Reforma Política na agenda regressiva

Em meio ao verdadeiro "tiroteio" movido por Michel Temer e seu grupo no desmonte de conquistas sociais e de direitos alcançados nos últimos 12 anos, o encontro entre o presidente interino e o senador Aécio Neves, ontem, poderia até passar como sem muita importância.

Aécio já não se mostra ousado e arrogante como na fase que antecedeu a votação do impeachment pela Câmara dos Deputados. Atordoado por sucessivas revelações, em delações premiadas, de seu envolvimento em atos de corrupção, já não busca as câmeras de TV como antes.

Mas cumpre o seu papel como partícipe ativo do desmonte neoliberal.

Com Temer, segundo o noticiário, tratou exatamente de uma nova reforma política — agora centrada em dois itens de evidente caráter restritivo: cláusula de barreira e proibição de coligações proporcionais.

Há mais de duas décadas o tema é recidivo no Congresso. Sempre traduzindo a intenção de reduzir a representação parlamentar aos poucos grandes partidos nos quais têm lugar privilegiado representantes da elite dominante.

Apenas o PT seria tolerado.

Correntes políticas hoje minoritárias seriam afastadas da lide parlamentar.

Pelo artifício, se criaria uma série de dificuldades para que partidos como o PCdoB, o PV e outros pudessem validar o mandato de seus representantes eleitos.

O que Aécio quer, e Temer se comprometeu a trabalhar por isso, é a adoção de uma cláusula de barreira (também chamada de cláusula de desempenho) dificilmente atingível pelos atuais pequenos e médios partidos.

A interdição das coligações proporcionais viria com o mesmo propósito.

No cenário atual de pulverização da representação parlamentar via a multiplicidade de legendas, os argumentos em favor da monopolização do parlamento pelos grandes partidos conservadores pode vir a ganhar guarida em parcelas da opinião pública estimuladas pelo complexo mediático.

Por outro lado, a despeito da situação francamente adversa, cabe retomar a proposta formulada pelo movimento em favor da reforma política democrática, encabeçado pela OAB e pela CNBB e integrado por mais de cem entidades populares e democráticas e organizações da sociedade civil.

Para combater a fragmentação do espectro partidário, a adoção do sistema de votação em listas preordenadas pelos partidos, que colocaria em primeiro plano, aos olhos do eleitor, propostas programáticas e não indivíduos, como hoje ocorre.

E em complemento à extinção da contribuição empresarial, o financiamento público de campanhas.

Mas certamente não será jamais essa a direção da maioria parlamentar conservadora atual.
O fato é que o diálogo entre Aécio e Temer se insere na agenda regressiva neoliberal ora em andamento.

Mais um sinal de alerta aos que imaginam um roteiro simplista para os possíveis desdobramentos da eventual confirmação do impeachment da presidenta Dilma no Senado. Pois não é razoável imaginar que na hipótese de dois anos e meio de governo, pelo acirramento das contradições sociais e desgaste político de Temer e aliados, o caminho para uma nova vitória do povo nas próximas eleições presidenciais estaria pavimentado.

Pelo evolver dos fatos, a agenda regressiva não apenas pretende a consolidação da hegemonia do sistema financeiro sobre a economia e a vida social e política em geral, como tenta avançar em reformas estruturais de caráter reacionário com a rapidez e a eficiência que nossas forças não tiveram em relação às mesmas reformas estruturais com conteúdo democrático.

Assim, põe-se evidente a absoluta necessidade de se construir uma nova plataforma de luta para a qual possam convergir os atuais partidos de oposição, o amplo leque de correntes políticas e personalidades participes da resistência ao impeachment e os movimentos sociais.

Uma tarefa ingente a ser encarada concomitantemente com a peleja eleitoral de outubro.

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