O impeachment, o brasileiro comum e a farsa da direita

Os acontecimentos políticos recentes no Brasil demonstram, mais uma vez, a verdade da afirmação de Karl Marx de que a história se repete como farsa. Em sua tentativa de requentar a crise, a oposição de direita procura agora atingir diretamente o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e, no afã insano de abrir a ferida da crise e fazê-la voltar a sangrar, decidiu – em uma reunião realizada na sede da Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo, no dia 30, pedir o impeachment do presidente.

É uma tentativa delirante de repetir os acontecimentos de 1992, que levaram à cassação do presidente Fernando Collor. São conjunturas incomparáveis: Collor, um aventureiro que salvou a direita e os conservadores da “ameaça” representada pela eleição de Lula em 1989, tomou as primeiras medidas para implantar o projeto neoliberal e colocou-se em oposição a toda a nação. Os atos públicos pelo impeachment começaram em julho de 1992, em Brasília, e como uma onda ganharam o país. Houve manifestações de massa, com milhares de pessoas, em todas as capitais e grandes cidades; em São Paulo, a manifestação de 25 de agosto de 1992 reuniu 500 mil pessoas que exigiam a saída do presidente.

Naquele contexto, surgiram cidadãos honrados e verdadeiramente indignados, simbolizados pelo motorista Eriberto França e pela secretária Sandra de Oliveira, que trouxeram provas das denúncias de corrupção que envolviam o presidente da República e justificavam as manifestações de repúdio. A massa na rua foi o respaldo para o pedido de impeachment apresentado ao Congresso Nacional pela Ordem dos Advogados do Brasil e pela Associação Brasileira de Imprensa, que tinha à frente o grande brasileiro e patriota Barbosa Lima Sobrinho.

A tentativa da direita de repetir aquela conjuntura traz a marca da motivação política. Daí seu caráter de farsa: ela não está à frente de um movimento de massa irrefreável, que repudia e presidente e exige que seja expelido. Ao contrário, é uma resposta à recuperação dos índices de aprovação do presidente Lula que – depois de toda a feroz investida da direita – reaparece como um candidato com chances reais de vitória na eleição de outubro. E mal disfarça o objetivo da oposição neoliberal de pavimentar outra vez o esburacado caminho para voltar ao Palácio do Planalto. Como o sonho de ganhar nas urnas parece-lhe difícil, a direita ressuscita o fantasma do impeachment. Sabe que isso não é fácil por ser uma proposta descabida, mas de qualquer modo procura um caminho jurídico para debilitar a candidatura ou quem sabe até afastá-la. Para isso, convocou o “insuspeito” ex-ministro da Justiça de Fernando Henrique Cardoso, o advogado Miguel Reale Jr, para elaborar a argumentação do pedido de impeachment.

A farsa é reforçada com outro personagem, o caseiro Francenildo dos Santos Costa, apresentado a todo custo como um brasileiro comum, humilde, um herói do povo que se levanta contra os poderosos. A bandeira da oposição são os direitos constitucionais de Francenildo, agredidos com a violação de seu sigilo bancário – que é crime e precisa ser apurada. Isso entretanto não autoriza nenhuma comparação, por menor que seja, entre ele o motorista Eriberto, este sim um brasileiro comum, que não teve benefício pessoal por sua atuação no impeachment de Collor: a última notícia que se soube dele é que era motorista do ministério dos Transportes, ganhando pouco mais do que um salário mínimo. Não se compara com Francenildo – personagem cujo verdadeiro papel e caráter ainda estão por ser esclarecidos.

Mas estes são os personagens da oposição, anões que – na conjuntura de crise que a própria direita criou – querem ter protagonismo de gigantes.