FMI joga gasolina na fogueira mundial

O presidente do Banco Popular da China, o Banco Central do país, Yi Gang, fez duras críticas ao Fundo Monetário Internacional (FMI). Segundo a agência de notícias Reuters, ele disse que uma possível escalada nas tensões comerciais e incertezas políticas são os fatores de maior risco à economia mundial, tema que deveria ser tratado como prioridade em âmbito internacional. Yi Gang se disse “profundamente decepcionado” com o fracasso do FMI de realinhar sua estrutura para reconhecer a crescente influência da China e outras economias de rápido crescimento.

Esse diagnóstico pode ser interpretado como recusa da estrutura do capitalismo em aceitar a nova dinâmica da economia mundial. O funcionamento das engrenagens do sistema ganhou dimensão tão dependente do capital fictício que a entrada nelas dos valores da economia real se torna praticamente inviável. Yi Gang tocou no assunto, segundo a Reuters, ao criticar a ação do Tesouro norte-americano de designar a China como manipuladora cambial após o yuan cair abaixo do nível psicologicamente importante de 7 por dólar.

A grita contra o controle cambial em Pequim na verdade é uma tentativa de fazer a China cair na tentação de integrar sua economia ao giro do capital fictício, que se reproduz sem gerar valor. Como disse o presidente do Banco Popular da China, a depreciação do yuan desde o começo de agosto foi movida por forças do mercado, incluindo a volatilidade desencadeada por uma escalada nas tensões comerciais. Pequim precisou desse recurso para garantir o valor das suas trocas comerciais.

Ao se manifestar “profundamente decepcionado” com o fracasso do FMI, Yi Gang se refere ao discurso dessa instituição a favor de regras comerciais e tributárias sem nenhuma correspondência com o giro da economia real de forma integrada, com intercâmbios que garantam o seu funcionamento sem as amarras do capital fictício. Nada é falado sobre a ciranda financeira ditando regras e impondo ajustes fiscalistas, política que tem mostrado seus resultados catastróficos, sobretudo na Europa e na América Latina.

Quando muito, recomenda aos governos com algum “espaço em suas contas” — alguma margem além do “ajuste fiscal” — a adoção de medidas para a reanimação da atividade econômica. A ideia é da diretora-geral do FMI, Kristalina Georgieva, que considera alguma intervenção do Estado necessária para enfrentar o dilema do crescimento e “o uso banalizado da ferramenta da política monetária”.

O Brasil sob o governo Bolsonaro é um caso típico desse “uso banalizado”. Não se sabe até onde a diretora-geral do FMI conhece a realidade da economia brasileira, mas aqui está um caso típico do que disse o presidente do Banco Popular da China sobre o fracasso do FMI. O quem vem sendo adotado pelo governo, sob a condução do ministro da Economia Paulo Guedes, é a velha política monetarista bem conhecida, que dá em crises sociais graves e revoltas populares explosivas — uma combinação que vem sendo reencenada na América Latina.

Não é possível imaginar o Brasil fora dessa combinação se a velha receita neoliberal continuar sendo prescrita. Sem a retomada dos investimentos públicos, que geram emprego e demanda, além de puxar o investimento privado, o país não tem como sair da armadilha da crise. Mas essa é uma condição que passa por outra orientação ideológica, por outra agenda econômica, por outro cenário político, bem diferente desse do bolsonarismo.