As quatro notas falsas da ladainha de Alon F. sobre o Estado sionista

O arsenal de embustes do sionismo parece não ter limites, embora seu repertório seja extremamente limitado, surrados e repetitivos que são os argumentos dos seus porta-vozes. A usina de mentiras que difunde conteúdos usando o mesmo método do nazista Goebbels acaba de produzir mais uma peça de propaganda em que pretensamente o autor refuta as “quatro premissas erradas sobre Israel”, frase de efeito que dá título ao artigo publicado na Folha de S.Paulo, assinado pelo jornalista Alon Feuerwerker.

São na verdade quatro notas falsas, rematados embustes, a começar pela negativa de que o Estado sionista israelense seja um enclave imperialista, um empreendimento colonial. Invoca como “prova” a oposição do Império Britânico, em 1939, “à partilha da Palestina e à criação do estado judeu”. E usa como muleta o argumento de que “a União Soviética de Josef Stálin votou na ONU em 1947 a favor da criação do Estado judeu”. A referência à União Soviética é reveladora da incoerência intrínseca ao texto, porquanto em outra passagem comemora que os judeus sionistas, “com uma dose de ventura” acabaram “empurrados para uma aliança com os Estados Unidos contra a União Soviética”.

O jornalista dá ao longo do seu texto lições de estratégia e tática, pragmatismo político e política de alianças, mas descontextualiza a posição tanto do Império Britânico como da União Soviética no que respeita à criação do Estado de Israel, que – ele terá suas razões – insiste em designar como “judeu”, acentuando a antinomia com repúblicas ou monarquias “islâmicas”. Ora, desde Richelieu há uma “raison d´Etat” acima das motivações religiosas, étnicas e culturais na construção de instituições políticas. Posteriormente à Guerra dos 30 Anos (1618-1648) – conjunto de conflitos religiosos que dilaceraram a Europa no século 17 – a chamada Paz de Westfália consagrou o princípio dos Estados nacionais e da autodeterminação, tornando-se a primeira “ordem” internacional baseada no primado da política sobre a religião, a etnia e a cultura.

O autor escamoteia que bem antes de 1947 e mesmo de 1939, que cita como datas marcantes do posicionamento do Império Britânico e da União Soviética, respectivamente, as potências imperialistas vitoriosas na Primeira Guerra Mundial negociaram a partilha do Oriente Médio sobre os escombros do Império Otomano. O acordo Sykes-Picot, que completa um século precisamente em maio deste ano, firmado a partir de negociações secretas entre as chancelarias da França (François Georges-Picot) e do Império Britânico (Mark Sykes), estabeleceu que os territórios árabes que faziam parte do Império Otomano ficavam sob protetorado dessas duas potências.

Um ano e meio depois, o Império Britânico, em 2 de novembro de 1917, emitiu um documento, conhecido como Declaração Balfour, em que manifesta a intenção de facilitar o estabelecimento do “lar nacional judeu” na Palestina, depois de muitas idas e vindas na concertação de acordos com o movimento sionista mundial, que por sinal não tinha no território da Palestina a única opção de instalação do “Estado judeu”. Teodore Herzl, pai do sionismo moderno, cogitava sua implantação no Chipre ou na faixa de El Arish na extremidade da Península do Sinai, perto da Palestina, conforme David Fromkin, em “Paz e Guerra no Oriente Médio” (Ed.Contraponto, Rio de Janeiro, 2008, página 298). Fromkin narra ainda na mesma obra que Joseph Chamberlain, secretário colonial do Império Britânico sob os governos dos primeiros-ministros Salisbury e Balfour, chegou a propor que o “Estado judeu” fosse instalado em Uganda, na África Oriental britânica, obtendo o assentimento de Herzl, o que demonstra o artificialismo do empreendimento sionista e ao mesmo tempo o empenho do Império Britânico em favor da causa.

Quanto à posição da União Soviética, não se pode desligá-la do contexto do pós-Segunda Guerra Mundial. A potência socialista, vitoriosa no conflito, apoiou a criação de dois Estados, o israelense e o palestino.

Mas não há como negar que o Plano de Partilha (a resolução 181 de 27 de novembro de 1947), que implicou a expulsão de cerca de 800 mil palestinos, era controverso e foi injusto. Estabelecia a entrega à minoria colonialista judaica, proveniente em sua esmagadora maioria de países centro-europeus, de mais da metade da Palestina e as terras mais férteis. Como se não bastasse, o Estado sionista, desde então expandiu incessantemente o seu território, ocupando hoje 82% da Palestina original. E o fez mediante guerras, a expulsão sistemática dos palestinos das suas terras, operações de cerco e aniquilamento e um novo tipo de apartheid, com o muro de separação entre Jerusalém e a Cisjordânia, onde cresce o número de colônias declaradas ilegais pela própria ONU.

O primordial e essencial embuste do artigo é negar que a região do Oriente Médio e especialmente a Palestina tornou-se cenário da implantação de um movimento nacionalista e colonialista de origem europeia, que se concretizou pela imposição do Estado sionista e suas políticas agressivas e expansionistas. Desde sua criação até os dias de hoje, esse Estado, que se comporta como pária no concerto internacional, expande-se por meio da guerra, da repressão e da ocupação, martirizando a população palestina, mediante a limpeza étnica. Um genocídio.

