O ataque especulativo contra Manuela Presidente

A candidatura de Manuela D’Ávila à Presidência da República é a que mais sofre ataques especulativos. Todos os cenários adivinhados pelos oráculos da política são invariáveis num ponto: Manuela se retirará da contenda em favor de alguém. Nunca, o inverso. São favas contadas. Inclusive, alguns dirão, do alto de sua sabedoria pragmática, que dois e dois são quatro: o PCdoB é o menor à esquerda. Trata-se apenas de saber quando recuará.

Leitor assíduo da Bíblia, este escriba que aqui digita tem predileção pela passagem que nos dá conta de Davi e Golias, emblema de como uma força com menores recursos pode, com uma boa tática, decidir uma partida. Ademais, o Davi aqui em tela tem uma boa reserva de saúde: conta com um governador, uma senadora, uma combativa bancada de deputados federais, uma boa porção de estaduais, vereadores, prefeitos, a hegemonia do movimento juvenil, robustez nos movimentos sindical e comunitário, destaque e referência no movimento feminista e na frente intelectual, força crescente no movimento LGBTI. É, portanto, um Davi de respeito, não um davizinho.

Manuela segue candidata. Essa é a resolução tomada pelos comunistas em sua convenção eleitoral. Diante da teimosia do Partido dos Trabalhadores, que já-já explicaremos, da suposta neutralidade do PSB e do finca-pé de Ciro – ou seja, diante da falta de unidade do campo popular, manter Manuela se coaduna com importantes convicções do PCdoB: unir o Brasil em torno de uma plataforma de desenvolvimento nacional cuja base é a independência do País, a restabelecimento da democracia e o enfrentamento da crise aberta por Temer e os golpistas do PSDB. O alvo é o capital especulativo de fora e de dentro, representado pelos tucanos; o eixo de enfrentamento do inimigo e seus aliados é a unidade do campo nacional, democrático e popular.

– Ciro também defende isso! – alertar-nos-á um observador atento.

Sim. Mas numa perspectiva liberal. Ciro já se definiu como um “liberal keynesiano”. Nesta quadra de acerbo neoliberalismo, nada contra, e muito a favor. Todavia, conhecemos bem os limites de um projeto nacional numa perspectiva liberal, ainda que sob os auspícios de Lorde Keynes.

Manuela tem uma perspectiva popular de projeto nacional, cuja matriz é o Programa do PCdoB, pioneiro na concepção e nomeação do Projeto Nacional de Desenvolvimento. A perspectiva nacional-popular dos comunistas tem nos trabalhadores a força motriz do projeto que, por ser a mais consequente, é capaz de congregar os setores médios e a grande produção. Por conta desta perspectiva é que Manuela é a síntese do que há de melhor nas proposições de cada uma das forças do campo popular. Além do mais, é mulher, é jovem, é mãe, tem personalidade, assertividade e preparo, estatura de estadista. É a novidade do cenário eleitoral. É ar fresco matinal a invadir os cômodos viciados do ambiente político.

– Se ela é tudo isso, ô seu articulista, por causa de quê Ciro e Lula teimam em não dar passagem?

A insistência do PT na tática do ‘Lula ou nada’ dá a impressão de que a cúpula petista há muito deu por perdida essa eleição que chega. A alça de mira dos companheiros aponta, não para o neoliberalismo da Casa Branca e da Casa Grande representado por Geraldo Alckmin, mas para a manutenção de sua hegemonia à esquerda do espectro político. Para o petismo, trata-se de disputar nestas eleições, não a cadeira presidencial, mas a supremacia, o posto de comando da frente de resistência que terá de se formar para enfrentar o tempo encoberto que, ora irrefreável, se espalhará pelos próximos anos da vida nacional.

Um dos elementos que explica o Golpe de 16 está nos limites da condução política dada pelo PT ao ciclo progressista que vai de 2003 até a interrupção do mandato de Dilma. A derrota política do campo revelou os limites do comando. A partir desta derrota, o centro de gravidade da hegemonia no campo popular assinalou uma tendência de deslocamento. A questão nacional ficou mais nítida como o nó a ser desatado para enfrentar a crise política e econômica. O PT jamais entendeu isso e nunca soube, como ainda não sabe, manejar bem a questão. Duas forças empalmam com força e consequência a bandeira: o PCdoB e o PDT.

Diante desta perspectiva, o PT põe Lula tamponando a passagem, faz de tudo para isolar Ciro e obstaculizar os passos de Manuela. Uma das últimas cartadas do hegemonismo petista foi o acordo com o PSB pernambucano, em que supostamente se trocou a neutralidade dos socialistas pela retirada da candidatura de Mariana Arraes, do PT, ao Governo de Pernambuco. Quanto à Manuela, emblemática foi a encenação de que poderia ser vice de Lula. Lulistas de todas as cores e tamanhos se entusiasmaram. Alguns, membros de direção partidária, destituídos… de bom senso, chegaram a postar nas redes sociais fotos em que aparecem vestidos com camisetas amarelas pró-Lula presidente. Diante do bombardeio, militantes trocam mensagens de zap: “E aí, quais as novidades? Ela vai ser vice? Vai disputar o Palácio Piratini?”.

Num quadro de absoluta instabilidade como o que ora experimentamos, daqui para agorinha toda água pode virar vinho (e, o vinho, vinagre). Logo, ninguém pode dizer “deste líquido não beberei”.

Esse pobre teclador é convicto de que Manuela é o nome da unidade; a candidatura melhor situada, e melhor capacitada para encabeçar uma frente que congregue, além do PCdoB, o PDT, o PT e o PSB. Uma frente assim, liderada por uma mulher assim, seria capaz de ampliar o leque de apoios, empolgar vastos setores do eleitorado e encetar uma contra-ofensiva patriótica e democrática, ou, no mínimo, ser instrumento eficaz de fortalecimento do campo popular para peitar os desmandos das classes dominantes.

Tudo indica, no entanto, que prosseguirá a fragmentação do campo popular. PT e PDT parecem estar bem alicerçados em suas convicções e não demonstram tendência a abrirem mão de seus propósitos. O PSB ainda é uma nau cujo comando e rumo estão em disputa.

Num quadro assim, a candidatura de Manuela, ao invés de minguar, cresce em importância; ganha foros de necessidade política. Quando não há clareza entre a maioria dos assinalados, e o povo procura uma nesga de luz em meio à escuridão do mar revolto, uma lâmpada acesa, por menor que seja, vira farol.

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