Minhas previsões para 2007 no Oriente Médio

Em todos os finais de ano nos últimos quatro em que passei como colunista deste Portal Vermelho, fiz algumas análises sobre o que espero para o Oriente Médio no ano seguinte, tecendo considerações sobre algumas possibilidades, ao que popularmente se chama

Acabo de ler os dois jornalões paulistas, onde uma das matérias mostra que o ente mais abstrato que conheço, ao que a imprensa grande chama de “mercado”, errou completamente todas as suas previsões feitas em dezembro de 2005, sobre os cenários de como via o Brasil no final de 2006. Errou em tudo: inflação, taxa de juros, exportações, crescimento do PIB, valor do dólar etc. Também neste meu caso, sei que posso erras em vários aspectos. Mas não custa nada compartilhar com meus leitores, minhas expectativas, que podem ou não ser confirmadas. A vida mostrará isso, em alguns casos, bem antes do final do ano.


 


Iraque


 


 
Este é o caso mais gritante da política externa dos Estados Unidos. O governo americano não sabe literalmente como sair desse atoleiro em que se meteu. Os jornais noticiam esta semana o que todo mundo já sabia e ocorreria a qualquer momento: o número de mortos dos aliados na ocupação do Iraque já superou todos os mortos dos atentados de 11 de setembro de 2001, que foi, em última instância, o grande pretexto para a invasão do Afeganistão e os ataques ao Iraque. Nos atentados de 11/9, morreram, entre vítimas que estavam nas Torres Gêmeas e no Pentágono, bem como passageiros dos quatro aviões usados, morreram exatos 2.973 pessoas e no Iraque já tombaram 2.978 soldados. É como se aplicássemos a famosa Lei do Talião: olho por olho, dente por dente! Em pleno século 21 ! (1).


 


 
Minhas previsões sobre os desdobramentos do conflito, para que se anotem e vamos acompanhar a evolução dos acontecimentos:


 


• A paz estará longe de ser alcançada. Crescerá os conflitos sectários entre forças que apóiam a ocupação e colaboram com a invasão anglo-americana e as que defendem a soberania do Iraque.


 



• Crescerá, em muito, a possibilidade de o Iraque ser dividido em três partes, uma espécie de cantonização do país, como os antigos bantustões na África do Sul. Uma parte no sul, xiita, ao centro, sunita e ao norte curdo. Se isso vier a ocorrer, será lamentável, um profundo erro histórico com essa que é das mais antigas nações árabes do Oriente Médio.


 



• Fala-se no enforcamento do presidente Saddam. Outro erro histórico. Isso em nada ajudaria a pacificar o país, mas, ao contrário, acirraria ainda mais os ânimos e os sunitas e membros do Partido Baath, intensificariam ainda mais a resistência.


 



• Prevejo um racha entre os xiitas, que já se vem verificando, com os seguidores de Moqtada Al Sadr e Al Hakim, ambos clérigos que possuem visões diferentes sobre as alianças com os Estados Unidos. Isso pode refletir no governo, que pode não ter condições de se sustentar.


 



• Nouri El Maliki poderá ou não emplacar o final do ano como governante. É provável que caia antes disso, pelo acirramento dos conflitos. É hoje um testa de ferro americano.


 



• Não acho que as tropas americanas sairão em 2007 do Iraque. Ao contrário, em algum momento, pode-se inclusive ampliar um pouco o contingente de 140 mil soldados, mas provisório apenas. A tendência é aplicar o Go Long (ver colunas anteriores), ou seja, ficam mais tempo, mas sem ampliar contingentes.


