Memórias da saga comunista (XI)

A bancada federal do PCdoB – seja na Câmara, seja no Senado – vem se destacando pela lucidez e coragem na defesa da institucionalidade democrática comprometida pelo golpe cometido contra o mandato da presidente Dilma Rousseff.

Na Câmara, particularmente no processo do “impeachment”, destacou-se a figura da deputada carioca Jandira Feghali. Destaque, aliás, que a projetou como uma das principais lideranças da esquerda brasileira.

No Senado, a ação de Vanessa Graziottin (PCdoB/MA) tem sido categórica, de grande descortino tático, somando-se ao grupo de senadores que hoje enfrentam na casa o processo do golpe.

A rigor, as bancadas comunistas eleitas nos últimos 30 anos de legalidade do PCdoB, tem se caracterizado justamente pela dedicação, coragem e lucidez no exercício do mandato. No livro “Vida veredas: paixão”, que produzi em 2012 para a Fundação Maurício Grabois, há um registro da histórica (pequena, porém brava) bancada na Assembleia Nacional Constituinte, que trabalhou arduamente sob o comando de João Amazonas. É este registro que se lerá a seguir.

Na arena da assembleia constituinte

Até hoje o alagoano Eduardo Bomfim recorda – como “um período extraordinário, um mestrado, um doutorado em política” – aqueles 20 meses em que uma pequena tropa de apenas cinco parlamentares comunistas navegou no oceano de quase 500 deputados e 72 senadores que compunham a Assembleia Nacional Constituinte. Águas revoltas aquelas, em que 70% dos congressistas estavam comprometidos com as teses da direita e da centro-direita, reunidos no chamado “centrão”.

Para enfrentar tal desproporção de forças, o PCdoB trabalhou duro. Já no processo eleitoral de 1986, que indicaria os membros da futura Constituinte, elaborou e difundiu, para debate com a sociedade, um conjunto de teses, em 16 temas centrais, reunidas no livreto Constituinte – Propostas do PCdoB. Instalada a assembleia, em 1o de fevereiro de 1987, os parlamentares comunistas mergulharam numa ardorosa faina diuturna que se prolongaria até as vésperas da promulgação da nova constituição, no início de setembro de 1987.

Aos 75 anos, mas infatigável, João Amazonas, constituinte em 1946, comandou pessoalmente a bancada do partido. Praticamente mudou-se para Brasília, ocupando um quarto no apartamento de Solange e Haroldo Lima. O Velho (como alguns o chamavam, carinhosamente) percebia que o partido, mesmo não tendo força, possuía um papel e devia lutar por ele. E assim trabalhavam, sob sua batuta, os deputados Haroldo Lima (BA), como líder, Aldo Arantes (GO), como vice-líder, Eduardo Bonfim (AL), Edmilson Valentin (RJ) e Lídice da Mata (BA).

– A bancada reunia-se lá em casa, varando madrugadas na elaboração das emendas – lembra-se Haroldo Lima. E acrescenta: – Todos em torno da grande mesa da sala, Amazonas na cabeceira, examinando com cirúrgico rigor cada artigo, cada frase, cada palavra.

No plenário, salas e corredores do Congresso – a arena da Constituinte – a lida não era menos árdua. Por ali circulavam, diariamente, cerca de dez mil pessoas. Em torno de 380 grupos das mais variadas procedências e opiniões políticas pressionavam a assembleia.

– Entrávamos lá pela manhã, almoçávamos e jantávamos lá, varávamos a noite e quantas vezes saíamos ao raiar do dia seguinte – recorda Eduardo Bomfim.

Em outro front, os deputados do partido se revezavam acompanhando Amazonas em suas incessantes interlocuções com lideranças de outras forças políticas em torno de propostas e rumos da Constituinte. Para enfrentar o “centrão” (PFL, PDS, PTB e setores do PMDB), os partidos de esquerda e centro-esquerda (PCdoB, PT, PDT, PSB e PCB) reuniram-se num bloco para atuação conjunta.

Do árduo e persistente trabalho dos constituintes do PCdoB resultou o alentado conjunto de 1.003 emendas, 204 das quais incorporadas no texto constitucional.

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