Profissional Amadorismo (I)

O ano que ora se inicia nos brindará com mais uma eleição, desta feita, municipal. O pleito que elegerá prefeitos e vereadores(as) nas cinco mil, quinhentos e setenta cidades. Aliás as eleições deste tipo são antigas no país.

A primeira eleição que se tem notícia no Brasil aconteceu em 1532, para a organização política das vilas de São Vicente (litoral de São Paulo) e de Piratininga (atual cidade de São Paulo).

Desde o descobrimento das terras brasileiras pelos portugueses, era a primeira vez que a Coroa Portuguesa se interessava em oficializar a ocupação da nova colônia, investindo na organização jurídico-política das vilas já existentes e na constituição estruturada de novas vilas e cidades. As “Ordenações do Reino” estabeleciam eleições em dois escrutínios para a escolha do Conselho (ou Câmaras) das vilas e cidades (também chamadas “repúblicas”), composto por um juiz ordinário; dois ou três conselheiros (também chamados vereadores) e por um procurador (com atribuições executivas). Os mandatos eram de apenas um ano, mas as eleições deviam acontecer de três em três anos, sendo eleitos três Conselhos, simultaneamente, a cada pleito.

Numa primeira etapa, o povo, que tinha apenas o direito de votar, indicava os nobres que iriam escolher os membros dos Conselhos. Na segunda etapa, os representantes da nobreza indicados pelo povo escolhiam, por voto secreto, outros nobres que iriam compor os Conselhos (ou Câmaras).

O cálculo de eleitores era feito de acordo com o número de casas existentes nas vilas. Este modelo de eleição foi realizado com regularidade em todas as vilas e cidades brasileiras durante quase 300 anos, sem qualquer intervenção de Portugal. A partir de 1820, quando aumentam as reivindicações da classe burguesa quanto à participação política, o rei Dom João VI convoca todo o povo brasileiro a participar das primeiras eleições gerais do Brasil, para a escolha dos deputados brasileiros que iriam integrar as Cortes de Lisboa, para a formação do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarve. Com a Independência do Brasil, em 1822, buscou-se aperfeiçoar o sistema eleitoral a partir do modelo francês. Naquele mesmo ano, o príncipe regente convocou eleições para deputados constituintes. A votação continuava em dois graus. No primeiro grau, os que recebessem salários não podiam votar. No segundo grau, só podiam votar os que tivessem determinada renda anual ou bens patrimoniais.

Em 1824, com a promulgação da primeira Constituição brasileira, Dom Pedro I estabeleceu voto censitário. Aceitava-se o voto por procuração. Só poderiam ser eleitos deputados os que fossem católicos e cuja renda estivesse acima dos 200 mil réis. Em 1842 foram estabelecidas juntas de alistamento formadas por um juiz de paz, pelo pároco local e por um fiscal. Em 1855 foi instituído o voto distrital. Em 1875, nova lei eleitoral cria o Título de Eleitor, integra a Justiça Comum ao processo eleitoral e determina que os eleitores votem apenas em dois terços do número total dos que deveriam ser eleitos.

Em 1881, a “Lei Saraiva” extingue as eleições indiretas e entrega à Magistratura o controle sobre o alistamento de eleitores, abolindo as juntas paroquiais. Na noite de 15 de novembro de 1889 o Brasil deixa de ser Monarquia para se tornar República e, em 1891 é promulgada a primeira Constituição republicana do País.

O momento político era conturbado. Não havia apoio popular, mas os republicanos (militares de altas patentes, industriais, fazendeiros de café) usavam a bandeira da extensão da participação política à uma “nova” classe e aos operários da indústria em formação nos maiores centros urbanos.

Com a posse do primeiro presidente civil, Prudente de Morais, iniciou-se o período conhecido como “Política do Café com Leite”, no qual integrantes das oligarquias cafeeiras de Minas Gerais e São Paulo se alternavam no governo federal. Até 1930, quando foi deposto o paulista Júlio Prestes, último representante desse ciclo, a República Velha foi marcada por golpes de estado, desrespeito à Constituição e muitas fraudes eleitorais.

