Aécio tem razões para espernear

Fosse apenas à estrepitosa recepção na entrada do Senado, quando Aécio Neves foi aclamado por uma multidão de uma centena de funcionários comissionados, e tudo estaria bem, relevar-se-ia. Afinal, é mais do que comum em nossos costumes políticos o derrotado armar um teatro para figurar o papel de vencedor.

Mas, não, o ridículo não encontra limites – e, no caso do PSDB, quando encontra, este corajosamente o transpõe. O segundo ato, ainda em encenação, nos reserva coisas mais deploráveis que o anterior.

O palavrório vazio do ex-presidenciável, em entrevista e na tribuna do Senado, por exemplo, só pode servir a dois propósitos.

O primeiro, pessoal, está evidente: aproveitar os holofotes do momento pós-campanha para manter-se como líder da oposição. E é mesmo de se esperar que lute para alongar ao máximo este período de mídia espontânea, já que nada leva a crer – dada sua preguiçosa e opaca atuação nos quatro anos anteriores – que o lugar ora conquistado esteja garantido até a próxima disputa.

Afinal, se é verdade que Aécio teve o melhor desempenho para um tucano desde 2002, é igualmente verídico que perdeu a eleição em casa, ao ser atropelado pelo povo de Minas Gerais não uma, mas duas vezes. E ficou em flagrante desvantagem ao perder o governo, já que seu potencial oponente interno, Geraldo Alckmin, continuará mais uma gestão no comando da segunda máquina do país. Isso sem contar com as velhas raposas com quem competirá para manter-se em destaque, José Serra à frente.

Quem alimenta o ódio?

O outro propósito, ainda que a dissimulação queira camuflar, é aquele de alimentar o revanchismo e o envenenamento do ambiente político, numa espécie de terceiro turno deveras prejudicial ao país.

Ao descer do altar em que foi santificado pela mídia e escalar a tribuna, o senador não perdeu a oportunidade para mais uma vitimização. "No geral, aquilo a que se assistiu foi uma campanha baseada no estímulo ao ódio, um projeto amesquinhado e subordinado ao marketing do medo e da ameaça. Tentaram, a todo custo, dividir o país ao meio: entre pobres e ricos, entre Nordeste e Sudeste”, diz num trecho da longa peroração.

Haja para tamanho despudor

Esqueçamos, pois, que o deputado estadual eleito Coronel Telhada (PSDB-SP) propôs a secessão do estado de São Paulo, uma vez que no seu olhar obtuso, Nordeste e Norte seriam os “responsáveis” pelo triunfo de Dilma e, portanto, um Brasil de segunda classe.

Decerto são vítimas da “campanha de ódio” aqueles eleitores e partidários de Aécio que clamaram pelo impeachment de Dilma, no último sábado, na avenida paulista. Lembremos que entre os devotos do ex-presidenciável estava um deputado federal eleito, de arma na cinta, a urrar pela intervenção militar.

Na passeata dos “cidadãos de bem”, só faltou pedirem a volta do voto censitário. Mas, claro, estavam todos a caminho da missa e não em pregação consciente contra os valores mais elementares daquilo que se convencionou chamar democracia.

E o que dizer do conteúdo edificante que se tem propagado nas redes sociais? São a prova viva de como os adeptos do tucanato estão com o espírito desarmado, a alma despedida de preconceitos de todos os matizes, influenciados talvez pela elevada figura deste monge das Alterosas.

A verdade, amigos, é que o PSDB está gostosamente adaptado a este eleitor de ultra-direita e o alimenta com atitudes irresponsáveis como o pedido que levanta suspeição sobre o resultado eleitoral, com frases como a de FHC, que atribuiu a votação de Dilma à “falta de informação” dos mais pobres, ou a de Alberto Goldman, para quem ao perder nos grandes centros e entre os mais ricos Dilma ficaria sem condições de governar.

Na falta de militância engajada em seu projeto de país, resta ao PSDB ombrear-se com a vanguarda do atraso, mantê-la em campanha aberta e permanente contra o governo legitimamente eleito, mesmo que isso signifique incentivar preconceitos e intolerâncias mil.

Jus sperniandi

O que nem a mídia servil e nem o mais fanático tucano conseguem negar é que, por trás do discurso de “vitória política”, “oposição fortalecida” e “país dividido”, esconde-se o desespero de quem sofreu a pior e mais amarga entre as quatro consecutivas derrotas eleitorais.

A oposição havia encomendado o terno da posse desde junho do ano passado. Pudera: as condições, objetivas e subjetivas, nunca foram tão favoráveis ao campo oposicionista. A crise econômica que traga o mundo afetou o Brasil, existiu (e existe) um anseio difuso por mudanças em grande parcela da população, aconteceu a importante fissura na base governista que originou a candidatura Eduardo Campos – mais tarde acrescida pela triste figura de Marina Silva -, o PSDB finalmente marchou unido e contou, mais uma vez, com o uníssono dos meios de comunicação a seu favor – inclusive a tentativa de golpe da Veja, às vésperas do 2º turno.

O que lhes causa desespero é responder a simples e direta pergunta: se perderam agora, com tudo a favor, vão ganhar quando? Pensando bem, Aécio tem razões de sobra para espernear.

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