Um pacto civilizatório para os cuidados na infância e na velhice

Cuidar de crianças e idosos é tarefa sagrada dasmulheres

Por ocasião do Dia Internacional da Mulher, 8 demarço, cansada de responder, anos a fio, à pergunta "Quando é o dia dohomem?", dizia que são todos os outros dias do ano. Agora, radicalizei.Gozações com o Dia da Mulher não merecem nada além de solene desprezo. Sei,vivemos sob a égide do machismo, embora haja homens de novo tipo – quereconhecem a cidadania de segunda categoria das mulheres e que outras questõesoriginárias do patriarcado perduram.

No Brasil, conquistamos a igualdade nas leis. Urgeconcretizá-la na vida, tarefa inglória sem que o Estado assuma, em palavras eatos, desmontar as estruturas arcaicas, materiais e mentais, do patriarcado,cultura nefasta que perpetua a educação diferenciada (menina é assim e menino éassado!), assim como elevar a consciência de quem crê que cuidar de crianças ede pessoas idosas é tarefa sagrada, respectivamente, de mães, filhas e/ououtras mulheres da família.

A educação infantil é direito da criança e dever doEstado, inscrito na Constituição de 1988, referendado pelo Estatuto da Criançae do Adolescente (1990). A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (1994) definiua educação infantil – creches (0 a 3 anos) e pré-escola (4 a 5 anos e 11 meses)- como a primeira etapa da educação básica. Ressalto um aspecto prático dafunção social da educação infantil, que é minorar a sobrecarga de trabalho querecai sobre as mulheres mães quanto ao cuidado com a prole (higiene,alimentação e conforto emocional).

O Brasil é cruel no tocante ao cuidado com idosas/os,obrigação tradicional de mulheres, com arranjos familiares cada vez maisincompatíveis com tal tarefa. A completa ausência de equipamentos públicos paracuidar de pessoas idosas saudáveis que exigem cuidados de terceiros ouinválidas é a regra num país que aumentou bastante a expectativa de vida e onúmero de famílias pequenas e cada vez menores, mas que finge viver no tempo emque uma das filhas era escolhida para ficar solteirona para cuidar dos pais navelhice!

Dar alta hospitalar a uma pessoa idosa com sequelasincapacitantes para a vida autônoma é um processo doloroso e patético, muitas vezestendo-se de recorrer às autoridades policiais e judiciárias, com a famíliaalegando que não tem como levar para casa! O governo fecha os olhos para ocontingente cada vez maior de pessoas idosas, pois o Brasil está na fase 4 datransição demográfica, exigindo cuidados 24 horas, aos quais, como regra geral,as famílias contemporâneas são impotentes para responder com a dignidadenecessária, seja de tempo e/ou financeiramente.

Equipamentos públicos de educação infantil e cuidadosna velhice exigem investimentos governamentais compatíveis com a demanda,considerando-se que nem todas as crianças nasceram em famílias que podem pagarcuidados, seja tendo alguém em casa para tanto, seja em instituiçõesparticulares especializadas. O mesmo se aplica a pessoas idosas.

Avalio que o governo Dilma promoverá uma revoluçãocultural de grande vulto se contemplar o acesso a cuidados públicos para afaixa etária de 0 a 5 anos e 11 meses e para idosas/os, via pacto civilizatóriocom cada uma das 5.000 e tantas prefeituras e todos os Estados e territórios,para assegurar educação infantil a todas as crianças, assim como apoio noscuidados às pessoas idosas.

Sem a definição política de superação de tais descasosnos três níveis de governo (municipal, estadual e federal), o patriarcadoassume ares de eterno no lombo das mulheres.

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