Dia do Homem?

Ações afirmativas são aquelas que devem se sobressair das demais ações cotidianas ou corriqueiras, e que tenham como objetivo proteger, compensar, proporcionar as minorias sociais que sofreram todas as formas de opressão e discriminação de que é capaz a maioria dominante.

Chamo de maioria dominante aquele grupo específico capaz de sujeitar as demais pessoas ao seu querer. Desta dominação podem advir lucros na forma de dinheiro, prazer, informações, poder de mando. O grupo dominante pode restringir o acesso ao conhecimento, o grupo dominante pode o que pensa que pode e assim o faz.

Um bom exercício para nosso entendimento é imaginarmos quantos homens, brancos, com idade entre 25 e 40 anos, diploma de nível superior, ocupação, e relativa saúde física e mental existem no Brasil. Fora destes parâmetros estão mulheres (mais da metade da população), negros, e índios, pobres, portadores de necessidades especiais, crianças e adolescentes pobres que não tem acesso aos equipamentos sociais que necessitariam. E temos o Dia da Consciência Negra, O Dia do Índio. O dia Internacional e o Dia Nacional da Mulher, Dia de Combate a Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, o dia do Orgulho Gay, da Visibilidade Lésbica, o dia do Trabalhador.

Estas datas não são comemorativas. Ao contrário pretendem reafirmar a necessidade de todas estas chamadas “minorias” a medidas compensatórias, que reafirmem sua condição e minimizem suas perdas. Quando discutimos, no oito de março, violência sobre a mulher, estamos capacitando mulheres como um todo para reagir e resistir à violência, aos salários desiguais, ao assédio e demais manifestações de preconceito. Quando nos oferecem flores, no oito de março, danem-se as boas intenções. É guerra.

Por isto sempre causa estranheza o aparecimento de dias com objetivos diferentes. Datas com caráter fascista, como a proposição do vereador paulista Carlos Apolinário (DEM). Inicialmente foi sancionado pelo prefeito Kassab, mesmo sem passar por votação nominal. Virou notícia no mundo todo, e em 2011, acabou vetado pelo então prefeito. A pressão contra a criação baseava-se na constatação que “o heterossexual é maioria, não é vítima de violência, não sofre ameaças ou constrangimentos, não é discriminado, assediado.”.

Então, quando abro os portais de notícias e encontro referências ao dia Nacional do Homem e descubro ainda que desde 1999 é comemorado o dia Internacional do Homem. Mais: A data é referendada pela Unesco. Procurei mais informações sobre o assunto. No site de primeira busca, a Wikipédia, alguns dos objetivos citados são, por exemplo, denunciar que sofrem discriminação em áreas como direito, mídia, educação, saúde, família, entre outras, projetando uma imagem positiva de si mesmos.

Os endereços de vários sites que constam no Google ou são existem mais, ou não passam pelo crivo de meu antivírus. Portanto, dediquei-me a ler as notícias nacionais, que dão conta de “comemorações” no país. Por aqui, as coisas foram tratadas mais em termos de saúde do homem, um deputado tucano apresentou um PL que oficializa a data, no facebook muitos fizeram piadas machistas ou não. O Ministério da Saúde alertou sobre os efeitos do fumo e incentivou o exame de próstata na idade recomendada.

De minha parte, perplexidade total. Podemos, então, criar dias assim-assim? Por exemplo, dia das mulheres brancas com nível superior? Poderíamos pensar em exercícios cerebrais ou cursos de extensão. O dia dos rapazes bonitos menores de 25 anos, que discutiriam formas de despistar o assédio. Dia dos brancos? das mulheres não-lésbicas? Perigo, perigo explícito. Quando tudo é permitido, nada é proibido. Principalmente a quem tem o poder. Enjoativo de tão repetido, a classe dominante.

Minha fala (ou escrita) sobre este assunto é deixar aqui a preocupação com a facilidade de criarmos e aceitarmos a segmentação, a banalização das lutas, e a capacidade social em transformar tudo numa grande massa, amorfa, indissociável. Ou como estudei há anos em química, o que fazer para decantar desta massa o real, o importante da graça que nos amordaça e obtusa nossa razão.

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