1948-2018: O rastro de sangue do facho-sionismo

Na aldeia palestina de Deir Yassin, fincada numa colina rochosa na orla oeste de Jerusalém, um pequeno grupo de três pedreiros, três talhadores de rocha e um motorista de caminhão estavam terminando seu turno de vigilância durante a noite de 8 para 9 de abril de 1948. Não havia como não se sentir ameaçado.

Entre dezembro de 1947 e março de 1948, muitas outras aldeias (Beld Shaikh, Sasa, Karf etc.) haviam sido varridas do mapa pela Haganah, a principal organização armada clandestina sionista, e por dois esquadrões da morte especializados nos métodos mais cruéis e covardes de ação terrorista, Stern e Yrgun, nos quais os futuros primeiros-ministros israelenses Begin e Sha­mir começaram suas peculiares carreiras militantes. Decididos a conquistar o máximo de terreno para o Estado que pretendiam proclamar unilateralmente no dia 15 de maio de 1948, data fixada pela ONU para o término do mandato britânico, os destacamentos de choque sionistas estavam utilizando a fundo a superioridade de sua organização militar e de seus armamentos, ampliaram a escala de sua ofensiva.

Ás 4:30 da madrugada de 9 de abril, tropas de assalto combinadas do Stern e do Yrgun irromperam em Deir Yassin. O grupo de vigilância as viu chegar e deu o alerta. As armas de que dispunham os moradores eram irrisórias, comparadas às dos assaltantes. Mesmo assim eles resistiram cerca de duas horas, até esgotarem as munições. Começou então uma orgia de bestialidade que sequer poupou mulheres grávidas, cujo ventre foi aberto a facadas. Duzentos e cinquenta e quatro palestinos foram assassinados; dezenas de meninas foram estupradas, um recém-nascido foi arrancado dos braços de sua mãe, jogado ao chão e pisoteado. A obra de destruição da aldeia foi completada com dinamite. (Um relato mais circunstanciado da chacina de Deir Yassin está no livro Ô Jerusalém, escrito pelos jornalistas Dominique Lapierre e Larry Collins; há tradução em português). Os depoimentos dos poucos sobreviventes aos policiais britânicos foram reunidos por Sir R. C. Catling, diretor-geral adjunto do Criminal Investigation Department britânico na pasta “secreta e urgente” nº 179/11017/65. Eles contêm pormenores horripilantes.

Setenta anos depois, em 14 de maio passado, a execução em massa de palestinos de Gaza mobilizados contra a transferência para Jerusalém da capital de Israel foi mais rápida. O exército israelense simplesmente atirou na multidão desarmada, matando sessenta e um manifestantes, que se somaram aos que já vinham sendo sumariamente executados desde o início dos protestos em 30 de março, num total de pelo menos 112 palestinos, entre os quais 14 crianças. A responsabilidade por mais este crime contra a humanidade cabe não somente ao governo facho-sionista, mas também a Trump, que tomou a decisão provocadora de transferir para Jerusalém a embaixada estadunidense, violando acintosamente as Resoluções 476 e 478 do Conselho de Segurança das Nações Unidas, de agosto de 1980, que respectivamente declararam a parte oriental da milenar capital da Palestina território ocupado por Israel e convidaram as embaixadas então instaladas em Jerusalém a se transferir para Tel Aviv. Todas acataram a resolução. Essa vitória diplomática e moral de um povo esbulhado e humilhado é agora torpedeada pelo Al Capone da Casa Branca.

O covarde massacre de Gaza foi condenado mesmo pelos satélites europeus da Otan. Só os estafetas de Trump e os funcionários do Estado terrorista atreveram-se a tentar pôr a culpa no Hamas, que governa Gaza (transformada num enorme ghetto bloqueado por terra, mar e ar pelas forças armadas israelenses), de ter usado crianças como escudos humanos. Mesmo a supor que houvesse um átomo de verdade nessa falácia, a chuva de balas foi indiscriminada e todas as vítimas foram atingidas dentro dos limites da faixa de Gaza.

Nem toda arrogância é cínica, nem todo cinismo é boçal, mas o cônsul de Israel em São Paulo juntou esses três maus traços de caráter declarando à revista Veja que “Se quiser, Israel poderia destruir Gaza em apenas uma hora” (16 de maio de 2018). Não sabemos se o mau português é do Cônsul, da Veja ou dos dois juntos, mas a ambiguidade do enunciado sinaliza a torpeza do raciocínio. Dizer: “se, Israel quisesse, poderia”, estaria sugerindo que Israel não quer extermínio rápido, portanto que a ideia é limitar-se a matanças esporádicas; dizer: “se Israel quiser, poderá”, é ameaçar diretamente. O Consulado israelense e o periódico de extrema direita ficaram no meio do caminho, não dizendo nem uma coisa nem outra, mas deixando confusamente entender ambas. Eles insultam não somente os princípios humanitários consagrados na infelizmente impotente Carta da ONU, mas também a inteligência alheia. Qualquer força aérea pode destruir cidades indefesas em uma hora, talvez em meia hora. A Luftwaffe nazista fez isto na aldeia basca de Guernica em 1937. Israel, que dispõe de armas nucleares toleradas pela “comunidade internacional” (=o bloco imperialista e seus satélites) poderia, seguindo o exemplo de seus protetores estadunidenses em Hiroshima e Nagasaki, aniquilar grandes concentrações humanas em um minuto. Não o fazem por duas razões complementares: os dejetos radioativos de uma explosão nuclear em sua fronteira também os atingiriam e, sobretudo, potências que não comem na mão do Pentágono dispõem de arsenais nucleares bem maiores do que os deles. Tal é a lógica da força bruta de destruição maciça.

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