A propaganda sionista a que o jornal paulistano e o autor do artigo servem com zelo, nega o caráter colonialista e imperialista do empreendimento sionista porque se trata de uma história incômoda, de causar horripilantes sobressaltos. Afinal, como confessar crimes de lesa-humanidade e violações do direito internacional quando se pretende posar de campeões do humanismo e da democracia? Por óbvio, a aceitação da tese imperialista e colonialista conduz automaticamente a confessar esses crimes, para os quais no fundo sabem que não há remissão. A propósito, cito a reflexão do historiador israelense Ilan Pappe em sua obra “La limpieza étnica de Palestina”: “Aos israelenses é profundamente perturbador reconhecer os palestinos como vítimas de ações israelenses (já que) supõe enfrentar a injustiça histórica da qual se acusa Israel como autor da limpeza étnica da Palestina em 1948; este reconhecimento obriga a questionar os mitos fundadores do Estado de Israel. A aceitação de algo semelhante por parte dos judeus israelenses minaria, como é lógico, seu próprio status de vítimas. Isto é algo que teria implicações políticas em escala internacional; mas também repercussões morais e existenciais para a psique judia […] os judeus teriam que reconhecer que se converteram na imagem refletida no espelho do seu pior pesadelo”. (Ed. Crítica, Barcelona, 2008, páginas 321-322).

A segunda nota falsa da litania de Alon F. é a acusação de que se pretende “remover Israel do mapa”, recorrendo para isso ao velho método nazista, apropriado pelo aparato ideológico sionista de amaldiçoar seus adversários como antissemitas. Neste afã, para além de exibir seus preconceitos, explicita o alinhamento, ao analisar a geopolítica do Oriente Médio, com os países imperialistas e seus partidários na região. Para cúmulo, afirma que “Israel não se considera inimigo de seus vizinhos”, citando entre estes o Líbano, e minimiza um dos episódios mais ilustrativos da estratégia imperialista israelense – a ocupação e anexação das Colinas de Golã, da Síria. Israel ocupou o Líbano durante longos 18 anos, sendo expulso pela heroica Resistência, no ano 2000. Permanece, porém, ocupando as fazendas de Shebaa, no sul do país. E em 2006, entre julho e agosto, durante 30 tenebrosos dias, o Estado sionista realizou bombardeios sistemáticos sobre o Líbano, sendo mais uma vez derrotado pelas forças da Resistência. Naquela altura, Condoleeza Rice, secretária de Estado dos Estados Unidos, dizia que os bombardeios dos seus aliados israelenses sobre Beirute eram “as dores do parto do novo Oriente Médio”.

O autor tenta transformar o vício em virtude, apresentando como manobra de alinhamento tático a ligação umbilical do imperialismo estadunidense com o Estado israelense. Embuste que não é capaz de esconder que a segurança de Israel radica no indeclinável apoio diplomático, financeiro e militar do imperialismo estadunidense. Por isso, em retribuição, atua como cabeça de ponte dos interesses de Washington na conflituosa região do Oriente Médio.

O terceiro embuste relaciona-se com a inevitável analogia entre o racismo e o apartheid praticados por Israel e os que vigoravam na África do Sul quando esta era dominada pela minoria branca. Segundo o autor, “a segregação social da maioria negra assentava-se na segregação política”, enquanto que “em Israel os árabes israelenses não apenas votam mas são votados”. Não creio, sinceramente, que o articulista desconheça que o regime do apartheid sul-africano não era um fenômeno circunscrito apenas ao campo político. Aqui a má informação e a suposta ignorância são interessadas. Além da segregação política, Israel pratica o confinamento territorial, uma política opressiva em todos os domínios e, por doutrina e na prática, persegue o objetivo de extinguir a população palestina. Guardadas as peculiaridades, é nisto que consiste a analogia com a África do Sul da minoria branca.

Finalmente, a quarta nota falsa de Alon F. é a pretensa refutação do “boicote político e econômico para colocar Israel de joelhos e eventualmente riscá-lo do mapa”. Mais uma vez, a falsa acusação como método para intimidar os adversários. O boicote a Israel, que se manifesta por meio de várias campanhas mundo afora, é uma, apenas uma, das formas da resistência e da luta, uma expressão do clamor dos palestinos e das forças solidárias para que cesse o massacre.

O autor termina exercitando sua imaginação em busca de paradigmas fantasiosos para o que seria, a seu juízo, o caminho para a paz na Palestina, sempre invocando o argumento dos agressores – a prioridade para a “segurança” de Israel, que é concebida como a negação do direito à existência do povo palestino e à conquista do seu Estado livre, independente e soberano.

Pretendendo refutar o que considera “premissas erradas” do movimento de libertação nacional palestino e das forças solidárias, e até mesmo achando-se capaz de dar conselhos, o jornalista Allon F. seguiu à risca o figurino da propaganda sionista. O primeiro degrau da fidelidade é ser fiel a quem lhe é fiel. Esta parece ser também a máxima da entidade sionista no abastecimento do seu batalhão de escribas, com mitos e embustes que ganham o status de argumentos.

A solução do conflito palestino-israelense pressupõe o cumprimento das resoluções da ONU e a proclamação de jure e de facto do Estado Palestino, livre e soberano, tendo Jerusalém Oriental como capital, e com as fronteiras existentes em 4 de junho de 1967, fronteiras estas reconhecidas internacionalmente. Não haverá paz na Palestina, em Israel e em todo o Oriente Médio enquanto não se estabelecer plenamente um Estado palestino.

Isto requer ainda a retirada de todas as colônias israelenses nos Territórios Palestinos Ocupados e a derrubada do muro de separação. Igualmente é necessário e urgente libertar os prisioneiros políticos palestinos detidos em prisões israelenses e implementar uma solução justa ao problema dos refugiados, de acordo com a resolução 194 da ONU. É também necessária a retirada de Israel das Colinas de Golã, na Síria, e das Fazendas Shebaa no sul do Líbano. Estas são assertivas claras, lógicas, sensatas, conforme a justiça e o Direito Internacional. São premissas e conclusões corretas, em oposição aos embustes de Alon Feuerwerker e da “Folha de São Paulo”.

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