Um erro grave

A ausência de uniformidade das forças de esquerda no processo da eleição do presidente da Mesa Diretora da Câmara dos Deputados merece algumas considerações. Uma delas, é muito importante.

Enquanto do PCdoB e o PDT optaram pelo voto em Rodrigo Maia (DEM-RJ) por motivos amplamente divulgados e explicados, o PT, o PSOL, também por razões legítimas, escolheram a candidatura de Marcelo Freixo (PSOL-RJ).

O que seria uma natural diferença de interpretação tática, transformou-se em polêmica. Mais do que isto. O PT e o PSOL incorreram num erro grave.  Essas duas respeitáveis legendas da esquerda atacaram o direito do PCdoB, partido quase centenário, de ter funcionamento institucional no parlamento.

A origem desse erro se localiza quando PT e o PSOL não respeitaram a autonomia e a independência do PCdoB. Partindo de um acontecimento meramente conjuntural, esses dois partidos se postaram como únicos representantes da oposição do governo Bolsonaro, como manifestou explicitamente o líder do PT na Câmara dos Deputados.

O PCdoB formulou em detalhes a sua opção. Não cabe margem a dúvidas para quem analisou suas notas e opiniões.  Dela, obviamente, pode-se divergir. Todavia, nela não há dubiedade. Salvo uma leitura de má fé quanto sua posição de oposição vigorosa ao governo de extrema direita.

A apressada e artificial conclusão do PT e do PSOL, de que detêm o monopólio da oposição, incorre em erros primários ao transformar o que é meramente pontual em questão de fundo, como se fosse o caso de separar as legendas em campos ideológicos opostos. Deixaram de lado, nesse episódio tão lastimável quanto deplorável, o respeito e o desprendimento que caracteriza a relação fraterna entre as forças políticas do mesmo campo ideológico.

Se não bastassem os princípios programáticos do PCdoB, há os exemplos recentes que deveriam ser levados em conta antes de se propagar versões no lugar de fatos. O PCdoB esteve na linha de frente da luta contra o golpe. Retirou a candidatura presidencial de Manuela d’Ávila, que assumiu a vice na chapa encabeçada por Fernando Haddad, do PT, para fortalecer a unidade da esquerda, decisão que resultou na expressiva votação da oposição e na sua ida ao segundo turno das eleições presidenciais de 2018.

O PCdoB foi o único partido, além do PT, que apoiou Lula em todas suas candidaturas à presidência da República. Os comunistas desde a primeira hora estão engajados na campanha nacional e internacional pela libertação do maior líder popular do Brasil contemporâneo, que se encontra, como preso político, num cárcere infame.

Todavia, o PT e PSOL, de mãos dadas, se arvoram donos da verdade, como se um determinado partido fosse obrigado a seguir o que outros pensam. Ultrapassaram o limite da sensatez ao retaliar a independência da legenda comunista com o questionamento junto à Mesa Diretora da Câmara dos Deputados sobre a incorporação do PPL pelo PCdoB. Não obtiveram êxito.

É de amplo conhecimento: o PPL, partido de trajetória revolucionária, realizou seu congresso extraordinário que decidiu pela incorporação e o PCdoB aprovou essa decisão. Também é público e notório que que essas duas legendas protocolaram suas decisões no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), como determina a lei, um trâmite que para ser finalizado depende de apenas algumas medidas processuais.

Há erros e erros.  O PT e o PSOL, ao atacarem o PCdoB — no seu direito constitucional, de ter funcionamento parlamentar — por uma diferença de conduta política num episódio tático, incorrem num daqueles erros que deixam uma marca negativa, uma mancha nas mãos, daquelas que por mas mais que se lave, lá persiste a mancha. Por esse erro terão que prestar contas à história.

Era de se esperar que viesse um ataque da extrema direita, jamais de aliados do mesmo campo ideológico.  Mas a vida segue.

Como o PCdoB não abre mão de estar na linha de frente da luta contra o governo Bolsonaro, por democracia pela soberania nacional e pelos direitos do povo, os comunistas certamente estarão juntos com as demais forças de esquerda no parlamento e nas ruas, como sempre cumprindo seu papel de força política consequente.