Bolsonaro age contra migrantes e isola o Brasil

O Brasil moderno é um país de migrantes, desde pelo menos as décadas finais do século XIX. Calcula-se que, até a metade do século XX, tenham vindo ao Brasil mais de 4,7 milhões de migrantes, sobretudo portugueses, italianos, espanhóis, alemães, sírios, libaneses, japoneses e coreanos. Que trouxeram a contribuição de seu talento e trabalho e ajudaram construir o Brasil moderno e a fazer dele uma das esquinas do mundo, com gente de todas as origens. Mesmo o presidente Jair Bolsonaro, que investe contra os migrantes, é bisneto de um migrante italiano – seu bisavô Vittorio Bolzonaro emigrou do Veneto, no norte da Itália, para o Brasil abril de 1888.

Mas Bolsonaro, na companhia de seu chanceler Ernesto Araújo, tripudia também sobre esta honrosa tradição brasileira. E nesta terça-feira (8) comunicou oficialmente à Organização das Nações Unidas (ONU) que seu governo copia de maneira servil o do chefe de Estado dos Estados Unidos, Donald Trump, e se retira do Pacto Global para a Migração. Antes, no dia 2 de janeiro, noutra notória atitude de servilismo ante o governo de Donald Trump, Bolsonaro comunicou ao secretário de Estado dos Estados Unidos, Mike Pompeo, a decisão de afastar o Brasil daquele Pacto humanitário.

O Pacto resultou de intensas negociações com o objetivo de se enfrentar a crise dos refugiados na Europa, causada pelas milhões de pessoas que tentavam escapar dos conflitos no Oriente Médio, em especial na Síria e no Iraque, ou da fome na África. Concluído em julho do ano passado, foi assinado pelo governo brasileiro em dezembro. O Pacto estabelece normas e cotas para o acolhimento de migrantes, e respeita integral e soberanamente as leis de cada país. Mas a alegação feita por Bolsonaro, ao confirmar a má decisão de seu governo, passa por cima deste fato: "Quem porventura vier para cá deverá estar sujeito às nossas leis, regras e costumes, bem como deverá cantar nosso hino e respeitar nossa cultura. Não é qualquer um que entra em nossa casa, nem será qualquer um que entrará no Brasil via pacto adotado por terceiros", disse ele.

A afirmação é absurda e xenófoba, chegando a exigir que um migrante faça algo que muitos brasileiros não conseguem: cantar o hino nacional! E pode fomentar reações, inclusive de caráter racista, contra migrantes por militantes da direita que, por ventura, se sintam autorizados pelo que diz o presidente.

A decisão poderá ter pequeno efeito interno no Brasil; foi tomada para agradar ao governo estadunidense e pressionar a Venezuela, de onde vieram refugiados nos últimos meses.

A má decisão de Bolsonaro terá efeitos previsíveis. Um deles poderá dificultar a vida de brasileiros no exterior. Calcula-se que, hoje, para cada estrangeiro que está no Brasil, há dois brasileiros vivendo fora do país.

Outro efeito será, com certeza, mais notado: a demonstração de servilismo e subserviência do governo direitista de Jair Bolsonaro aos Estados Unidos. Afastar o Brasil do Pacto Global para a Migração é mais uma decisão que contraria o espírito fraterno e cosmopolita dos brasileiros, humilha o país e denota a posição genuflexa para agradar a Donald Trump e ao imperialismo. Que, ao lado da diplomacia de Washington, isola o Brasil das demais nações e o contrapõe a organismos internacionais, como a ONU, ao colar-se à tendência de intolerância, contrária à busca de acolhimento e conforto dos milhões de refugiados que a instabilidade gera no mundo.