Profissional Amadorismo(II)

Em 3 de outubro de 1965 realizaram-se eleições diretas para governadores de onze estados. Não foi realizada a já marcada eleição direta para a presidência da República.

O mandato do “presidente” Castelo Branco foi prolongado até 15 de março de 1967. A esta altura, grande parte do “entusiasmo” pelo golpe de 1964 tinha diminuído, a classe média brasileira dos grandes centros urbanos estava em situação financeira difícil e iniciara-se o achatamento salarial, feito em 1964 e em 1965.

Apesar do veto a determinados candidatos por parte da chamada “linha dura das forças armadas”, a oposição triunfou em estados importantes como Guanabara e Minas Gerais, onde saíram vitoriosos dois políticos do PSD (Francisco Negrão de Lima e Israel Pinheiro da Silva, respectivamente). Ambos eram ligados ao ex-presidente cassado, Juscelino Kubitschek, o que preocupou o grupo que pregava a implantação de um regime político autoritário.

Sob a pressão desse grupo linha-dura ligada a Costa e Silva e, em virtude da derrota do governo militar nas eleições de 1965 na Guanabara e em Minas Gerais, o presidente Castelo Branco baixou o AI-2, em 27 de outubro de 1965, logo após as eleições de 3 de outubro de 1965. Constava, nesse Ato Institucional, a extinção do pluripartidarismo, com a extinção dos 13 partidos políticos existentes no Brasil.

Dizia o AI-2, no seu artigo 18: “Ficam extintos os atuais Partidos Políticos e cancelados os respectivos registros”, Parágrafo único – Para a organização dos novos Partidos são mantidas as exigências da Lei nº 4.740 (Lei Orgânica dos Partidos Políticos), de 15 de julho de 1965, e suas modificações”.

Em seguida ao AI-2, foi baixado o Ato complementar nº 4 de 20 de novembro de 1965, que dizia:

“O Presidente da República, no uso das atribuições que lhe são conferidas pelo art. 30 do Ato Institucional nº 2, resolve baixar o seguinte Ato Complementar: Art. 1º Aos membros efetivos do Congresso Nacional, em número não inferior a 120 deputados e 20 senadores, caberá a iniciativa de promover a criação, dentro do prazo de 45 dias, de organizações que terão, nos termos do presente Ato, atribuições de partidos políticos enquanto estes não se constituírem.”

Como a Câmara dos Deputados só dispunha de 350 deputados, matematicamente, só era possível formarem um máximo de 3 partidos políticos. O mesmo para o Senado Federal que tinha apenas 66 senadores.

O AI-2, o Código Eleitoral de 15 de julho de 1965, o Ato Complementar nº 4 de 20 de novembro de 1965, (alterado pelo Ato complementar nº 7, de 31 de janeiro de 1966, e pelo Ato Complementar nº 29, de 26 de dezembro de 1966), e a Lei Orgânica dos Partidos Políticos (lei nº 4.740 de 15 de julho de 1965, substituída, em 21 de julho de 1971, pela lei nº 5.682), e que dispunham sobre a organização dos partidos políticos, criaram grandes empecilhos para a formação de partidos políticos no Brasil.

Na prática, somente foi possível formalizar mais uma legenda além da legenda governista, a Arena (criada em 4 de abril de 1966), que apoiava a ditadura militar. Foi criado, então, o MDB que faria oposição ao regime e cujos membros eram chamados de “emedebistas”. Houve a tentativa por parte de Pedro Aleixo de tentar viabilizar uma terceira legenda, o PDR – Partido Democrático Republicano, mas foi em vão.

A “Lei Orgânica dos Partidos Políticos”, lei nº 5.682 de 1971, no seu artigo 7º, o qual vigorou até 1979, dizia: Só poderá pleitear sua organização, o Partido Político que conte, inicialmente, com 5% (cinco por cento) do eleitorado que haja votado na última eleição geral para a Câmara dos Deputados, distribuídos em 7 (sete) ou mais Estados, com o mínimo de 7% (sete por cento) em cada um deles.

A Arena elegeu todos os presidentes da república de Costa e Silva a João Figueiredo, sendo derrotada pela primeira vez, nas eleições indiretas para presidente, em 1985, por Tancredo Neves. Também conseguiu fazer a maioria das cadeiras na Câmara dos Deputados em todas as eleições que disputou: 1966, 1970, 1974 e 1978.

Elegeu, também, todos os Governadores de Estado em todo o período, com a exceção do Estado da Guanabara, em 1970, e, do Estado do Rio de Janeiro, em 1978, sendo que, em ambas as ocasiões, com a eleição indireta de Chagas Freitas pelo MDB. Os territórios (Rondônia, Amapá, Roraima e Fernando de Noronha) eram governados por militares, assim como, na maior parte do tempo, o Distrito Federal, e, muitos municípios considerados “área de segurança nacional”, tinham seus prefeitos nomeados, não eleitos.

