Agricultura "made in Brazil"

Não fossem as desigualdades sociais intrínsecas do capitalismo, cada brasileiro estaria consumindo, em média, uma tonelada de grãos e um boi por ano. Obviamente, isso é muito mais que o organismo de uma pessoa exige durante 365 dias e, portanto, cada vez mais o Brasil vem se tornando um dos maiores exportadores de alimentos do mundo.

A safra recorde que se aproxima das 200 milhões de toneladas de grãos (cereais e oleaginosas) é um feito extraordinário para o país. Isso sem falar na produção de outras matérias-primas agrícolas como frutas, legumes, hortaliças, carnes, borracha, flores, fibras, madeira, etc.

Alcançamos esses números com relevantes investimentos públicos voltados à pesquisa e desenvolvimento de tecnologias que contemplam tanto a chamada agricultura familiar como, sobretudo, a agricultura em larga escala, de cunho empresarial. Imperioso também reconhecer a enorme contribuição da iniciativa privada nacional que cumpriu papel destacado no estímulo à inovação agropecuária.

Acrescente-se a tudo isso, nos últimos anos, os grandes aportes direcionados pelo governo Dilma ao crédito agrícola. Para o Plano Safra 2014/15 projeta-se uma ampliação do crédito de custeio e investimento de quase 15% com as taxas de juros reais muito próximas de zero. Resultado disso é que a produção de grãos aumentou à taxa de 9% ano entre 2011 e 2014. Esses números, somando-se o fato que a área plantada manteve-se quase a mesma – em um país que 29% de seu território são destinados à proteção de terras indígenas e às reservas ambientais – são impressionantes.

Em apenas três décadas abandonamos o posto de um dos maiores importadores de alimentos do mundo para sermos o quarto maior exportador de produtos agrícolas. Entretanto, a agropecuária brasileira é chamada a dar um passo adiante, mais audacioso e estratégico: transferir todo esse cabedal de conhecimentos, práticas e experiências para países de agricultura tropical semelhantes ao nosso.

Nesse sentido, países africanos – cujos solos de suas savanas assemelham-se ao nosso do cerrado, além de clima e fotoperíodo similares -, podem absorver muitas tecnologias desenvolvidas pela Embrapa, em harmonia com uma agenda definida pelo governo brasileiro através da sua Agência Brasileira de Cooperação (ABC). Moçambique é um caso emblemático em que a “diplomacia agrícola” brasileira pode dar grande contribuição.

Infelizmente, setores do movimento social criticam programas liderados pela Embrapa, com apoio da FAO, como o chamado ProSavana (iniciativa que pretende aumentar a produção e a produtividade agrícola para garantir o abastecimento a uma população crescente em um país que é importador de alimentos), por avaliarem que é uma ferramenta de ocupação da terra por multinacionais.

Uma vez mais, a miopia de certos movimentos campesinos impede que se enxergue o óbvio, ou seja, que a luta por um modelo agrário popular e democrático não é incongruente com um modelo agrícola fundamentado em técnicas e práticas modernas. Não adianta falar grosso contra a ajuda brasileira e se calar diante da dependência alimentar da totalidade desses países africanos. Mais revolucionário que exportar frango para Moçambique é ajudá-los a produzir essas aves com ração produzida no próprio país.

Como disse o economista moçambicano, Hipólito Hamela, “não é possível fazer agricultura familiar com enxada de cabo curto produzindo 600 quilos de milho por hectare". E é justamente nesse propósito que o modelo de agricultura made in Brasil – absorvendo as peculiaridades locais – tem muito a oferecer aos países irmãos do rico continente africano.

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