Golpe de classe

Vista de todos os ângulos, a intervenção militar de Temer no Rio de Janeiro é coerente com o Golpe que a aliança entre a Casa Grande e a Casa Branca deram nos trabalhadores brasileiros.

Tropas treinadas para o combate contra um inimigo externo são usadas pelo próprio inimigo externo, com a interveniência do desgoverno e da mídia das classes dominantes de dentro, para combater o povo, representado nesta etapa da escalada golpista pelas comunidades já suficientemente maltratadas dos morros e bairros populares da cidade já nem tão maravilhosa.

Há quem, com base no apoio da sociedade à intervenção, faça malabarismos, com direito a acusações contra a chamada esquerda, e veja visão tacanha e simplista em quem é contra , ou visada academicista em quem não se curva ao bolsonarismo da medida. O que equilibristas não conseguem esconder é o fato de que não são as mochilas dos meninos do Colégio São Bento ou Bennet a serem reviradas pelos soldados, mas as dos filhos de trabalhadores das escolas públicas, meninos das favelas, a maioria, negros.

A coisa parece clara, assim como o recado que carrega: o Exército foi mais uma vez mobilizado contra o povo a quem constitucionalmente está obrigado a defender. E a mencionada aliança, por meio dos coturnos, mandou avisar: já tínhamos a Lei, manietada pela toga e, quando conveniente, mexida pelo parlamento; agora, temos a Ordem.

O jovem Marx, não lembro em qual de seus escritos, disse que a segurança e a ordem são temas dos mais caros à classe dominante. E ao Estado ela entregou o direito do chamado uso legítimo da força. A intervenção no Rio é, pois, o Estado das elites sendo Estado para as elites.

Todavia, se a intervenção de Temer escancara o caráter de classe de seu Golpe, ela também esconde que esse Golpe, embora pareça atender a diferentes interesses dos diferentes segmentos das classes dominantes, é o Golpe de um dado segmento dominante contra não somente os trabalhadores, mas também contra os escalões médios da sociedade, e mesmo contra outros segmentos das classes dominantes.

– Eita, que lá vem ele bagunçar o que tava tudo arrumadinho!

Calma, sujeito. Calma, que eu já me explico.

A Confederação Nacional da Indústria vem de publicar pesquisa que demonstra um índice de evolução produtiva do parque industrial brasileiro abaixo da linha de corte de 50 pontos – o que, para os que manjam de economia, não é nada bom. A CNI (essa é a sigla da dita Confederação) sabe que a utilização da capacidade ociosa de nosso setor produtivo é, neste janeiro que passou, de 65% – inferior 5% à média para o mesmo mês medida entre 2011 e 2016. Sabe também que o Brasil está a viver uma das maiores desindustrializações de sua história.

Na manhã do dia em que escrevo este artigo, o presidente da poderosa Federação do Comércio do Rio de Janeiro, empresário, portanto, foi preso pela operação Lava Jato. O Sistema Globo, parte da Casa Grande aliada à Casa Branca, diz que é por conta de seus vínculos com Sérgio Cabral, ex-governador do Rio, também preso pela Lava Jato. Mas todos sabemos que, o que diz a Globo, normalmente não é o que parece.

Já no Paraná, a mesma Lava Jato prende colaboradores diretos do governador tucano Beto Richa, acusados de formação de quadrilha, a Máfia do Pedágio.

– É para justificar a prisão de Lula! – bradarão muitos, não sem um pedaço de razão. Mas, aí sim, seria simplificar demais o fenômeno.

O Golpe da Casa Branca, que já havia vitimado, de saída, nossa indústria da construção civil e, depois, grandes frigoríficos, parece pouco satisfeito com seus sucessos. A aliança entre o capital estrangeiro, os bancos, o latifúndio e empresários da grande mídia, ao lançar mão dos três poderes de nossa combalida República, procura implementar a toque de caixa uma agenda ultraliberal, cujo resultado já conhecemos lá dos anos FHC: quebra das empresas de pequeno e médio porte, desindustrialização, retração do mercado consumidor, recessão e desemprego. Tudo isso somado a caos institucional e fragilização da unidade nacional.

Se o recado da intervenção no Rio é claro para o povo e seus representantes políticos, os partidos e militantes do campo popular e democrático, a mensagem da Aliança Golpista é uma só: aos brasileiros cabe a velha sina, sancionada deste o pacto colonial, que é a de produzir matérias-primas (cujo nome chique hoje é "commodities") para que , com elas, as potências ricas produzam valor e tenham lucros. Na divisão mundial da produção de riqueza, ao Brasil cabe trabalhar e pagar juros; à Banca internacional, sediada nos EUA e na Europa, cabe extrair mais valia e receber os dividendos.

É a mais que anciã lógica do medievo, que nossa elite masoquista parece amar: servidão e vassalagem, aqui; riqueza e suserania, lá.

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