 


 


Palestina


 


 


 
Esta é a segunda região de conflito no Oriente Médio hoje. A imprensa procura mostrar choques entre o Hamas, que detém o governo do primeiro Ministro Ismail Haniyeh e do presidente da Autoridade Palestina, do grupo Fatah, o maior partido político da Palestina, Abou Abbas. As diferenças seguem sendo de concepções políticas, de visões de mundo e de como administrar o país, ocupado militarmente por Israel e pelo próprio reconhecimento desse país como estado nacional. Minhas impressões sobre o que ocorrerá em 2007 são estas:


 


 


• Vejo dificuldades para a continuidade do governo de Haniyeh. Não pelo fato de que eles não reconhecem Israel, mas sim pelo fato de que formaram um governo absolutamente sozinho, sem nenhum outro partido apoiando. Em lugar nenhum do mundo se governa dessa forma. A maioria que conquistaram nas eleições foi relativa e circunstancial e o grupo Fatah é muito forte. É preciso compartilhar poder. Tudo indica que novas eleições devem ocorrer.


 



• Não vejo possibilidade de paz em curto prazo. Israel segue não reconhecendo o governo do Hamas. Essa atitude é errada. Quando negociamos, não escolhemos nossos interlocutores. Se conversamos apenas com quem gostamos, não é negociação, mas alianças, amizades. Israel tem que ceder terras em troca da paz.


 



• Não vejo grande futuro para o gabinete do primeiro Ministro Ehud Olmert, praticamente o primeiro político civil, inexpressivo israelense a chegar à chefia de governo sem passar por experiências militares. Pode cair, se os trabalhistas deixarem o governo e novas eleições serem convocadas.


 



• Olmert deve iniciar a troca de prisioneiros palestinos e libaneses, pelos soldados israelenses seqüestrados desde julho passado por militantes do Hamas, na Palestina e pelo Hezbolláh no Norte de Israel. Não há alternativa sem essa troca.


 



• A construção do Muro da Vergonha, que separa terras palestinas e israelenses, seguirá sem interrupção, mesmo condenada pela Corte Internacional de Justiça de Haia.


 


 


Líbano


 


 


Aqui é o terceiro e mais novo conflito do OM. Desde os ataques israelenses durante 32 dias em julho e agosto passado, vitimando mais de quatro mil libaneses, a popularidade do grupo e partido político chamado de Hezbolláh (Partido de Deus) cresceu exponencialmente. A liderança do xeque Hassan Nasrallah é imensa. É um dos políticos mais lúcidos do OM hoje. Elogia Chávez e Guevara e entende claramente a aliança entre xiitas e sunitas islâmicos, com patriotas e comunistas libaneses e árabes em geral, na luta antiimperialista. Sobre o Líbano minhas opiniões são:


 


 


• O governo de Fouad Siniora, primeiro ministro pró-americano não deve durar. Não resistirá às pressões imensas da população e da opinião pública. Se não dissolver o governo e convocar novas eleições, o país ficará ingovernável. Não há mais uma correlação de forças que justifique 21 ministros pró-americanos e apenas sete pró-árabes e pela soberania do Líbano.


 



• Crescerá a popularidade dos partidos amigos da Síria e defensores da soberania libanesa e árabe em geral e anti-americano (neste caso não contra o povo americano, mas contra o seu governo).


 



• Acho difícil ser instalado no país uma Corte de Justiça Internacional para julgar os criminosos e assassinos do ex-primeiro Ministro Hafic Hariri.


 



• Não aposto ficha alguma na eclosão de uma nova guerra civil, nos moldes da que ocorreu entre 1975 e 1990. Acho que as forças políticas sabem que isso é ruim para todos. Mas, vejo o crescimento das lutas internas, conflitos sectários, que podem ocasionar mesmo muitos mortos.


 


Síria


 
Restou este país árabe como o mais soberano, o mais árabe de todos e o que implementa a maior resistência entre os países árabes, à ocupação americana de todo o OM. O governo de Bashar El Assad, filho do saudoso Hafez El Assad, é o que, apesar dos problemas internos que enfrenta, possui a maior estabilidade política. Minhas opiniões sobre a Síria:


 


• Seguirá resistindo e ampliando as políticas de resistências contra a ocupação americana dos países árabes.


 



• Seguirá dando guarida e todos os grupos e partidos políticos do OM que queiram somar forças e vozes contra o imperialismo norte-americano.