A Arena também manteve, em todo o período militar, maioria no Congresso Nacional, graças a sua forte presença nos pequenos municípios, e por ter sido beneficiada diretamente por leis eleitorais, como a reforma política chamada de Pacote de Abril, de 1977, e outras leis, que aumentaram a representação dos pequenos estados no Congresso Nacional, garantindo a eles, um mínimo de 8 vagas na Câmara dos Deputados. O “Pacote de Abril” (termo cunhado pelo Arcebispo de Olinda e Recife D. Helder Câmara) criou o “senador biônico”, (através da Emenda Constitucional nº 8 de 14 de abril de 1977). O “senador biônico” seria eleito indiretamente.

Assim, em 1978, havendo duas vagas a serem disputadas em cada estado, um senador era eleito em eleições diretas e o segundo era eleito por um colégio eleitoral composto pelos “membros da respectiva Assembléia Legislativa e de delegados das Câmaras Municipais do respectivo estado”, forma idêntica a ser usada na escolha do governador de estado, cujo eleição voltou a ser indireta. O apelido “biônico” foi tirado da série de televisão mais popular da época: Cyborg.

A fusão do Estado do Rio de Janeiro com o Estado da Guanabara em 1975, e a criação do Mato Grosso do Sul em 1978, foram expedientes que ajudaram o partido governista, a Arena, a se fortalecer. Assim, com a criação do estado do Mato Grosso do Sul, criou-se mais 8 vagas de deputado federal e de 3 senadores em estado pequeno, e, com a extinção da Guanabara, desapareceram as vagas de senadores e deputados federais em um estado francamente emedebista.

Contudo houve divergências entre a agremiação e o governo militar. A mais conhecida contradição e primeira discordância pública entre parte da Arana e o governo militar se deu, em 1968, no chamado “Caso Marcito”, quando o Costa e Silva pediu autorização à Câmara dos Deputados para processar o deputado Márcio Moreira Alves, do MDB. Muitos deputados federais arenistas votaram contra a autorização para se processar o deputado “Marcito”. A resposta da ditadura foi o AI-5 e o fechamento do Congresso Nacional em dezembro de 1968. Este só foi reaberto em outubro de 1969 para a cerimônia de juramento e posse do ditador Médici na presidência da república.

Durante a ditadura eleições diretas, se deu, em 1968, para prefeituras e câmaras de vereadores no Brasil, na qual saiu vencedora a Arena contra o seu rival MDB. Em 1970, o partido do governo teve sua maior vitória, elegendo o MDB, apenas três senadores. Foi na época do “Milagre Econômico” do Médici. Os líderes do MDB chegaram a pensar na dissolução do partido que quase não teve a votação mínima (20%) para poder continuar existindo. O primeiro presidente do MDB, Oscar Passos, que não conseguiu se reeleger senador, em 1970, renunciou à presidência di partido e passou o comando ao deputado Ulisses Guimarães.

Em 15 de novembro de 1972, a ditadura “vence” as eleições municipais na maioria dos municípios. A Arena tinha diretórios em todos os municípios brasileiros e, em muitos municípios, apresentava candidato único ou apresentava sublegendas (até 3) permitidas pela lei eleitoral, lançando 2 ou três candidatos a prefeito no mesmo município, o que acomodava as diversas correntes do partido. Assim, em um município paulista, os janistas (seguidores de Jânio Quadros), podiam usar a Arena-1 e os ademaristas (ex-membros do PSP de Ademar de Barros) lançarem um candidato pela Arena-2. As sublegendas foram instituídas, em 29 de novembro de 1966, pelo Ato Complementar nº 26.

O líder ademarista Mário Beni calculou que, em 1972, 65% dos prefeitos eleitos em São Paulo eram oriundos do PSP de Ademar de Barros, e, na sua maioria, estando abrigados na Arena.

Em 1973, ocorre a crise do petróleo, a alta dos preços e a inflação. O governo sofre, então, sua maior derrota nas eleições de 15 de novembro de 1974.

O MDB temendo nova derrota eleitoral em 1974, como aquela sofrida em 1970, não se arriscou a lançar seus líderes mais importantes como candidatos ao Senado Federal, colocando-os como candidatos à Câmara dos Deputados onde a eleição era menos disputada. Assim, Ulisses Guimarães não se candidatou ao Senado, nem Tancredo Neves, nem Thales Ramalho, abrindo espaço para jovens políticos como o prefeito de Campinas, Orestes Quércia, o prefeito de Juiz de Fora, Itamar Franco e o também jovem Marcos Freire, que acabaram sendo eleitos senadores por São Paulo, Minas Gerais e Pernambuco respectivamente. Em 1974, o MDB elegeu 17 senadores e a Arena apenas 5.

Para as eleições de 1974, o presidente Geisel liberou os debates na televisão e em São Paulo, onde a televisão já atingia quase todos os municípios, o histórico debate entre Orestes Quércia e o candidato da Arena ao Senado, o ex-governador Carvalho Pinto, tido como franco favorito, foi decisivo para a vitória do MDB.

