Ponte para o passado: Análise de um eventual governo Temer

Há grandes interesses em jogo por trás das tentativas de desestabilização do país, através de um processo de impeachment onde não há prova da existência de crime de responsabilidade, nos termos da Constituição Federal. Compreender o posicionamento da FIESP e das corporações econômicas a favor da derrubada da chefe de Estado, porém não é difícil.

Em outubro de 2015, o PMDB do Vice-presidente Michel temer, lançou documento denominado “Uma ponte para o futuro”, com supostas propostas para o país superar os reflexos da crise econômica internacional. O problema é que as idéias, ali contidas, apontam para um regresso neoliberal de triste memória, que prevê desnacionalização da economia, ameaça a direitos sociais e um esforço exagerado de alcançar ajuste fiscal a qualquer custo, visando preservar os interesses do sistema financeiro, mesmo que isso signifique colocar em risco políticas públicas fundamentais.

Na página 18, o PMDB expressa seu desejo de executar uma política centrada na iniciativa privada, por meio de transferências de ativos que se fizerem necessários. Ou seja, recoloca a privatização do patrimônio público, largamente utilizada nos anos 90, que levou ao desmonte do Estado Nacional brasileiro, com uma fé cega de que o mercado, por si só, irá superar as dificuldades. Essa ilusão não leva em conta que, durante o governo FHC, o país mergulhou em forte recessão e que parte de nossas estatais foram vendidas a "preço de banana", diminuindo a capacidade do Estado induzir atividade econômica voltada para retomada do crescimento, provocando enorme desemprego, muito superior ao atual patamar.

O documento menciona, na página 14, o retorno ao regime anterior de concessões na área do petróleo. O regime de partilha do pré-sal representou um avanço importante em face de que, diferente do modelo anterior de concessões, grande parte dos recursos auferidos ficam sob a responsabilidade do Estado. Trata-se de um modelo mais adequado ao interesse nacional em razão do menor risco ofertado às empresas que irão explorar. Até porque, foi com tecnologia nacional, desenvolvida pela Petrobrás, que se descobriu a fabulosa riqueza na camada pré-sal. Não seria justo com o país, depois de todo esse esforço, entregar nossas reservas sob um formato mais vantajoso ao mercado, para atender a interesses de grandes petrolíferas do mundo que estão de olho nesta commoditie de caráter estratégico.

A Petrobrás sofre as conseqüências de queda brutal do preço internacional do barril, decorrente da desaceleração da economia mundial, da ampliação de oferta decorrente da extração da bacia do xisto norte-americano e de uma decisão geopolítica da Arábia Saudita, em conluio com os EUA, para ampliar a produção, visando segurar em patamar reduzido o valor do petróleo, atingindo em cheio nações adversárias do imperialismo como Rússia, Irã, Venezuela e por tabela, o Brasil.

No texto do PMDB, na política exterior, há uma clara defesa da reaproximação do Brasil com EUA e Europa. Bom ressaltar que o Brasil, na última década, ampliou seu comércio internacional com quase todas as regiões. A diferença é que o país promoveu uma inserção menos submissa às grandes potências, abrindo novos mercados, consolidando o BRICS, fortalecendo a integração latino-americana.

Emblemático que o PMDB sequer mencione, em seu texto, a força do Brics para criação de uma estratégia global que possa ser alternativa para nações em desenvolvimento. A Alca (Área de Livre Comércio das Américas), parece ser ressuscitada como alternativa, o que representará a detonação da já combalida indústria brasileira; e uma anexação do Brasil aos interesses negociais dos EUA.

O conteúdo neoliberal se expressa com mais agressividade na afirmação de que o “Brasil gasta muito com políticas públicas”, contida na página 19. O PMDB chega a defender que “precisamos de novo regime orçamentário, com o fim de todas as vinculações” (p.9), eliminando portanto as obrigações constitucionais de União, Estados e Municípios, investir os percentuais previstos em educação e saúde. Querem nos fazer crer que a Constituição não cabe em nosso PIB, como já foi afirmado em momentos anteriores.

Há uma clara inversão de prioridades. Se quisermos resolver a relação dívida/PIB devemos enfrentar a raiz de nosso endividamento, localizado substancialmente na sangria financeira que sofremos em razão de taxa SELIC alta que retira dos cofres públicos volume significativo de recursos para aplacar a gana desenfreada de bancos detentores de títulos oficiais, sob o pseudo discurso de combate à inflação.

Coerente com seu posicionamento aniquilador de políticas sociais, o PMDB defende idade mínima para aposentadoria, sugerindo até mesmo sua elevação de 65 para 67 (p.11), penalizando exatamente os mais pobres que começam a trabalhar mais cedo em geral. Isso pode inviabilizar a aposentadoria por tempo de contribuição.

A política de valorização do salário mínimo, uma das principais responsáveis pela elevação da renda no país nos últimos 13 anos pode estar com seus dias contados. Atualmente, fruto de negociação das Centrais sindicais com o governo Lula e posteriormente com Dilma, o salário mínimo é reajustado pela inflação mais a metade do crescimento do PIB de 2 anos anteriores. Na proposta do PMDB (p.10) o novo orçamento deve aprovar “o fim de todas as indexações, seja para salários, benefícios previdenciários e tudo mais” (p.10), inviabilizando a retomada do poder de compra dos trabalhadores.

Na área trabalhista, PMDB pretende “permitir que as convenções coletivas prevaleçam sobre as normas legais” (p.19) retomando a tese de flexibilização da CLT. Caso isto se concretize, a tendência é de uma brutal perda de direitos, pois na prática, não há uma igualdade na relação empregados e empregadores que viabilize acordos equânimes, daí a necessidade de ter uma lei que estipule o patamar mínimo na relação capital/trabalho. Em categorias mais frágeis, por exemplo, seria muito mais fácil o patrão impor condições mais desfavoráveis ao trabalhador, sob a ameaça da perda do emprego, especialmente em tempos de crise.

O DIAP (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar) lista 55 projetos de lei que tramitam no Congresso Nacional ameaçadores de direitos trabalhistas e à soberania nacional. A quase totalidade desses projetos conta com respaldo dos mesmos parlamentares que defendem o impeachment, dentre os quais, o que permite a terceirização de todas as atividades de uma empresa (PLC 30). Não é coincidência!

Está em curso no país um capítulo decisivo da luta de classes, que divide a nação entre os interesses do grande capital e dos trabalhadores, ainda que alguns “desavisados” cumpram o papel de inocentes úteis ajudando a Rede Globo e seus patrocinadores terem êxito em seus intentos golpistas para nos retirar direitos. Fortalecer a unidade popular e defender a democracia é fundamental para impedir o retrocesso.

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