O que há a comemorar depois de Durban?

O tema da conferência climática da ONU que terminou em Durban (África do Sul) no domingo – a COP-17 – eram as mudanças climáticas e as medidas que os países precisariam acordar entre si para mitigar as emissões de gases do efeito estufa, na esperança de conter o chamado aquecimento global dentro de limites toleráveis.

Mas o que foi mesmo que se discutiu naquele encontro, que transcorreu entre os dias 28 de novembro e 11 de dezembro, sendo a mais longa conferência climática já realizada? Muitos reclamaram que não foram os aspectos científicos da mudança climática, destacando-se entre estes o indiano Rajendra Pachauri, presidente do IPCC, sigla em inglês do Painel Intergovernamental para Alterações Climáticas. Tudo indica, a avaliar pela reação de ONGs ambientalistas como o Greenpeace e WWF, que as questões ambientais também não foram consideradas com o grau de exigência requerido por estas organizações (que sempre enfatizam os aspectos “verdes” e mobilizam seus militantes, mundo afora, contra medidas favoráveis ao desenvolvimento, em nome da preservação ambiental). Eles saíram de Durban reclamando do resultado, que consideraram um retrocesso.

Os governos e os diplomatas comemoraram os resultados. Afinal foi seu esforço que garantiu a sobrevida ao Protocolo de Quioto, o único tratado internacional vigente sobre questões ambientais e cujo enterro em Durban era proclamado em todos os quadrantes nos dias que antecederam a conferência. Mas foi salvo a que custo? Esta é uma indagação crucial. O resultado final de Durban acena com o compromisso futuro (é necessário ressaltar) de os países chegarem a um acordo que tenha “força legal” para todos, usando a expressão cunhada pelo negociador brasileiro e que foi a tábua de salvação da declaração final daquela conferência.

Na prática, ficou tudo como está – o Protocolo de Quioto prorrogado, a renegociação de sua segunda fase postergada para além de 2013, entrando em vigor em 2017 ou 2020. É importante prestar atenção nesta última data: ela assinalava o limite, nas previsões mais catastrofistas, para a concretização das contenções nas emissões de gases do efeito estufa tidas como necessárias para conter o aquecimento dentro do máximo de 2ºC e, assim, assegurar um aquecimento “aceitável”. Contudo, o acerto de Durban prevê para aquele ano não essa concretização, mas o início da tomada das medidas consideradas necessárias para chegar a ela. Muitos cientistas veem nisso o risco de um futuro ainda mais quente em decorrência desse adiamento.

No espaço de nove anos entre 2011 e 2020, o mundo assistirá, com certeza, a mais do que mudanças climáticas – verá alterações sociais e políticas que se anunciam dramáticas e profundas, desenhando uma correlação de forças mundial muito diferente daquela que se conhece hoje em consequência da dinâmica da crise econômica mundial e, em sua esteira, da redistribuição do poder e riqueza entre as nações.

Daí talvez decorra aquilo que foi certamente discutido com mais afinco em Durban – os aspectos financeiros ligados à atividade ambiental, fortalecidos com o Protocolo de Quioto, que poderiam significar sérias dificuldades para o hoje florescente mercado de carbono, que se tornou um ambiente de investimento financeiro altamente cobiçado. Há também o Fundo Verde, outro campo de investimentos que ainda não angariou os recursos prometidos (US$ 100 bilhões ao ano!) nem encontrou a definição institucional que dê aos investidores a “segurança jurídica” que garanta o retorno de suas aplicações. A grande discussão, neste ponto, é a busca da definição sobre quem vai comandar este fundo multibilionário.
 
Os EUA e os países ricos querem que seja gerido pelo Banco Mundial, reforçando o poder desta agência sobre os países que receberem aqueles recursos – os de sempre, as nações pobres do chamado Terceiro Mundo que, para serem “beneficiadas” por recursos estrangeiros, seriam constrangidas – como sempre foram – a abrir mão de sua soberania nacional e de projetos autônomos de desenvolvimento. Os países em desenvolvimento, por sua vez, querem que o gerente do Fundo Verde seja a própria Convenção do Clima da ONU. Este impasse talvez seja a melhor explicação para o fato de o Fundo Verde, aprovado em Copenhague (em 2009) e em Cancún (em 2010) ainda não sair do papel e não ter dinheiro para investir.

De toda forma, a grande novidade – ou êxito, como queiram – de Durban foi fixar um calendário cuja referência é o distante ano de 2020. Para o grau de ameaça alardeado nos últimos tempos, quando o planeta tem sido descrito como à beira da catástrofe climática, é pouco. De Durban não saíram decisões concretas, mas declarações de intenção.