Vitória das mobilizações populares mostra que vale a pena lutar

O anúncio feito nesta quarta-feira (19) da redução das tarifas do transporte público de São Paulo e Rio de Janeiro é uma incontestável vitória do movimento juvenil e popular que durante quase duas semanas tomou conta do país em combativas e amplas manifestações de massas. Outras capitais – Cuiabá, João Pessoa, Manaus, Natal, Porto Alegre, Recife e Vitória – já tinham anunciado a redução do valor da passagem do transporte coletivo. 

Igualmente, sob o impacto da gigantesca mobilização popular, o Senado anunciou para a próxima semana a votação de projeto de lei – em tramitação há quatro anos – que prevê desoneração fiscal para fins de redução das tarifas de transportes urbanos.

O recuo dos prefeitos Fernando Haddad (SP) e Eduardo Paes (RJ), com os respectivos governadores estaduais (Alckmin e Cabral), foi demonstração de sensatez, diante da evidência de que a obstinação em falsos argumentos tecnicistas aferrados na lógica fria das planilhas de gastos num quadro de capitulação aos princípios da austeridade, só levaria a maior oposição e à radicalização dos protestos nas ruas. Nas declarações que emitiram ao anunciar a volta atrás, os governantes municipais e estaduais de São Paulo e do Rio de Janeiro ainda insistiram em afirmar que a revogação dos aumentos afetará negativamente os investimentos e a alocação de recursos em outros setores sociais.

É um tema a debater, até porque os efeitos práticos desta concepção e desses argumentos podem motivar outros protestos.

É necessário destacar que embora o aumento da tarifa de ônibus em São Paulo tenha ficado abaixo da inflação, a alta acumulada da tarifa nos últimos anos foi bem superior à evolução geral dos preços, situando-a num valor excessivo para a maioria dos usuários.

Quanto aos custos decorrentes da revogação do aumento, por que não cogitar a redução da margem de lucros do patronato? O próprio prefeito paulistano afirmou durante a reunião do Conselho da Cidade que o empresariado é quem menos contribui para bancar o preço de produção do transporte na capital paulista. Para além disso, desde que se fuja da ótica da austeridade, é possível encontrar meios e modos de realocar recursos e mudar a lógica das desonerações fiscais. O próprio Movimento do Passe Livre tem dado sugestões que não deviam ser desdenhadas, como foi a atitude inicial das autoridades.

A vitória alcançada pelas mobilizações populares é uma demonstração de que vale a pena lutar. Uma das conquistas mais preciosas do povo brasileiro ao derrubar a ditadura há quase 30 anos e ao superar os governos neoliberais, há uma década, foi exatamente o direito de lutar. Construir um país mais democrático, soberano, uma nação forte e progressista não prescinde da mobilização e da luta popular, que no caso das recentes manifestações, foram capazes também de derrotar a arrogância e a repressão policial-militar.

Certamente, ao fazer o balanço da luta e das conquistas, as lideranças serão capazes também de examinar a condução política e os métodos empregados no movimento, diferenciando-se de minorias provocadoras, cujos atos violentos são prejudiciais à população e ao patrimônio público.

A mobilização popular em torno da reivindicação de reduzir as tarifas dos transportes urbanos trouxe à tona uma enorme insatisfação que se espraia no país com as difíceis condições de vida, a precariedade dos serviços públicos de saúde e educação, com a insegurança em face do aumento da criminalidade, apesar das inegáveis conquistas sociais da última década. A corrupção e o desperdício de dinheiro público também despertam a justa revolta da população.

Tudo isso demonstra que entra na ordem do dia a luta por reformas estruturais democráticas para atender os justos reclamos populares e avançar na luta para construir um país democrático e justo, com progresso social.