Minério, água e energia

A existência de vastas reservas de minerais estratégicos no Sudeste goiano representa enorme potencial econômico, muito além da areia que ali é hoje retirada em profusão. Nióbio, lítio e gigantescos depósitos de silício, se processados na região, poderiam viabilizar importante polo industrial em municípios como Catalão e Cristalina.

Em Cristalina, várias empresas mineradoras se ocupam da extração de areia de alta concentração mineral, mas empregada na construção civil. Uma mina de lítio, usado em baterias e lentes, exporta o minério in natura. E o próprio cristal de quartzo, de largo uso, hoje é exportado como cascalho para virar bijuterias ou joias na China e em outros países.

Os entraves ao desenvolvimento da região começam pelo domínio de tecnologias para transformar minérios em produtos industriais, por exemplo. Mas passam por um conflito entre dois históricos aliados nas políticas oficiais brasileiras: a água e a energia elétrica. Em Goiás, fica clara a contraposição do uso dos recursos hídricos para a agropecuária às barragens para mover usinas hidrelétricas.

O conflito tem origem em determinações de operadores de hidrelétricas que impedem, com respaldo legal, o uso dos lagos de barragens como reservatório de água para outros fins. Ou seja, não se pode retirar água desses lagos para irrigação, por exemplo. O argumento central para isso é o de que a maior parte das usinas opera no limite e, portanto, precisa de todo o líquido dos barramentos para girar suas turbinas.

Por seu lado, os agricultores de todos os portes, que precisam de mananciais para suas lavouras irrigadas, são prejudicados de várias maneiras pelas barragens. Mas, neste ponto, surge outra aparente contradição: esses mesmos produtores rurais dependem de energia elétrica para ativar as máquinas que bombeiam e aspergem água nas plantações.

Para citar um exemplo, grande debate (ou embate) vem sendo travado em torno da hidrelétrica de Batalha, no rio São Marcos, da bacia do Paranaíba. É uma usina gerida por Furnas (Eletrobrás) e fica nos limites dos municípios de Cristalina(GO) e Paracatu(MG). Sua capacidade será de 52MW/h, quando entrar em operação, nos próximos meses.

O reservatório dessa barragem, que está concluindo o enchimento, vai alagar uma área de 13.700ha, o que equivale a 685 lotes médios da agricultura familiar. Ao redor da sua lâmina d’água, existem mais de mil propriedades rurais, incluindo 800 famílias em assentamentos de pequenos agricultores.

Neste caso, pequenos e grandes estão unidos contra um inusitado inimigo comum: a energia elétrica. Os produtores apontam, desde logo, a baixa capacidade ou ausência de linhas de transmissão de alta voltagem para muitas regiões do Estado. Irrigantes, indústrias dos setores de alimentos e de fontes minerais atrasam investimentos por falta de energia.

Respaldados pelo Comitê de Bacia do Paranaíba, os produtores rurais ampliaram a abrangência do debate que travam. Em primeiro lugar, pedem solução imediata para o caso específico do lago de Batalha, que se resume na liberação da água. Mas alertam para problemas futuros, caso não ocorra uma revisão nos planos de novas hidrelétricas.

Eles questionam com força o conceito de que as grandes usinas são mais eficientes, em vigor no país há mais de meio século. Mas criticam de igual modo as PCHs (Pequenas Centrais Hidrelétricas) projetadas para os rios de toda a bacia do Paranaíba. Só no São Bartolomeu, são previstas seis delas.

A produção local de energia, de fonte solar, eólica ou de resíduos das próprias plantações — o bagaço de cana, por exemplo – seria, segundo eles, um caminho bem mais barato e sustentável. Por ironia, talvez, um dos principais usos do silício é justamente no fabrico de placas de energia solar.

Nos próprios sistemas de irrigação, alguns tabus foram quebrados. Até outro dia, era quase um dogma ter que barrar cursos d’água para poder irrigar alguma área. No mais das vezes, no entanto, essa é uma obra desnecessária, pois o volume de vazão de água é igual ao de chegada. Mas há muitos tabus ainda em vigor.

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