A Capoeira e a participação na política

A atividade política virou a “Geni” (Canção de Chico Buarque da década de 70) da vez. Há anos as elites procuram “satanizar” a prática política, transformando-a, praticamente, em responsável por todos os males da humanidade. Os noticiários da grande mídia produzem, com artilharias pesadas, “informações” que tentam dar conta que políticos são sinônimos de picaretas e maus-caracteres e que a atividade política visa unicamente à corrupção o “se dar bem”.

Todo dia e durante várias vezes, pela manhã, à tarde e a noite. Nos jornais impressos, televisivos é a mesma ladainha. Se considerarmos isso é até normal que no ambiente da Capoeira sinta-se também esta aparente ojeriza à política.

É comum se ouvir de membros da comunidade a frase: “Eu não gosto de política.” Costuma-se inclusive reclamar quando se faz atividades como congressos, eventos e reuniões próximos às eleições. Na verdade quem pensa assim e quem age assim, dá “um tiro no pé”. As elites dominantes estimulam este raciocínio para quê cada vez mais pessoas simples, do povo trabalhador e carente reduzam o valor que tem a participação na política. Não queiram participar e limitem-se a simplesmente “dar” seu voto a representantes da própria elite que depois de eleitos vão estimular com suas práticas esta propaganda negativa. Os trabalhadores e o povo, que é de onde vem e onde vive os capoeiristas precisam resistir a isso. No caso da Capoeira, contraditoriamente, a participação na política se dá desde sempre. E por vezes, por muitas vezes, a partir de uma posição atrasada imposta pelas elites e seus representantes, os capoeiristas se dividem e terminam “vendendo” seu apoio político e eleitoral a candidatos que não tem o mínimo compromisso com esses princípios. Por essa razão vamos abordar a questão da Guarda Negra, um exemplo, entre tantos, da participação da capoeiragem na política e seus ensinamentos.

As versões de historiadores sobre a origem da Guarda Negra

Houve várias versões sobre a formação de milícias negras no Rio de Janeiro e em outras províncias como Maranhão, Amazonas e Bahia.

Também as fontes apontam para o envolvimento de conservadores como Ferreira Viana, João Alfredo e de abolicionistas como Patrocínio e Emile Rouéde com grupos de capoeiras.

Na formação da Guarda Negra, pós abolição, há relatos de dois grupos criados ou reunidos por abolicionistas e membros do Partido Conservador. O primeiro foi reunido por Emile Rouéde em julho de 1888 na casa de amigos em que convidou os negros libertos do 13 de maio para criar uma associação que representasse a submissão dos mesmos a sociedade branca.

O segundo foi à milícia de brancos e negros alforriados reunidos pelo gabinete de João Alfredo, que repetia a forma empregada pelo Partido Conservador, contra os inimigos políticos do regime monárquico. O grupo deveria agir de forma clandestina para que espalhasse o medo entre os adversários e permitir ao Partido Conservador incorporar a camada popular mais pobre a sua tutela.

A primeira versão dada sobre a origem do grupo foi narrada por Orico, biografo de José Patrocínio.

A Guarda Negra, para Orico (1977), foi constituída a partir um grupo de negros, apoiados por monarquistas, que se reuniram para formar uma irmandade negra, a Sociedade Recreativa Habitante da Lua, na região de Santana – reduto dos Nagoas.

Essa irmandade era formada por negros alforriados e, posteriormente, passou a aceitar negros libertos pela Lei Áurea. Os dados mais precisos sobre essa irmandade sugerem que o grupo dos nagoas foram os elementos que formaram a Guarda Negra, por terem no passado apoiado o Partido Conservador.

Essa irmandade jurava defender a Monarquia e obedecia a compromissos solenes e rituais de devoção a Isabel, com sessões secretas e juramentos sagrados, baseado na Bíblia. A violação do segredo dessa irmandade levava à expulsão ou à morte dos culpados.

O grupo esperava o advento do terceiro reinado e deveria reagir a qualquer ameaça pessoal à Princesa Isabel. O Isabelismo motivou o grupo a agregar novos adeptos quando a irmandade mudou de nome para Sociedade Beneficente Isabel A Redentora, cujos dados sobre a origem do grupo e seus membros ainda estão ocultos.

Segundo Magalhães Junior (1976) a formação da primeira versão da Guarda Negra foi iniciativa não de José do Patrocínio, mas de Manuel Maria Beaurepaire Pinto Peixoto, abolicionista e monarquista. Magalhães Júnior explica que os republicanos ficaram indignados pelo aliciamento de homens de cor (negros), para engrossar as hostes monarquistas e insinuavam que a Guarda Negra estava ligada ao ministro da Justiça Ferreira Viana, com total apoio de João Alfredo.

Para Maria Lúcia Rangel Ricci (1990) os idealizadores da Guarda Negra foram os abolicionistas mais exaltados, como José do Patrocínio, que queriam combater a influência do Partido Republicano perante a população do Rio de Janeiro. Patrocínio queria que a ideologia de proteção à Redentora Isabel, construída por esse grupo, se estendesse para as demais províncias do Império.

A Guarda Negra, segundo Robert Daibert Júnior (2004), foi uma milícia política com ares religiosos. Seus membros comportavam-se como arruaceiros e tinham como principal foco de ação desestabilizar as conferências republicanas. Os republicanos consideravam os membros da Guarda Negra um bando de marginais liderados por negros ressentidos com sua inferioridade na sociedade carioca.

Augusto Mattos (2009) aponta que a Guarda Negra teve sua formação iniciada na casa do abolicionista e monarquista Emilio Rouedé, em 10 de julho de 1888, com o total apoio de José de Patrocínio, que se intitulou o criador e mentor do grupo.

Segundo Mattos, nos estatutos sobre o grupo, publicados no Cidade do Rio, os negros escolhiam os membros de uma diretoria que autorizava admissão de novos integrantes. Mattos (2009) ainda descreve os integrantes da Guarda Negra como negros alfabetizados que tinham a missão de agregar outros ex-escravos para o grupo, sobre a proteção dos abolicionistas.

Seus associados consideraram a data de 13 de maio como um marco da libertação dos cativos no Brasil e juraram defender a pessoa que promoveu a extinção da escravidão, a Princesa Isabel. Os estatutos da Guarda Negra ordenavam que os negros só trabalhassem em fazendas cujos proprietários não fossem hostis a Isabel e apoiassem o terceiro reinado.

Patrocínio solicitou o apoio da Confederação Abolicionista à Guarda Negra, para que suas ideias fossem divulgadas nas demais províncias do Brasil para o que contava também com o apoio da imprensa. No entanto, os republicanos não aceitaram a formação de milícia armadas apoiadas por abolicionistas e o Isabelismo de Patrocínio. Em seus jornais como Província de São Paulo, Gazeta da Tarde e O Paiz criticaram a postura da Confederação Abolicionista de aceitar semelhante ideia e apoiar o fanatismo de Patrocínio.

No próximo artigo abordaremos como e qual foi à consequência desta participação nas maltas e Guarda Negra na realidade pós-abolição.

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