A Petrobrás para fins de “estabilidade monetária”

A oposição acusa o governo de uso político da Petrobrás. A resposta dos setores governistas aponta aumento da produtividade da companhia após 2003. O fato é que a Petrobrás vale muito mais hoje do que em 2002. Mas também é fato que a Petrobrás perdeu muito seu valor de mercado nos últimos anos. Será mesmo culpa do “uso político” por parte do governo?

Não sou muito fá desta metodologia que enfrenta números com números. Apesar da grande valia deste recurso, creio ser meio ineficiente. Mas esse é o nível do debate no Brasil onde todo mundo disputa quem combate melhor a inflação. O caso da Petrobrás e sua perda de valor de face encerra muito mais do que quem fez mais e melhor pela empresa. Expressa algo que quase ninguém está a fim de colocar a mão. Refiro-me aos objetivos nacionais impostos, sobretudo após o advento da (anti) estratégia nacional de estabilidade monetária e combate à inflação. E a Petrobrás, como a maior companhia nacional em atividade, é atingida em cheio por isso. Ou não?

Vamos lá. O que a nossa péssima oposição chama de “uso político” nada mais é do que a interferência do maior acionista (Estado) da empresa no sentido de segurar o preço da gasolina de forma que esta não interfira nas malditas metas de inflação. Esse “uso político” seria o maior responsável pela queda das ações da Petrobrás no mercado. Pensando com a cabeça da oposição (imaginem) devemos concluir que a Petrobrás deve estar colocada no jogo global da “oferta e da procura” sem a interferência de seu maior acionista. E assim, a companhia voltará a voar em céu de brigadeiro. O mercado, por si, reserva um lugar de destaque ao lado direito de Jean Baptiste Say.

Existem dois movimentos a serem pincelados. O primeiro está relacionado com a lei geral que norteia o sistema capitalista sob dominância financeira. Evidente que uma empresa do porte da Petrobrás é alvo de disputa e exposta ao que meus amigos keynesianos chamam de “preferência pela liquidez”, ou – em curtas palavras – especulação nua e crua. E quem faz isso tem lado e chantageia o país abertamente. É só ver a relação inversa entre alta e queda das ações da Petrobrás e as pesquisas de opinião às eleições presidenciais.

O outro elemento é o da estratégia nacional. Uma empresa da dimensão da Petrobrás está inerente à estratégia nacional de cada país. Como no Brasil o negócio é combater a inflação, a Petrobrás – detendo o monopólio de importação e distribuição da gasolina – deverá refletir esta “estratégia”. Neste caso não somente controlando o preço da gasolina vendida no mercado interno (em detrimento dos prejuízos em seu caixa), mas também controlando o máximo possível seus investimentos (investimentos = renda = inflação). Interessante notar que durante o governo FHC nada foi investido pela empresa. A Petrobrás não indicou demanda nem de parafusos ao setor privado! Imaginem construir alguma refinaria. Imagino Pedro Malan enviando uma nota a algum assessor que o entregou algum projeto de refinaria a ele. A resposta de Malan seria previsível: “avalie-se os impactos inflacionários”.

O jogo muda de figura durante os governos Lula e Dilma. O que não quer dizer que a estratégia da estabilidade monetária foi desviada. A disputa entre desenvolvimento e neoliberalismo no seio destes governos teve impactos na Petrobrás. De um lado, estimularam-se investimentos desta empresa em milhares de empreendimentos e, de outro, ela continuou a ser objeto (ao lado da política monetária) de contenção de preços tendo em vista o combate à inflação. O resultado está aí numa doideira empresarial onde um programa de centenas de bilhões de reais em investimentos está na praça e em execução ao mesmo tempo em que se vê obrigada a revender gasolina no mercado interno abaixo do preço de mercado praticado pelo resto do mundo. É o velho e o novo convivendo numa louca unidade de contrários. Alguém deverá vencer no final.

As pessoas que pensam em refletir este país de forma séria devem se perguntar as razões de a sétima economia do mundo, dona de imensas reservas de petróleo, sócio majoritário de uma das maiores companhias petrolíferas do mundo, ainda importar gasolina. Isso é um absurdo, algo vergonhoso e que de certa forma desde 2003 intenta-se enfrentar. O que também deve ser objeto de discussão é a impossibilidade de um final feliz para uma empresa responsável por imensos investimentos em concomitância com os objetivos de uma política monetária como esta que está aí.

Penso eu que não resolve muita coisa esse discurso de “defesa da Petrobrás” feita por gente do nosso campo. É um slogan bonito, “simbólico”, mas que não resolve nossos problemas. Temos de parar de evitar a essência dos fenômenos, a “verdade nos fatos”. Por outro lado temos que saber que diante de nós estão bandidos escolados que resolveriam esse problema da Petrobrás vendendo as ações do governo na praça de Nova Iorque, suspendendo investimentos e criando um clima para a completa privatização, e desnacionalização, da empresa. Portanto, diante deste discurso pouco temos feito a não ser palavras de ordem de defesa da companhia e guerra de números. O essencial não é nem triscado.

Queremos defender a Petrobrás? Sua defesa não terá consequência alguma se não mudar radicalmente os objetivos estratégicos do Estado brasileiro. A estratégia da estabilidade monetária está matando a nação, pois não existe nação digna deste nome sem uma poderosa indústria e largo sistema financeiro para sustentar esta indústria. O mesmo destino espera a Petrobras. Vai morrer diante dos desígnios dos detentores dos títulos da dívida pública. Paladinos do banditismo anexo à bonitinha bandeira do “combate à inflação” e as ditas “conquistas” consequentes da estabilidade da moeda em 1994.

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