças a elas as reservas brasileiras devem se manter em expansão a curto e médio prazo, em contraste com o crítico cenário mundial.

 

 

A longo prazo, o petróleo, recurso não-renovável, tende a escassear também aqui. Mas o Brasil está notavelmente bem posicionado para enfrentar este desafio. O país tira partido de seus recursos naturais. Ele é um dos poucos no mundo que obtêm mais de dois terços de sua energia de fontes hídricas, renováveis e não poluentes. E é o pioneiro universalmente reconhecido em programas de biocombustível, do álcool ao biodiesel: uma alternativa renovável para os combustíveis fósseis, viável aqui graças à abundância brasileira de água, sol e terras.

 

 

Assim, o país conquista a auto-suficiência em petróleo já com as vistas no pós-petróleo. Não é pouco, em um mundo ameaçado pelo espectro da escassez energética. Há todos os motivos para comemorar.