 



• Deverá proceder a abertura política, conduzindo um processo de ampliação da participação popular e democratização do país, sem que isso coloque em risco a firmeza do governo na luta pela soberania e independência do país árabe.


 



• Seguirá lutando para recuperar das mãos de Israel as suas terras nas Colinas de Golãn, que são estratégicas para a segurança do país.


 


 


Desdobramentos e meus desejos pessoais


 


 


 
Aqui entra a fase dos meus desejos pessoais. Como dizia Marx, a história é feita mesmo pelos menos (seres humanos), mas não exatamente como é da sua vontade e desejo. Ela depende de fatores que na maioria das vezes são completamente alheios à nossa realidade e pouco podemos influenciar. Se dependesse mesmo de meu desejo e vontade pessoal, o Brasil não pagaria em 2007 150 bilhões de dólares para a banca capitalista financeira internacional e para as 20 mil famílias mais ricas do país ficarem ainda mais ricas. Mas, minha vontade não interfere nessa realidade. Dou, quando muito, minha contribuição para que as coisas mudem e a realidade se alterem, mas não depende de mim.


 


 
Mas, como dizia Lênin (ou teria sido Maiakovski?), é preciso sonhar, mas realizar inescrupulosamente nossa fantasia, quero aqui expressar meus desejos pessoais e farei o que for possível para concretizá-los.


 


• Desejo paz na Palestina. Quero a edificação do Estado Palestino, com retorno dos exilados, com libertação dos cativos, com devoluções das terras da Cisjordânia e com capital em Jerusalém.


 



• Acho que os judeus tem sim o direito de ter o seu espaço, mas devem aceitar conviver em paz com os palestinos e devolver as suas terras milenares.


 



• Desejo a paz no Líbano. Mas com outro governo, que expresse as novas forças políticas do país, que resistiram de armas em punho aos ataques israelenses autorizados e apoiados pelos Estados Unidos. Nesse sentido, apoio a aliança do Hezbolláh com o PC Libanês e os cristãos do general Michel Aoun e os muçulmanos do grupo Amal.


 



• Quero que os povos dos 23 países árabes se levantem e lutem contra seus governos serviçais e tirânicos, que clamem por democracia nos moldes populares (e não americanos) e que somem seus esforços e vozes contra a ocupação estadunidense do OM.


 



• Que no Iraque, um novo governo seja formado, que expresse as forças políticas que combatem a ocupação, sem rancor e mágoas, que reconstrua o país e o devolva para as mãos dos verdadeiros donos, os árabes iraquianos. Espero que o presidente Saddam não seja condenado, nem enforcado, um erro histórico, pois todas as entidades de direitos humanos do mundo e associações de advogados sabem que seu “julgamento” foi parcial e faccioso.


 


 


Aos meus leitores, que estivemos juntos por mais de 50 semanas, desejo um grande ano de 2007, com muita participação política, consciência de que somos todos seres sociais, gregários, que devemos dar nossa cota de participação, mesmo que seja bem pequenininha essa participação, para a construção de um mundo novo, melhor, justo, humano, socialista, onde todos possam viver de seu trabalho com justiça e igualdade. Que todas as nossas realizações pessoais possam ser realizada com justiça e igualdade em 2007. Esse E o meu mais sincero e profundo desejo. Vamos completar cinco anos ininterruptos de coluna em 28 de março de 2007, com quase 250 artigos. Aos que me acompanharam e apoiaram, prometo apenas seguir fiel aos princípios de escrever buscando a verdade, onde ela estiver, como dizem os muçulmanos, mesmo que seja na China. O sonho pessoal de ir e viver no Oriente Médio, espero, que se realize em 2007.


 


 


(1) Ver artigo no jornal Estado de São Paulo do dia 27 de dezembro de 2006, intitulado “Conflito já matou mais que o 11/9”, publicado na página A8.

As opiniões expostas neste artigo não refletem necessariamente a opinião do Portal Vermelho
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