Vinte e Sete dias de Golpe: discurso e prática de Temer

Como Temer é chegado a citações latinas vou lembrar-lhe que “res non verba”, ou seja, o que conta são fatos, não palavras. E até o presente os golpistas falam exatamente o que não fazem.

Tal fato não se constitui exatamente numa surpresa. Afinal, não há um único gesto em Temer que seja espontâneo. Tudo nele é artificial e dissimulado, exatamente para tentar mascarar os três principais objetivos do golpe: retomar a política de privatizações; interromper os programas sociais e parar as operações de combate à corrupção.

A retomada da política de privatizações da era FHC/PSDB tem como objetivo entregar aos empresários, preferencialmente estrangeiros, o restante do patrimônio público que FHC não conseguiu privatizar. Dentre os alvos preferenciais estão a Petrobras, as reservas do pré-sal, o setor elétrico e os bancos públicos (Banco do Brasil, Caixa Econômica, BNDES), dentre outros setores estratégicos. A campanha sistemática contra a Petrobras tem exatamente o objetivo de desacredita-la para tentar privatiza-la.

Já na campanha de Aécio Neves (PSDB) ele criticava as despesas de custeio, ou seja, os recursos que garantem os programas e políticas públicas que melhoraram a vida de milhões de brasileiros (as). Dentre esses programas e políticas está a valorização real do salário mínimo; luz pra todos; criação de centenas de escolas técnicas e universidade; programas de bolsas universitárias para facilitar o acesso da juventude a Universidade; construção de moradias populares e o “bolsa família”, que assegurou um mínimo de dignidade às pessoas mais simples. Eles consideram tais despesas gastos supérfluos. Eliminá-los sinaliza aos banqueiros que eles receberão seus polpudos juros sem risco. A tática? Simples. Desacreditar os projetos através de uma campanha midiática em que eventuais problemas pontuais se transformam em regra para justificar a extinção dessas políticas. E aí eles dirão: “não acabamos, estamos apenas corrigindo os erros do governo irresponsável” e outras barbaridades que diariamente repetem.

Mas, na lógica deles, o ponto de partida é parar as operações de combate à corrupção, como ficou demonstrado nas gravações em que os então ministros Romero Jucá e Fabiano Silveira detalharam as medidas a que recorreriam para “estancar a sangria da lava jato” e livrar a cúpula do PMDB e do PSDB das garras da justiça. A diretiva foi clara e gravada em bom áudio pelo delator Sergio Machado: afastar Dilma, aprovar o impeachment, ou seja, executar golpe!

Assim o “governo” golpista vai se arrastando entre a intenção e a prática. Perde um ministro por semana e sua “tropa de choque” – e mesmo aderentes de ocasião – já não conseguem mais andar nas ruas. Suas contradições só se avolumam.

Temer se autoproclama constitucionalista. Como tal deveria saber que seu papel de vice lhe impõe, além da lealdade de caráter, fidelidade legal à presidenta Dilma Rousseff como titular da chapa. Tramou um golpe, usando inclusive informações reservadas que a natureza de seu cargo lhe permitia obter e as levou para os demais conspiradores.

Imprensa emudeceu

Não há surpresa na sua linha editorial. A imprensa é e sempre será apenas um instrumento do aparelho de estado da classe dominante, embora tantos nutram ilusão quanto à sua "independência". Naturalmente se esperava ao menos alguma cerimônia para não ficar tão evidente seu papel golpista. Mas, apesar dessa parcialidade, ninguém mais tem dúvidas quanto ao caráter e objetivo do golpe.

A tática é conhecida. Tem inspiração em Joseph Goebbels, chefe da propaganda nazista de Hitler, para quem "uma mentira repetida mil vezes vira verdade".

De um lado a imprensa tem complacência absoluta com os atos de Michel Temer e seus “lava jato”, que gozam do silêncio obsequioso em relação às barbaridades cometidas por eles, que, aliás, não foram poucas em tão curto espaço de tempo. No outro extremo, metodicamente, a satanização do governo legítimo de Dilma Rousseff e de seus programas sociais, que eles chamam de "coisa de comuna".

Se há 12 ministros de Temer na lava jato; se não há nenhuma mulher ministra; se a cultura foi descartada como um objeto imprestável e se a composição dos ministérios alcançou o ápice do fisiologismo e da decadência acadêmica, pouco importa, o que interessa é o resultado, se justificam os editorialistas, até ontem ferozes críticos do que chamavam de "loteamento de cargos".

Por essa lógica, para executarem o projeto de mais arrocho, privatizações e supressão dos atuais programas sociais, é preciso desmoralizar o governo de Dilma e os próprios programas, sem o que o risco de uma convulsão social será inevitável, quando as consequências criminosas dessa política neoliberal começar a serem sentidas pelo povo mais simples, os grandes beneficiados desses programas.

Eis porque Temer anuncia que planeja “denunciar” rombo deixado por Dilma; já entregou à sanha de privatistas bancos públicos e empresas estratégicas, como a Petrobras; anuncia auditoria em programas como bolsa família, minha casa minha vida; e, obviamente, acelera a cruzada contra os aposentados, a grande fixação histórica deles.

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