Polêmica no RS é mais um ataque à solidariedade aos palestinos

A Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) entrou na lista de entidades acossadas por opor-se à política israelense de massacres do povo palestino. Desde que respondeu à demanda de diversas entidades por informações sobre seu envolvimento institucional com empresas militares israelenses ou o polo espacial então gestado no Rio Grande do Sul, em parceria com a Elbit Systems, a Universidade tem sido taxada de “antissemita” e “racista”. 

O episódio, porém, demarca com clareza os obstáculos ainda enfrentados no Brasil e no mundo pelos movimentos solidários à causa palestina por libertação, soberania, dignidade e paz.

No contexto da terceira grande ofensiva militar de Israel contra a Faixa de Gaza em cinco anos, a UFSM recebeu, em agosto do ano passado, cinco perguntas das entidades sindicais Associação dos Servidores da UFSM (Assufsm), Seção Sindical dos Docentes da UFSM (Sedufsm), Diretório Central dos Estudantes (DCE) e do Comitê Santa-mariense de Solidariedade ao Povo Palestino. Chocadas com mais um episódio do massacre do povo palestino, que provocou a reação mundial pelas mais de 2.270 mortes – majoritariamente civis, inclusive quase 600 crianças – e pela devastação da Faixa de Gaza, as entidades valeram-se da Lei de Acesso à Informação (nº 12.527/2011) para entender o envolvimento da UFSM nas relações com Israel e empresas militares que sustentam a ocupação da Palestina

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A iniciativa enquadra-se num movimento mundial de universidades em dezenas de países que procuram dissociar-se da impunidade com que entidades e líderes israelenses perpetram crimes de guerra contra o povo palestino, denunciando a violência permanente e exigindo o fim da ocupação israelense. Entretanto, assim como outras universidades, organizações civis e intelectuais, a UFSM foi taxada pela liderança sionista e seus porta-vozes no Brasil de “antissemita”, tática patente contra os que criticam a política de Israel, inclusive quando as vozes da crítica são israelenses. As cinco perguntas encaminhadas pelas entidades foram:

1) A UFSM tem alguma participação no Polo Espacial do Rio Grande do Sul? Se positivo, qual? Que documento embasa esta relação?

2) A UFSM tem alguma relação com pessoas jurídicas israelenses (empresas privadas, entidades públicas, ONGs e etc.), inclusive através de suas subsidiárias brasileiras ou, ainda que indiretamente, através de cooperação com outras instituições brasileiras que tenham relações com aquelas? Que documento embasa esta relação?

3) Encontra-se registrada e/ou em execução na UFSM alguma ação (Plano, Programa, Projeto, Convênio, Acordo de Cooperação, Protocolo de intenções, etc.) com pessoas jurídicas israelenses, inclusive através de suas subsidiárias brasileiras ou, ainda que indiretamente, através de cooperação com outras instituições brasileiras que tenham relações com aquelas? Que documento embasa esta relação?

4) Há, no momento, ou a perspectiva, de a UFSM receber alunos, professores, autoridades, profissionais israelenses? Se positivo, a convite/proposta de quem?

5) A UFSM é, ou está em vias de ser, beneficiária de algum recurso material ou humano de origem israelense, mesmo que indiretamente, ou seja, através das relações referidas nos itens 2 e 3 retro?

O documento explica que a iniciativa tem base no determinado pela Constituição Federal sobre os princípios que regem a Política Externa brasileira: independência nacional, prevalência dos direitos humanos, autodeterminação dos povos, não-intervenção, igualdade entre Estados, defesa da paz, solução pacífica dos conflitos, repúdio ao terrorismo e ao racismo e cooperação entre os povos para o progresso da humanidade – todos flagrantemente violados pela política israelense.

Outro fator que instigou os questionamentos, explica o texto, foram as notícias do envolvimento da UFSM no projeto de desenvolvimento de “tecnologias de defesa” com a AEL Sistemas, subsidiária da israelense Elbit Systems, que participa na manutenção do extenso muro ilegal construído na Cisjordânia palestina, por exemplo, além de fabricar armamentos e dispositivos de “segurança” testados na opressão dos palestinos. Por outro lado, em dezembro de 2014 o governo do Rio Grande do Sul declarou “sem objeto” e anulado o protocolo assinado com a AEL em 2013 para a construção de um parque aeroespacial militar no estado, combatido pelo movimento internacional, mas nascido na Palestina, por Boicote, Desinvestimento e Sanções (BDS).


Sistema de artilharia Atmos, desenvolvido pela Elbit Systems. Foto: Divulgação

Para a ofensiva contra a UFSM, segundo a Administração Central da Universidade, o memorando enviado aos requerentes das informações foi fraudado e disseminado, servindo de base para a redação de calúnias em revistas já afamadas por sua defesa incondicional e virulenta das políticas israelenses de opressão do povo palestino. A alegada demanda por identificação de docentes e pesquisadores israelenses, negada pelas entidades e pela Reitoria, ficou sob os holofotes da ofensiva sionista para desqualificar a ação como “antissemita” e “racista”. A Procuradoria da República do Rio Grande do Sul acusou o pró-reitor José Fernando Schlosser, de "praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.” A versão adulterada incluiu ainda a manifestação “Liberdade para a Palestina, boicote a Israel”, em inglês, mas foi rechaçada como fraudulenta pelo reitor da UFSM, Paulo Afonso Burmann.

Em nota oficial divulgada na última quinta-feira (4), a Reitoria afirmou, entre outros pontos, que não houve “qualquer solicitação por parte da UFSM a quaisquer de suas unidades acadêmico-administrativas de listas de estudantes e/ou professores israelenses ou não vinculados academicamente.” A polêmica demonstra a reação agressiva com que os defensores das políticas israelenses respondem ao fortalecimento do movimento internacional demandando responsabilidade das instituições de ensino e pesquisa, além dos próprios governos, pela dissociação, denúncia e pressão contra as práticas de segregação e ocupação israelense sobre os territórios palestinos como base para o fim da impunidade que a sustenta há quase sete décadas.

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