Ou a democracia ou o cassetete

Durante a greve geral do último 28 de abril, duas imagens viralizaram nas redes sociais, a mostrar, emblematicamente, duas faces do Brasil de hoje, dois caminhos que se colocam para nós.

A primeira imagem é da irmã Josélia, das Reparadoras do Sagrado Coração de Jesus. A foto de Welligta Frota mostra a religiosa segurando uma bandeira da Frente Brasil Popular pelas ruas de Sobral, no Ceará, durante caminhada que reuniu alguns milhares de trabalhadores das mais variadas categorias.

A foto é emblemática porque mostra a amplitude da greve geral. Às dezenas de categorias de trabalhadores juntaram-se estudantes, religiosos de vários credos, e todos os que sabem que as reformas apresentadas pelo governo golpista e ilegítimo são trágicas para o povo brasileiro.

A presença da igreja católica na convocação, na mobilização e na participação do movimento grevista foi uma demonstração que amplos setores da sociedade sentiram o golpe e começam a ter clareza que é necessário resistir. A irmã Josélia com a bandeira da Frente Brasil Popular foi a imagem, certamente, que sintetizou a amplitude e a unidade do dia 28 de abril.

A outra face do Brasil emergiu com força a aproximadamente dois mil e duzentos quilômetros de Sobral, em Goiânia, Goiás. Uma sequência de imagens mostra o exato momento em que o capitão Augusto Sampaio, da polícia militar goiana, desfere um golpe com tal violência no rosto do jovem Mateus Ferreira que o seu cassetete quebra.

Ali, a face truculenta, espumando de ódio, de uma polícia cuja violência virou regra e não mais a exceção. Ali, a completa desumanização do homem. A mão que colocou tal brutalidade naquele golpe não é mais humana, aquele não é ato humano. Aquela é a mão de uma besta, obedecendo cegamente aos seus mais brutais instintos. Uma fera teria mais complacência.

A agressão a Mateus atingiu em cheio a democracia brasileira, mais uma vez. O que se seguiu após ela foi, certamente, muito pior. Do esgoto pútrido do ódio que escorre pelas redes sociais brotou imediatamente uma multidão de seres da pior espécie, vociferando “opiniões” que vão desde o apoio incondicional ao capitão Sampaio até a “reinvindicação” por “cassetetes que não quebrem”. A bestialidade do apoio foi bem além da bestialidade do ato. Mais uma vez, não foram humanos os que emergiram daquele esgoto, mas seres apodrecidos de ódio, ignorância e intolerância.

A sequência de fotos de Goiânia é emblemática de um outro Brasil, o do fascismo alimentado diariamente por parte significativa das elites brasileiras e pela mão amiga da chamada grande mídia.

Vivemos em sociedades politicamente democráticas mas socialmente fascistas, afirmou no ano passado Boaventura de Sousa Santos. O Brasil do golpe vive o fascismo político e social, havendo hoje pouco espaço para a democracia.

É nesse espaço democrático significativamente reduzido que precisamos atuar. As duas emblemáticas imagens de que tratei aqui simbolizam a encruzilhada em que nos encontramos nesse momento. Há dois caminhos em disputa, dois caminhos por onde o país pode trilhar nos próximos tempos. Ou o caminho da unidade na luta representado na foto da irmã Josélia, ou caminho do fascismo representado pelo instante em que Mateus encontra a brutalidade inumana do capitão Sampaio.

Ou a democracia ou o cassetete. Esta é a encruzilhada em que nos encontramos.

As opiniões expostas neste artigo não refletem necessariamente a opinião do Portal Vermelho
Autor