Obscurantismo como método

O governador do Amazonas, José Melo (PROS), acaba de extinguir a Secretaria de Ciência e Tecnologia, sob vigoroso protesto do mundo acadêmico e mesmo do conjunto da sociedade amazonense.

Num estado com reconhecida limitação tecnológica e com necessidade premente de soluções adequadas a esses desafios, essa atitude pode parecer uma irracionalidade. E é sem dúvida alguma. Mas vai além. Está no campo do obscurantismo, onde sequer se concebe a solução dos impasses e limitações das forças produtivas através da ciência e da tecnologia e sim, quem sabe, através de qualquer “crendice”.

Um episodio histórico talvez ajude a compreender até onde vai esse obscurantismo. No cerco a Siracusa, na Sicília, as então invencíveis legiões romanas, comandadas por Marco Cláudio Marcelo, perderam vários navios simplesmente incendiados por um conjunto de espelhos manipulados da terra por um gênio chamado  Arquimedes.

Quando finalmente as legiões se apoderaram de Siracusa e começaram a destruição em massa, como era da tradição romana, um legionário invadiu a casa de Arquimedes e ele continuou desenhando como estava fazendo, sem dar a menor atenção ao invasor, até cair decapitado pelo brutamonte que sequer sabia que aquele era o gênio que tinha afundado seus navios, graças ao conhecimento científico que transformava inofensivos espelhos em poderosas chamas incendiárias.

E assim, pela estupidez e obscurantismo de um legionário romano, o gênio Arquimedes de Siracusa – matemático, físico, engenheiro, inventor, astrônomo – teve a sua brilhante trajetória científica interrompida no ano 212 antes da era Cristã, aos 75 anos de idade. A Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação do Amazonas (SECTI), que mal nascera e já se agigantava, foi assassinada pelo governador José Melo, em 2015, aos 12 anos de idade, ainda criança. Não havia sequer entrado na adolescência.

Arquimedes foi decapitado há 2.226 anos por um brutamonte sem qualquer noção científica. Seu crime ainda hoje faz estrago à ciência. A SECTI foi destruída por quem tinha obrigação legal de preserva-la. Seu crime jamais prescreverá. Entre uma e outra estupidez é difícil mensurar, pelo lapso de tempo entre elas, qual foi a mais estúpida. Mas, temos uma certeza: ambas expressam a mais elevada manifestação obscurantista em relação à ciência.

O quanto a humanidade perdeu por essa estupidez é difícil precisar, mas não resta dúvidas que perdeu muito. E talvez explique porque ainda estamos tateando em vários campos do conhecimento. A ciência não é como o reflexo de um espelho, instantâneo. Sua eficiência exige, além de investimentos e corpo científico qualificado, um longo tempo de maturação. E nem sempre os resultados são os que nós desejamos.

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