Bate cabeça institucional

As intrigantes revelações a propósito do comportamento supostamente inadequado do procurador Marcelo Müller, que teria trabalhado simultaneamente dos dois lados do balcão no acordo de delação premiada dos irmãos Batista, da JBS, não apenas têm consequências corrosivas para Operação Lava Jato.

Segundo o noticiário, o caso respingaria em alguém do próprio STF.

Assim, mais do que possivelmente provocar uma revisão do acordo de delação, o que se vê é o agravamento daquela que talvez seja a componente mais grave da crise multifacetada em que o país está mergulhado: a sua face institucional.

Isto porque em alguma dimensão, sobretudo se em médio prazo se se alterar a correlação de forças na esfera política, o Brasil se não superará plenamente pelo menos poderá amainar a dimensão da crise econômica.

Mas o estado de esgarçamento dos três poderes da República — o Executivo, o Legislativo e o Judiciário — tem certamente superação muito mais complexa e demandará mudanças institucionais muito pouco prováveis no horizonte mediato.

O ministro do Supremo Tribunal Federal, Luiz Fux, declarou ontem — irritado pela cobrança de transparência na remuneração dos magistrados — que a solução para crise atual reside primordialmente no Poder Judiciário.

Nada mais falso e movediço. Depositar no Judiciário as expectativas de solução para problemas essencialmente políticos significa inverter papéis e, por consequência, em ultima instância menosprezar o voto do cidadão.

O ambiente de plena instabilidade e imprevisibilidade que hoje reina no país recomenda saída política, jamais ditames advindos da área jurídica.

Mais ainda quando o Ministério Público Federal, a Procuradoria Geral da República, o STF e o TSE dão azo a manchetes e reportagens cuja marca é a intriga. Um bate cabeça típico das democracias mais atrasadas.

Nesse contexto, é fundamental que de fato ocorram eleições gerais em outubro do ano que vem — que aqui e acolá são postas em dúvida.

O próximo pleito, qualquer que seja o ambiente social e político no qual se realize, será a oportunidade de pronunciamento da sociedade, através do voto, acerca dos rumos do país.

Por isso, concomitantemente com a multiplicidade de fatos negativos relacionados direta ou indiretamente com a Operação Lava Jato, as forças políticas em presença devem cumprir o seu papel e contribuírem para que reine um clima democrático no próximo embate eleitoral. A começar de uma definição acerca das regras do jogo, findando a agonia da mini reforma política hoje em discussão na Câmara e no Senado.

E, além disso, darem consistência ao debate acerca da real superação da crise.

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