Banda de música da inconsequência

A diferença é que entre 1946 e 1964, quando se notabilizou na cena política brasileira, situando-se à direita e acicatando governos constituídos pelo PSD e pelo PTB, a chamada "banda de música da UDN" reunia gente de talento. Na rinha parlamentar, Carlos Lacerda, Afonso Arinos, Bilac Pinto, Adauto Lúcio Cardoso, Aliomar Baleeiro e outros, compareciam com um discurso articulado e plasticamente palatável.

É verdade que, concomitantemente, abordavam chefes militares tramando o golpe que lhes compensasse as perdas sucessivas nas urnas. Eram as "vivandeiras dos quartéis".

Hoje, o barulho é até mais estridente e o apoio midiático muito mais poderoso e sofisticado, porém o discurso padece de anemia crônica, no conteúdo e na forma.

Ao invés dos quartéis, marcam presença constante nas portarias dos tribunais superiores.

Pretendem não exatamente a intervenção militar, mas o golpe jurídico.

Mais: de um ex-presidente intelectual frustrado pelas sucessivas comparações que lhes são desfavoráveis em relação ao sucessor operário metalúrgico, a parlamentares de qualificação duvidosa e veteranos que até ontem amargavam um triste final de carreira, os que hoje fazem barulho contra a democracia e atiçam as dificuldades econômicas, passam ao largo da mínima possibilidade de canalizarem a insatisfação popular.

Como assinalam analistas isentos, erra quem confunde os mais de setenta por cento da população que se manifesta insatisfeita com o governo com a tomada de partido na oposição.

Entre vinte e cinco a trinta por cento seriam mesmo a expressão exata dos que não apoiam o governo.

A outra parcela, majoritária, rejeita as medidas de ajuste, pelas consequências em sua vida cotidiana, e pela insegurança que semeiam, mas não identificam nos oportunistas da atual "banda de música da inconsequência" depositários de propostas alternativas.

Nem poderia identificar. Na verdade, a oposição, sobretudo os senhores do Apocalipse, entende a necessidade do ajuste fiscal (que assim mesmo procuram torpedear no Congresso Nacional), quer que a presidenta Dilma o realize, na expectativa de colherem os frutos adiante, num desejado (sic) governo pôs-afastamento da presidenta.

Um roteiro de descompromisso com a Nação e o povo. Pois em situação crítica, resguardadas as distintas propostas programáticas e a saudável polêmica, ajustar as contas públicas e lastrear o caminho para a retomada do crescimento é tarefa de todos.

Ainda como subproduto da empreitada inconsequente, não são poucos os que alimentam a recuperação de propósitos de poder em meio ao propalado caos.

Na mira destes, o pleito municipal nas capitais – como o Recife – e cidades médias e grandes.

Em seu imaginário, a reconquista de um protagonismo que derrotas eleitorais sucessivas lhes tiraram.

Falta combinar com o povo.

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