Debate aquecido

Nos debates do período eleitoral, tanto nos planos estaduais como nacional, a questão ambiental teve papel mais que secundário. Isto, apesar de o 5° Relatório do IPCC (Painel Internacional sobre Mudanças Climáticas) ter sido divulgado, com novos e graves alertas, em pleno processo pré-eleitoral, e colocando o Brasil em destaque.

Os temas ligados ao futuro da vida aqui e no Planeta inteiro, contudo, tendem a aquecer rapidamente, envolvendo governos e cidadãos, por conta da crise de água que assola o país.
É certo que, nas últimas décadas criou-se um novo tipo de cidadão por aqui e em alguns cantos do mundo. Trata-se de “ambientalistas”, gente que teria a sabedoria ou dom divino de saber mais das coisas da vida dos que os demais mortais.

O debate ficaria restrito a esses. E isso, convenhamos, é erro de foco mais que evidente. Uma questão onomástica, com certeza. Inventamos essa categoria de pessoas e as batizamos dessa forma, com um nome que cria certa aura em torno de iluminados. Seriam esses, e só esses, que se pode considerar como aptos a cuidar do ambiente em que vivemos.

O IPCC, hoje coordenado pelo indiano Rajendra Pachauri, é um organismo das Nações Unidas (ONU) e analisa dados coletados por quase três mil outros cientistas no mundo inteiro, inclusive no Brasil. Aliás, seis brasileiros fazem parte da equipe responsável pela versão final do documento. O primeiro desses relatórios foi elaborado em 1990 e serviu de base para a Eco-92, no Rio de Janeiro.

O quinto, agora divulgado, demonstra que a questão do aquecimento global mudou muito desde então, pra pior. A desordenada expansão urbana, o aniquilamento de cursos e depósitos d’água e a destruição de florestas são três fatores apontados entre os principais responsáveis pela degradação da vida na Terra.

São temas que têm tudo a ver com o atual estágio de crescimento brasileiro. Estranhamente, porém, parecem não merecer previsão de ações enérgicas nos planos dos governos eleitos nos estados e mesmo nas áreas federais mais diretamente ligadas ao assunto, em especial o Ministério do Meio Ambiente.

Além disso, o novo Congresso, eleito em outubro, tem um perfil menos suscetível a avanços, muito pelo contrário. Basta ver o tamanho da bancada ruralista. E basta rodar pelo país, sobretudo nas áreas de expansão da fronteira agrícola (Centro-Oeste e Amazônia), a maneira com que os grandes proprietários usam a terra rural.

As veredas e encostas são invadidas, matando nascentes, as margens de cursos d’água e de rodovias são igualmente cultivadas como se fossem a casa da mãe Joana, mas isso parece normal. Sem contar que boa parte dessas fazendas foi ocupada irregularmente e usou poder econômico ou força bruta para expulsar gente humilde das terras.

Com isso, os centros urbanos incham e o Estatuto das Cidades, em vigor há 13 anos, como resultado de amplo e prolongado debate nacional, é uma lei pouco aplicada. Os próprios planos diretores previstos são feitos burocraticamente, para efeito de cumprimento de lei, mas ficam guardados nas gavetas.

No entanto, a atual crise de água, que afeta o país inteiro, com secas ou enchentes, está forçando um aquecimento do debate e elevando o nível de consciência da população. E isso dará respaldo a ações governamentais.

Deste modo, os novos alertas do IPCC talvez possam auxiliar na formulação de políticas de contenção do processo em curso e deixem de ser tratados como coisa de ambientalistas.

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