Isso fez com que Geisel voltasse atrás e pela Lei Falcão (lei nº 6.339, de 1 de julho de 1976), nas eleições de 1978, os candidatos podiam apenas apresentar sua fotografia na televisão. O MDB teve a maioria dos votos em 1978, mas continuou em minoria no Congresso Nacional, especialmente pela força que a Arena tinha nos pequenos municípios. Isto fez com que o MDB, (chamado, depois de 1980, de PMDB), usasse, a partir de então, a estratégia de atrair arenistas para seus quadros. Assim, em 1982, o PMDB venceu a eleição para governador de Minas Gerais por ter tido como vice na chapa de Tancredo Neves, o ex-arenista Hélio Garcia, profundo conhecedor das pequenas cidades mineiras.

Essa força da Arena nos pequenos municípios levou o então governador de Minas Gerais, Francelino Pereira a classifica-lo como o “maior partido político do ocidente”, e levou Tancredo Neves a chamar os pequenos municípios onde a Arena sempre ganhava de “grotões”.

Ainda em 1978 a Arena, pela primeira vez, diz não à indicação, por um presidente da república, de um candidato a governador de estado. Em São Paulo, o indicado pelo presidente Geisel para ser escolhido como governador, por um colégio eleitoral de acordo com as regras do “Pacote de Abril”, havia sido o ex-governador de São Paulo Laudo Natel. Porém, o ex-prefeito da cidade de São Paulo, o ademarista Paulo Salim Maluf, com ostensivo e paciente trabalho de cooptação do apoio de delegados arenistas, vence a convenção partidária, é indicado como candidato a governador e é eleito com amplo apoio dos ademaristas.

A Arena geralmente tinha um discurso de valorização do desenvolvimento econômico e fazendo sempre referências às obras realizadas pelo governo militar, enquanto o MDB reclamava do custo de vida e pedia abertura política. Como se dizia que a Arena apoiava o governo em tudo, recebeu o apelido de “O Partido do Sim Senhor”, enquanto o MDB, por ser contra tudo que o governo militar fazia, era chamado, pelos arenistas, de “O Partido do Não”. O MDB chegou a se opor à construção da Usina Hidrelétrica de Itaipu, chamada por Franco Montoro, de “obra faraônica”.

A nova lei orgânica dos partidos políticos, lei nº 6.767, de 20 de dezembro de 1979, que diminuiu as exigências para a criação de partidos políticos no Brasil, permitindo que ressurgisse o pluripartidarismo, impôs a obrigação de as agremiações políticas fazerem constar em seu nome, obrigatoriamente, a palavra “partido”. Acreditam muitos que essa norma foi uma forma que o governo militar encontrou para tentar acabar com o antigo Movimento Democrático Brasileiro (MDB), atual PMDB, que fazia oposição ao regime militar e estava muito forte naquele momento. O MDB passou então a chamar PMDB, e o desgastado nome Arena desapareceu, surgindo o PDS, nome inspirado no SPD alemão que estava no poder, naquela época, na antiga Alemanha Ocidental, país de origem da família do presidente Geisel.

O PDS, posteriormente alterou seu nome para Partido Progressista Renovador (PPR), depois para Partido Progressista Brasileiro (PPB) e hoje se chama Partido Progressista (PP).

Logo após a volta do pluripartidarismo, em 12 de fevereiro de 1980, foi criado o Partido Popular (PP), formado por ex-arenistas e ex-emebistas, liderados por José de Magalhães Pinto e Tancredo Neves. Esse partido não chegou a disputar eleições, foi incorporado ao PMDB em 20 de dezembro de 1981. Seus líderes tomaram a decisão de extinguir o PP porque as novas leis eleitorais, aprovadas em 1981, para regularem as eleições de 1982, tornavam difíceis a atuação dos pequenos partidos políticos.

Nas eleições de 1982 o PDS conseguiu fazer a maioria das cadeiras no Congresso Nacional e no colégio eleitoral destinado a eleger o novo presidente da república em 15 de janeiro de 1985. Em 15 de novembro de 1982 o PDS elegeu 12 dos 22 governadores de estado.

Em 1984, surgiu uma dissidência no PDS, denominada “Frente Liberal” que posteriormente tornou-se o partido político PFL, Partido da Frente Liberal, atual Democratas. A Frente Liberal nasceu de uma dissidência do PDS, aberta quando Paulo Maluf, ex-governador de São Paulo, venceu a disputa interna dentro do PDS, contra o ministro do Interior Mário Andreazza, e foi escolhido, pelo PDS, para ser seu candidato à presidência da República e enfrentar Tancredo Neves, no Colégio Eleitoral, em 15 de janeiro de 1985.

Obs. Na terceira e ultima parte deste artigo, apresentaremos as conclusões sobre a resultante do processo eleitoral bienal que vivemos nos dias atuais e quais fenômenos surgiram a partir daí.

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