Desdenhar a grande experiência camaleônica de Sarney é ignorância

Como funciona a moral mafiosa no tocante a dinheiro

Sussurram em versos e trovas nasalcovas, no breu das tocas, nos botecos; e anda nas cabeças e nas bocas que osenador amapaense José Sarney teria dito: "Renan e eu conhecemos oDemóstenes gordo e o Demóstenes magro", quando especularam se o senadorsurtou de repente.

Ou seja, para Sarney, ele é isso aí!Se a idade não deu sabedoria a Sarney, experiência ele tem de sobra. Nuncadeixo de prestar muita atenção no que ele fala, nem que seja só para discordarcom conhecimento de causa. A fala de Sarney faz sentido. Não se trata de umasociopatia não criminosa (nem todo sociopata é criminoso!).

A dica de Sarney é quente e em si umaviso, ainda que quase camuflado, mas nas entrelinhas aponta que é hora derever dois grandes filmes-subsídio para entender o momento político brasileiro:o épico "O Poderoso Chefão" (1972), a saga da família Corleone emtrês filmes de Francis Ford Coppola, adaptação do romance de mesmo nome, deMario Puzo; e "A Honra do Poderoso Prizzi" (1985), de John Huston, baseadono livro de mesmo nome de Richard Condon.

É de bom tom revê-los com um novo emais apurado olhar para apreender como funciona a moral mafiosa no tocante adinheiro, que, tal qual o capital financeiro internacional, tem origem, mas éapátrida. O desnudamento de relações siamesas do senador Demóstenes Torres,assim como a capilaridade em quase todos os partidos políticos, vaiexplicitando que quem os chefia, em sua ânsia de controlar e subalternizar osTrês Poderes brasileiros, não é um exército de um homem só.

Suas práticas, desde Waldomiro Diniz,corroboram um princípio: a máfia não sobrevive nem prospera sem um ponto deapoio no governo instalado, daí porque exige ter aboletado em um dos TrêsPoderes, ou em todos, um setor serviçal ou, usando palavra mais apropriada, um setorfâmulo – um criado com vínculos de subordinação absoluta. Não importa de qualpartido. Não é de admirar que o senador Demóstenes Torres não apenasreligiosamente preste contas do que faz, caladinho, ao "capo", comorecebe pitos homéricos sem piar!

E obedece, pois descumprir o juramentodo silêncio ("omertà") é sentença de morte, como disse o ex-mafiosoTommaso Buscetta: "A sentença de morte da máfia é sempre cumprida, cedo outarde. A máfia não esquece nunca". O senador foi eleito para cumprir opapel de representante de interesses escusos, nada a ver com duplapersonalidade (é aí que Sarney acerta!), o que corrobora o dito por WálterFanganiello Maierovitch: "Parecem eternas as ligações da criminalidadeorganizada com o chamado clientelismo político e a subserviência de muitos aopoder econômico representado pelas máfias" ("Máfia e política: crisesvocacionais").

Em cenário político sob a batutamafiosa, há um elemento crucial a ser considerado na hora do voto nas próximaseleições. Para quem não é do ramo nem simpatiza, trata-se de avaliar oenvolvimento ou não da candidatura, por mais inocente que ela possa parecer,com práticas mafiosas, conhecidas desde 1875 e tornadas públicas peloprocurador geral de Palermo (Itália), Diego Tajani: "Posso afirmar que amáfia prospera por motivos políticos e só é forte na medida da proteçãorecebida das autoridades", por ter comprovado que "a máfia sicilianacolocava grana e influência nas campanhas, elegia os seus políticos e escolhiaos seus representantes nos governos" (IBGF/WFM, em "Máfia, política,jogos de azar e Cachoeira). Agora é aqui. Em nossas fuças.

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