Com o fim do voto censitário, o direito de votar foi estendido a todos os brasileiros maiores de 21 anos, com algumas exceções (analfabetos, militares de baixas patente, religiosos de congregações e ordens monásticas). No entanto, constrangidos pelos “coronéis” (grandes proprietários de terras considerados líderes políticos locais), os eleitores eram, em sua maioria, obrigados a votar nos deputados indicados por eles, fato que gerou termos como “voto de cabresto” e “curral eleitoral”. O presidente da República era indicado pelo colégio de governadores dos estados, os quais, por sua vez, eram escolhidos pelo presidente.

Diante de tantos desmandos e desrespeitos à ordem constitucional, intelectuais, juristas, industriais, militares e comerciantes em geral, protestavam reiteradamente contra a política estabelecida. Organizadas em grupos, associações e comitês, as mulheres também combatiam os erros da República, que continuava a negar-lhes o direito ao voto. A criação de uma Justiça Eleitoral já era uma exigência do povo brasileiro, que já não suportava mais a manipulação das eleições pelas elites e parlamentares.

Com a Revolução de 1930, Getúlio Vargas assume o discurso moralizador e, como um de seus primeiros atos, além da convocação de uma Assembléia Constituinte, nomeia uma comissão para a reforma da legislação eleitoral. Em 1932 é promulgado o primeiro Código Eleitoral do Brasil e criada a Justiça Eleitoral, composta de um Tribunal Superior e de tribunais regionais eleitorais nos estados.

A Justiça Eleitoral, presidida pelos vice-presidentes dos Tribunais de Justiça dos Estados, passou a organizar todos os trabalhos eleitorais, como alistamento, organização das mesas de votação, apuração dos votos, reconhecimento e proclamação dos eleitos. Também regulou as eleições federais, estaduais e municipais em todo o país.

O sistema de representação passou a ser proporcional e em dois turnos, considerou-se a existência oficial dos partidos políticos, o voto passou a ser secreto e, extensivo (facultativamente) às mulheres. Uma delas, a paulista Carlota Pereira de Queiróz, primeira deputada estadual eleita no Brasil, integrou a Assembleia que elaborou a Constituição de 1934, a partir da qual também passou-se a admitir a formação de uma bancada classista nos parlamentos, composta por representantes de funcionários públicos, empregados e empregadores, eleitos por delegados sindicais.

Com a Constituição de 1934 foram extintos os senados estaduais. Por ter um caráter fortemente liberal e descentralizador, Getúlio Vargas, cuja pretensão, tudo indica, era fortalecer o poder presidencial, não parece ter “gostado” da Constituição de 1934 e, em 1937, outorgando, com um golpe de estado, uma nova Constituição, estabelece uma nova ordem política – o Estado Novo.
Nesse período a Justiça Eleitoral foi extinta e os partidos políticos foram abolidos e estabeleceu-se eleição indireta para presidente da República com mandato de seis anos.

Em meio a muitos protestos, perseguições e exílios políticos, a oposição, mesmo fragmentada,, apoiada por parcela da cúpula militar, destitui Getúlio Vargas em outubro de 1945. A Justiça Eleitoral é reinstalada e o Ministro José Linhares, Presidente do Supremo Tribunal Federal (e também do Tribunal Superior Eleitoral) assume interinamente até a eleição direta do próximo presidente da República. Em dezembro daquele ano o General Eurico Gaspar Dutra é eleito presidente do Brasil e convoca eleições, em 1946, para a formação de uma Assembleia Constituinte.

A partir de 1945 foram realizadas eleições diretas nos anos de 1947, 1950, 1954, 1955, 1958, 1960 e 1962 para governador, deputados estaduais, distritais e federais, prefeitos, vice-prefeitos e vereadores, sendo as eleições presidenciais nos anos de 1945 (Eurico Gaspar Dutra), 1950 (Getúlio Vargas), 1955 (Juscelino Kubitschek) e 1960 (Jânio Quadros). Em janeiro de 1963 realiza-se oreferendo para a manutenção ou não do parlamentarismo, em vigor desde a renúncia do presidente Jânio Quadros, em 1961. Em 1964, o presidente João Goulart, que governava em regime parlamentarista tendo Tancredo Neves por Primeiro-Ministro, foi deposto, passando o Brasil a ser governado, por militares do Exército. Eleições para presidente da República e governador de Estado passaram a ser indiretas.

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