TV Cultura no brejo

Esta semana, o jornalista Augusto Nunes disse ter deixado a TV Cultura de São Paulo “por pressões políticas” de interesses privados incrustrados na emissora estatal. Se ele vem a público com críticas severas, dá pra se ter uma ideia da situação naquele veículo de comunicação, que já foi referência nacional de qualidade.

Afinal, nos últimos anos Augusto politizou o quanto pôde o jornalismo da casa, apoiando abertamente o golpe que derrubou Dilma Rousseff, por exemplo, especialmente no programa Roda Viva, que ele apresentava. Mas passou a ser a regra, também, dos próprios noticiosos, como o Jornal da Noite, com um âncora e dois comentaristas, que são, em geral, metralhadoras giratórias contra as esquerdas.

Salva-se uma ou duas figuras históricas, como o advogado Ayrton Soares, ex-deputado constituinte, que participa nas segundas-feiras. Normalmente ele tem, no outro lado da bancada, Marco Antônio Villa, que se autointitula historiador. Outro dia, esse sujeito afirmou no ar que a ditadura militar só começou com o AI-5, em 13 de dezembro de 1968. Segundo ele, quem disser que ela teve início com o golpe de 64 “não sabe de nada”. Ayrton, com fineza, retrucou no ato: “a história que você conhece é bem diferente da realidade que eu vivi”.

O mais grave, porém, é que o jornalismo é apenas uma amostra do que se passa em toda a grade de programas das Rádio e TV Cultura, geridas pela Fundação Padre Anchieta, do governo paulista. E o destino ainda facilita a vida dos seus dirigentes. A morte do apresentador Antônio Abujamra, por exemplo, retirou do ar o Provocações, um programa de entrevistas de alto padrão.
As recentes gestões tucanas do governo do Estado vêm há anos desmontando a programação das emissoras, alegando redução de custos e busca de maior audiência, numa disputa esquisita com as demais TVs abertas. Como se esse percentual do Ibope fosse referência pra um conteúdo de interesse público.

Na verdade, aquelas emissoras vêm passando por um processo de privatização, que se acelera a cada dia que passa. A requintada programação infantil, com produção própria, passou a ser substituída por enlatados estrangeiros de qualidade sofrível. Isso, num país que tem autores como Monteiro Lobado, Maurício de Souza, Ziraldo e tantos outros respeitados no mundo inteiro.

Nas artes dramáticas, deram fim a programas que debatiam teatro e cinema e à encenação de peças de autores clássicos. Os próprios filmes, outrora sob rigorosa seleção, foram banalizados. Parecem querer competir com a Globo, que condena a criminalidade nas cidades, mas constantemente exibe filmes de tiroteios, de terceira categoria, nos chamados horários nobres.

Em especial no jornalismo, a tendência é piorar neste período de eleições. Pela imparcialidade da emissora de TV, o que se pode dizer é que Augusto Nunes fará falta.

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