O fantástico “best seller”

Faz sentido toda essa agitação em torno do livro chamado “best seller”. Tido como constante mobilizador da indústria editorial e seus criadores. Um “best seller”, ou aquele livro que vende incrivelmente bem e em pouco tempo, é o que, com mais rapidez proporciona sonhos de riqueza e júbilo. 

De certa forma, é de se pensar no conceito do “best seller” como o da materialização maior do mundo capitalista: escrever uma obra ou produzir um sonho e com ele ficar rico, espécie de ápice na sociedade do privado e do exclusivo.

Das respostas usualmente dadas em aula e nas consultorias editoriais, a que mais faz a diferença é a que apresenta o “best seller” como um título, que é, seguidamente, e nada outro, do que um livro descartável e passageiro. O “best seller” pertence à curva quase angulosa no cálculo das vendas de livros, ou seja, seus números podem ser impressionantes e gerar uma onda de consumo e curiosidade, mas podem significar o fim prematuro de um autor e até de seu livro. O que, imagino, não satisfaça os sonhos de muitos dos autores, assim como de editores, que embora tenham feito bom dinheiro nas primeiras edições, sabem do valor do fundo de catálogo, daquele livro que venderá anos a fio, pedindo reedições e reimpressões, e que raramente inicia sua vida como um “best seller”.

Tudo bem, uma boa venda pode salvar o pelo de muita gente, pode levar a felicidade para uma empresa pequena e tirar da depressão o autor em crise de subsistência e até de consciência. É bom citar um paradigma brasileiro do livro “best seller”, o famoso dono de castelos Paulo Coelho. Sobre ele, esse nome já multinacional, existem opiniões literárias das mais diversas, porém de visões comerciais praticamente uníssonas: ele é sucesso. E a melhor resposta, ou a melhor opinião sobre o fenômeno de vendas Paulo Coelho, não está no escrutínio de seus números ou na sua eventual “genialidade” literária, está em compreender o contexto cultural e econômico em que se deu o lançamento de suas obras, e também nas atitudes por ele tomadas, ao deparar-se com o êxito nas estratégias de promoção do autor e do texto.

Se Paulo Coelho tivesse lançado suas obras nos anos 1980, talvez e muito possivelmente não tivesse tido toda a projeção conhecida. Lembro que, na década 1990, o consumo de massas e a busca do esoterismo e da autoajuda, proporcionaram um redirecionamento nos investimentos editoriais e, porque não, televisivos e cinematográficos. Em resumo, Paulo Coelho levou adiante um projeto exitoso e congraçador de uma vida dedicada a uma imagem, não necessariamente a uma obra. E nisso talvez resida seu maior valor enquanto ícone contemporâneo do livro “best seller” brasileiro. Ele, afinal, soube promover a si, o mago, seus livros vieram ao reboque.

Nos debates sobre os destinos do livro em papel e digital, não se pode cometer o erro de se acreditar no “best seller” como a única salvação da lavoura. Ele importa, sem dúvida, e faz a diferença, mas empreender no setor, como autor, editor ou parceiro, tendo em vista unicamente um campeão de vendas, pode o efeito colateral ser mais importante do que a medicação. A cultura em torno do “best seller” pode ser comparada às frequentes denúncias contra as sementes transgênicas na agricultura, seu uso excessivo e indiscriminado pode matar a diversidade e provocar com que toda uma cultura dependa de poucas empresas e poucos autores.

E é na proliferação de “best sellers” que se encontram alguns dos motivos da asfixia das pequenas e médias livrarias. As grandes, por terem mais vitrines e maior potencial de barganha, sempre oferecerão os melhores preços e custos de frete para os mesmos livros encontrados nas pequenas e médias. Por isso, o voto de desconfiança às listas dos mais vendidos deve permanecer constante, os bons e tão essenciais agentes do mundo editorial deve manter-se alertas. Um ou muitos “best sellers” é bom, mas poderão nos matar de fome e sede antes que percebamos seu perigo.

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