Odeio o muro de Berlin

No Brasil, as gerações do auge da “guerra fria”, cresceram ouvindo o refrão “odeio o muro de Berlin”, popularizado na música de Robert Livi – um argentino então radicado no Brasil – que em 1968 ganhou muito dinheiro com o sucesso desse hit de apologia a “liberdade de ir vir”, na época mote da propaganda dos Estados Unidos da América contra a União Soviética, injustamente acusada de ter construído o muro de Berlin.

Não deixa de ser irônico, portanto, que a primeira medida de Trump tenha sido exatamente anunciar a construção de mais um muro contra a “liberdade de ir vir”, dessa feita contra o povo mexicano e os demais latinos que se lançam na aventura de adentrar no território americano. Território, aliás, que pertencia ao México e foi usurpado pelos Estados Unidos, como de resto eles têm feito mundo afora.

Mas, justiça seja feita, ninguém pode acusar Trump de ser incoerente. Ele é absolutamente coerente. Por enquanto está fazendo tudo que anunciou na campanha e que muitos levavam como troça, talvez baseados na experiência histórica de campanhas, onde o candidato anuncia um plano para ganhar as eleições e outro para governar.

A prática, todavia, tem demonstrado que nem sempre essa manobra colhe bons resultados. No caso do Brasil há vários exemplos de perda absurda de popularidade de alguns governantes que tentaram, sem sucesso, esse expediente.

Mas voltemos aos Muros de Trump.

No auge da guerra fria os EUA utilizaram a imprensa chapa branca para difamar e, não raro, atribuir a seus adversários os “pecados” que eles, EUA, haviam cometidos. Entre esses exemplos está a versão amplamente divulgada por eles de que o muro de Berlin havia sido construído por Stalin, que havia morrido em 1953, oito anos antes do início da construção do muro da vergonha alemã. Que importa isso hoje? Nada, mas serve para alertar do que eles são capazes.

Quem defende a liberdade e o socialismo não constrói muros. Constrói escolas, ferrovias, hospitais, fábricas, tratores, navios e prosperidade econômica.

Os estados unidos, esse sim, tem tradição de construir muros. Onde eles estão presentes há muros físicos ou ideológicos separando os povos, instigando o ódio, a intolerância e a prepotência, como os exemplos demonstram.

Os 155 km do muro de Berlin, construído a partir de 13 de agosto de 1961, dividiu Berlim em Oriental (sob influência soviética) e Ocidental (sob influência dos EUA). É pouco provável que essa iniciativa tenha partido da então URSS, que a época gozava de enorme prestigio e, portanto, tinha todo interesse no livre trânsito entre as áreas, convicta de que era polo de atração e não de repulsão.

O muro da vergonha Coreana, de 240 km, já tem 40 anos (1977-2017). Foi construído pela Coreia do Sul, controlada pelos Estados Unidos, para impedir a reunificação do país, como era o desejo daquele povo expresso na Declaração Conjunta de 1972.

A arrogância imperialista e a proteção dos Estados Unidos estimulou Israel a construir um muro que hoje já tem mais de 760 km de extensão. O muro divide Israel dos territórios palestinos ocupados e tem claro objetivo anexionista, embora o pretexto oficial seja o de impedir a entrada de terroristas no país. Mesmo condenado pela ONU o muro continua afrontando a paz e agredindo a liberdade.

A intolerância religiosa também está presente nesse espetáculo dantesco e vergonhoso. Belfast, capital da Irlanda do Norte, constrói muros desde 1960 para segregar a maioria católica (que reivindica a libertação do país das garras do Reino Unido) das minorias protestantes, que dão sustentação ao império Britânico/Americano.

Assim, o anúncio da construção de mais um muro da vergonha por parte dos Estados Unidos não deveria causar surpresa alguma. Essa tem sido a lógica deles ao longo dos tempos. O novo muro da vergonha e da intolerância de Trump se soma aos que eles construíram ou financiaram em várias partes do mundo.

E para ser rigoroso com a história é preciso registrar que essa estupidez de Trump não é original. É uma cópia da estupidez de outro republicano, o então presidente George W. Bush que, em 2006, construiu muros na fronteira de Tijuana (México) com San Diego (Estados Unidos), bem como no Arizona, Texas e Novo México para impedir a entrada de estrangeiros ilegais em solo americano.

Nenhum muro detém um povo, nenhum povo precisa de muros. Precisa, apenas e tão somente, de liberdade e condições dignas de vida. Enquanto a voracidade e a truculência dos países imperialistas, como os Estados Unidos, não permitirem que os demais países possam assegurar essas condições básicas a seus naturais, Trump pode construir até cerca eletrificada, que sempre haverá alguém desesperado arriscando a própria vida para ter o simples direito de continuar vivendo.

E isso é de fato deplorável.

As opiniões expostas neste artigo não refletem necessariamente a opinião do Portal Vermelho
Autor