Tática eleitoral e independência política

Salve, preclaro leitor, digníssima leitora! Como têm passado? Espero que, em meio a tanta turbulência no Brasil e no mundo, estejam bem.

Da minha parte, confesso que ando entre agastado e divertido. O xadrez político, ora dá no cravo, ora na ferradura e, vez ou outra, faz vítima o dedo de um cristão. A suspeita é a de que estamos aboletados numa cadeira desconfortável de um pardieiro qualquer, assistindo a uma destas farsas maçantes, com raros lances dignos de riso.

Neste abril que já vai pra lá de meio, as elites golpistas encarceraram e mantém no isolamento o líder inconteste de todas as pesquisas eleitorais. Nem mesmo um teólogo e um Nobel da Paz podem visitá-lo. O Supremo Teatro Federal tenta salvar sua lavoura há muito desmoralizada ao aceitar como boi de piranha da Casa Grande o senador tucano de carreira Aécio Neves e, por ouro lado, irrita-se com os comunistas, que meteram na pauta da Corte uma Ação Direta em defesa da constituição e do Estado de Direito. É que os vermelhos cutucam a consciência suprema ao lembrar-lhe que não se pode prender ninguém sem que sentença transite até o último recurso. Com base em surrada e grossa mentira, bombas são despejadas por Trump na Síria, o que levou o mundo ao risco de uma mega-guerra. Um ex-presidente da Câmara dos Deputados, outrora primeiro da fila no honrado PCdoB, tomou chapéu de um juiz aposentado, e foi bater com os costados no Solidariedade do há muito manjado pelego Paulinho da Força. Não bastasse essa situação, de per si, bastante vexaminosa, aparece na foto ao lado de um caboclo tão tatuado quanto aluado, fã de carteirinha de Michel, o temeroso.

Diz se não é prum cabra se avexar?

Mas, entre a gastura e a ironia, a gente vai varrendo o quintal, lavando a louça pouca, enquanto a cuca busca as saídas e pondera os possíveis caminhos…

Vejam vocês que o campo democrático vai devagarinho se vitaminando. As pesquisas eleitorais dão conta de que os partidos populares somam percentual de votos que possibilita aos brasileiros uma quinta vitória. A proposta de constituição de uma ampla frente política e eleitoral ganha substância.

Por outro lado, parece que aos poucos vai caindo a ficha de que a prisão de Lula é mesmo uma enorme armação, ao tempo em que os golpistas não dão conta de construir uma alternativa unitária para vencer as eleições de outubro. Há uma profusão de candidaturas no Partido de Silvério dos Reis. Daí, esse recrudescimento autoritário, essas manobras temerárias com a lei, essas lutas fratricidas nos partidos das elites.

Ocorre, todavia, que no campo de cá, não obstante os avanços, ainda não vai bem calibrada a pontaria.

O Partido dos Trabalhadores insiste em interditar a passagem com a candidatura de Lula, custe o que custar. A tática de deixar-se prender… bem… não me pareceu a mais adequada. Um líder como Lula, livre para organizar a resistência de onde estivesse, parece mais produtivo do que confinado, a depender da solidariedade de quem sequer consegue dele se aproximar.

Ciro segue o seu périplo. Viaja o Brasil e o exterior, leva sua mensagem de desenvolvimento nacional. Mas, não parece muito interessado em pugnar pela consolidação de um campo patriótico, embora a fundação de seu partido tenha participado da elaboração de um manifesto em defesa do Brasil e da democracia.

Boulos ainda não deu o seu recado à Nação. Seu MTST ocupou o famigerado tríplex, o que entra no esforço de defesa de Lula. Seu partido também participou da elaboração do documento das fundações. Dá a impressão que depois do lançamento de sua candidatura, estacionou.
O PSB anda às voltas com Joaquim Barbosa. Ameaça construir uma dobrada entre o ex-juiz e a Marina Silva, da Rede. Esse movimento enseja a migração de Aldo Rebelo para o Solidariedade, que o lança à Presidência. Não se sabe qual será a tendência da candidatura do PSB. O certo é que ela mexe forte no cenário eleitoral.

E os comunistas?

Manuela D’Ávila vem de lançar seu Manifesto intitulado ‘Liberdade para o Brasil, para Lula e para as Brasileiras e Brasileiros’. O ato de lançamento, realizado no Teatro Oficina, em São Paulo, deixou de ser um evento-marco de sua candidatura e se tornou um ato pró-Lula da Frente Brasil Popular, com falas de nada menos que seis petistas e de um conjunto de personalidades em defesa de… Lula. Todos agradeceram o convite e saudaram a candidatura do PCdoB, mas todos tinham outros candidatos em mente, sendo que um deles ocupava mais mentes e falas do que Manuela e Boulos.

Já escrevemos aqui que o PCdoB dá um “ippon tático” ao lançar Manuela Presidente. No entanto, para que o Partido e o País tirem todas as consequências dessa manobra bem feita, é preciso que os comunistas calibrem suas baterias.

A bandeira em defesa dos direitos políticos e constitucionais do ex-presidente Lula, ao ser alçada acima das bandeiras da independência nacional e da frente ampla, e ser posta no centro da tática política, estreita o espaço de movimentação dos comunistas e das forças progressistas pelo objetivo de libertar o Brasil e construir a vitória do povo nas eleições vindouras.

A compreensão do 14º Congresso do PCdoB é a de que é preciso posicionar melhor o instrumento da transformação social, o Partido Comunista, no cenário nacional, para que possa se alçar como voz vanguardeira da resistência. Ao submeter-se objetivamente a uma tática que não é a sua, compromete sua independência, e emite ao campo patriótico um sinal que não se coaduna com as responsabilidades que se propôs a assumir.

A Nação reclama uma voz que lhe fale ampla e francamente. Manuela D’Ávila e seu PCdoB são essa voz. Precisam se desembaraçar dos fios que os enredam, romper com o círculo de giz que desenham para lhes conter e se lançar como força autônoma, cujo discurso é o da Independência Nacional como primeira condição para que haja liberdade, democracia e direitos para os trabalhadores e a nação brasileira.

Nada disso conflita com a construção de uma ampla união de forças, nem mesmo com a defesa dos direitos de Lula. Pelo contrário: quanto mais Manuela fala de si, de sua plataforma nacional e democrática, do Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento; quanto mais aponta suas baterias contra os inimigos da Nação – contra o imperialismo, o latifúndio, a oligarquia financeira; quanto mais fala ao trabalhadores e trabalhadoras, mais ela e o PCdoB colaboram com a construção de uma larga frente democrática e patriótica, assim como melhor colaboram com a defesa de Lula e a luta por sua libertação.

Libertar o Brasil e construir a vitória do povo em 2018 é o caminho de liberar Lula e fortalecer o campo patriótico. O contrário, para mim, que já estou aqui a pôr ordem no guarda-roupas, é querer fazer o quarto caber na mala.

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