Em memória de Helenira Resende, ele, não!

Sou apenas guerrilheira,
que tais são as patentes da luta.
Sou a que espalha enquanto junta,
a liberdade companheira.
Sou a Preta Helenira:
comunista brasileira.

Na guerra de pesquisas eleitorais que assolam o País, Aquele Que Não Deve Ser Nomeado, também conhecido pela alcunha de #EleNão, mas cujo registro no Tribunal Superior Eleitoral é Jair Bolsonaro, lidera a corrida ao Palácio do Planalto.

Muitos nos perguntam como isso é possível. Muitas são as explicações. Dentre elas, avulta a seguinte: de nossos 518 anos, 322 foram de Colônia; 67, de Monarquia; 40, de República Oligárquica; e 29, sob ditaduras, o que somam 458 anos de escassa ou nenhuma liberdade contra apenas 60 de alguma democracia.

Já que estamos sob o império das pesquisas, são 88,4% contra 11,6. E já que falamos de História, nunca é demais lembrar que temos 100% dela sob o domínio estrangeiro: primeiro, Portugal; depois, Inglaterra; agora, Estados Unidos. Todas estas potências a tramar com agiotas e latifundiários tupiniquins contra o interesse nacional, promovendo golpes, pilhagens e assassinatos.

Não é à toa, portanto, que os representantes das oligarquias e do imperialismo, via de regra, liderem as intenções de voto, e que o capitão Bolsonaro, fascista de quatro costados, herdeiro direto dos assassinos que comandaram a Ditadura Empresarial-Militar que nos infelicitou por 21 anos, num quadro de desencanto geral, de depressão coletiva, de revolta mal contida contra as bandalheiras promovidas pelas elites irresponsáveis, amealhe as maioria dos percentuais dos institutos de pesquisa.

Mas a História tem ao menos dois lados, e, a uma taxa de dominação cheia, sempre fez corresponder uma taxa de resistência também cheia, como a reiterar a verdade de que a uma ação sempre responderá uma reação contrária de igual magnitude. Muitos patriotas, democratas e revolucionários se empenharam por independência nacional, liberdades democráticas e justiça social, e sempre desembolsando, é verdade, quantias elevadas da própria vida por conta desta teimosia em enfrentar os muito ricos, mas, reiteradamente, arrastando multidões famintas de mudança.

Dentre estes muitos, peço licença de destacar a figura de uma moça simples, mas incomum, nascida em Cerqueira César, cidade do interior do estado de São Paulo. Registrada sob o decassílabo ‘Helenira Resende de Souza Nazareth’, ficaria conhecida como Preta, evidente referência à sua cor e às suas origens. A filha do médico, comunista e, pelo nome da menina, poeta, Adalberto de Assis Nazareth, baiano de Nazaré das Farinhas, tornar-se-ia, mais tarde, Fátima, um dos ícones da Guerrilha do Araguaia, rebelião popular armada liderada no Sul do Pará pelo PCdoB contra a Ditadura, e que provocou a maior mobilização de forças militares nacionais depois da Segunda Guerra Mundial.

Antes de se fazer guerrilheira, Helenira, a Preta, foi estudante secundarista e gremista em Assis, interior de São Paulo, aluna da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras no combativo Campus Maria Antonia da Universidade de São Paulo, professora em Guarulhos, também em São Paulo, e Vice-Presidente da UNE.

Militante do PCdoB, Preta participou do Congresso da UNE em Ibiúna, no qual foi presa. Nesta prisão, conheceu a tortura e foi ameaçada de morte pelo delegado Fleury, torturador e assassino pago pela Ditadura que pariu Bolsonaro. Libertada por meio de uma habeas corpus, e impossibilitada de continuar atuando à luz do dia, largou seu curso de Letras na USP e as aulas que ministrava em Guarulhos, e imergiu na clandestinidade. Uma sua irmã chegou a articular sua saída do Brasil. Helenira recusou. Para ela, quem deveria sair de nossa terra eram os golpistas, traidores da Pátria, algozes do povo trabalhador, liberticidas. Ao invés de ir para fora, internou-se nas matas do Araguaia, no coração do Brasil.

Helenira tombou combatendo a Ditadura Militar implantada pelos mega-ricos do Estados Unidos e seus vassalos no Brasil. Seus assassinos a capturaram, metralharam suas pernas, chutaram seu corpo ferido, perfuram-na a golpes de baionetas e sumiram com seu corpo. Não deram conta, todavia, de enterrar sua enorme coragem. Queriam que entregasse seus camaradas, que os delatasse. Há quem diga que, se toda lenda é expressão da verdade, tem parentesco com verdade a voz do povo quando conta que, durante a tortura, a cada vez que perguntavam seu nome, ela respondia: “Sou uma guerrilheira da liberdade”.

Essa coragem insepulta de Helenira, somada a todas as bravuras semeadas naquele então, foi essencial para o povo brasileiro conquistar liberdade e melhores dias. Sem Helenira e seus camaradas do Araguaia, a Ditadura não teria sido derrubada. Se nosso voto é livre hoje, isto devemos a Helenira, à Preta Guerrilheira do Povo.

Sabendo disso tudo, quem, com um mínimo de patriotismo e senso de humanidade, votaria no representante de seus assassinos, um inimigo da liberdade, do Brasil e da vida?
Helenira – a Fátima do Araguaia, a Preta de nossos dias vividos e por viver –, viva estivesse, punho erguido, bradaria: Ele, não!



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